Rabino Samy Pinto (*)
É bem provável que nos dias atuais poucos se lembrem do real significado das festividades de final de ano.
A luz do Natal, que deveria ser o da esperança, do nascimento de uma nova forma de convivência, harmonia e paz, foi perdendo o seu brilho para o consumismo, e acabou sendo escondida nas costas das compras de presentes e mais presentes. O caminho que este período de festas vem seguindo, que devia ser de reflexão em relação ao ano que passou, com o intuito de abrir uma estrada para um ano melhor e com mais amor, continua o mesmo? Ou essa ideologia de venda e compra mudou a rota?
No judaísmo, há também uma festa das luzes, celebrada simultaneamente com o Natal, são os oito dias de Hanukkah. Festa que teve origem no ano de 165, antes da era comum, quando a terra de Israel foi dominada pelos gregos- sírios e o rei Antiocos, do qual era sucessor do Alexandre, O Grande. Naquela época, a conquista do território israelense não foi apenas militar, mas sim da própria cultura, havia o desejo de helenizar todos os judeus.
Foi quando, em busca de defender e preservar a cultura judaica, houve a revolta dos macabeus, que pertenciam às famílias dos sacerdotes do segundo grande templo de Jerusalém, e mesmo sem experiência em combate militar, enfrentaram o império dominante e conquistaram uma vitória milagrosa, preservando toda a tradição além da autonomia nacional.
Quando se olha toda a disputa que aconteceu naquela época e se observa a realidade que se vive hoje, o embate ideológico entre o judaísmo e o helenismo volta na forma do combate tradição e consumismo. Em uma sociedade direcionada cada vez mais para o capitalismo, que durante os meses valoriza o sucesso individual, e a felicidade é entendida como meramente satisfação dos prazeres, essas festas das luzes, o Hanukkah e o Natal, devem revelar no final de ano que a felicidade deve ser interior, e não exterior.
No judaísmo, na festa de Hanukkah, se fala da vitória da luz sobre as trevas. Luz que seria a verdade que permite, que possibilita, essa felicidade interior. E as trevas, que tem o papel de agir de forma despótica, dizendo que a pessoa deve ser o que os outros querem que ela seja. Mas isso não quer dizer que não se deve dar presentes nessa época do ano. Reconhecer o verdadeiro significado do Hanukkah, do Natal, torna a entrega mais verdadeira, uma manifestação do amor que deve haver entre as pessoas.
De acordo com o judaísmo, se costuma presentear uns aos outros, e isso, em hipótese alguma, descaracteriza a felicidade interna. O que está errado é o pensamento que o presente produz o amor, sendo exatamente o contrário. Entregar uma lembrança para alguém é consequência do amor. Quanto mais doamos ao outro, mais o amamos. Talvez esse seja um bom momento para se praticar os ensinamentos dessa época do ano, e entregar alguns presentes para os mais necessitados. Separar um dos muitos presentes ganhos e compartilhar com aquele que nada tem.
Assim as luzes judaicas e cristãs brilharão mais.
(*) – Responsável pela sinagoga Ohel Yaacov, é formado em Ciências Econômicas e doutorado em Letras e Filosofia, pela USP. Se especializou em educação em Israel, na Universidade Bar-llan. É diplomado Rabino pelo Rabinato chefe de Israel, em Jerusalém.