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Estraga prazeres

em Opinião
sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Mario Enzio (*)

Há pessoas que têm o indefinido prazer de contar o final de um filme ou de interromper alguém que está contando um fato e insinuar ou dizer que sabe mais de quem está falando.

Elas têm a faculdade de serem inconvenientes por opção ou terem algum desvio de personalidade. Não vou me ater em definições ou explicações psicanalíticas. Penso que é uma categoria de chato ranheta que existe porque adora antecipar ou arriscar uma informação por qualquer motivo.

É pessoa desagradável que irá contar o que outros estão para saber dentro de alguns instantes ou aguardam o desfecho de uma história com de ansiedade, entusiasmo ou alegria.
Imagine estar ligado por cento e oitenta ou mais capítulos esperando o momento decisivo em que o malvado será ou não vingado.

Em que a vilã será desmascarada ou o mocinho irá ou não ficar com a bela e sensual garota, a mais queridinha, que foi injustiçada em quase metade dos capítulos? E aí antes que se possa ter a surpresa revelada de maneira dramática ou teatral alguém que não tem nada a ganhar ou perder, mas tem algum tipo de prazer não revelado, resolve contar o desfecho da trama. Como qualificar uma pessoa que tem essa capacidade de interromper o seu prazer de entretenimento? Estraga prazeres?

O termo com a modernidade líquida e redes sociais pode ser definido como “spoiler”. Do inglês “spoil” é estragar, arruinar, destruir. Ainda pode ser uma peça usada nos carros na parte traseira para gerar mais estabilidade. Mas, nosso “spoiler” é alguém que conta o que um preguiçoso quer saber por que não quer assistir ao seriado.

Esse sujeito impertinente que se manifesta fora de hora, poderia ser penalizado, se contasse o final que não queremos saber. Sigamos um raciocínio do passado de quando não sabíamos uma lição ou conversávamos em voz alta em sala de aula. Éramos castigos ao ter que escrever mais de cem vezes no caderno a frase: “não devo conversar em sala de aula”.

Sendo assim, a pessoa que contasse o que não queremos saber seria, por exemplo, obrigada a escutar uma mesma história – do repertório clássico popular infantil: Chapeuzinho Vermelho, Gata Borralheira ou uma que ela já soubesse o final por um determinado número de vezes, conforme o grau de surpresa que ela tenha revelado.

A história lhe seria contada, no mínimo, dez vezes. Seria como uma prestação de serviço à comunidade. E cada dia na casa de alguém que lhe narraria com sua interpretação, para que a emoção dessa experiência surtisse algum efeito. Para que antes de abrir a boca se colocasse no lugar de quem não quer saber o nome do assassino no filme do Hitchcock.

Entretanto, nesses tempos de múltiplas mídias e diversidade de interesses, vamos defender o direito da livre expressão. Entendemos que uma coisa é abrir a boca na hora da novela e outra é escrever em um jornal ou num site. Portanto, se você está lendo um segredo em um veículo é porque quer saber. Assim, uma coisa é ler outra é ficar falando alto na sala de visitas, repleta de amigas e vizinhas da sua tia, que vieram assistir ao último capítulo da novela. Esse é o fim!

(*) – Escritor, Mestre em Direitos Humanos e Doutorando em Direito e Ciências Sociais. Site: (www.marioenzio.com.br).