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Desapropriação da casa própria

em Artigos
quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Eurípedes José de Souza Junior (*)

A mais grave forma de intervenção do Estado na propriedade privada é, sem dúvida, a desapropriação.

Através dela, a Administração Pública toma para si um bem particular, devendo indenizar o seu proprietário, de acordo com a Constituição Federal, de forma justa, prévia e em dinheiro. O detalhe importante é que qualquer bem particular pode ser desapropriado, inclusive a casa própria dos cidadãos. A sua casa! O problema é que a desapropriação é um processo extremamente injusto com o cidadão atingido, pois que a indenização que deveria ser justa e prévia, nunca o é; se é prévia, acaba sendo injusta, e para que seja justa, nunca é prévia.

Explico: O Estado é obrigado a fazer uma oferta ao proprietário pelo bem desapropriado na tentativa de, amigavelmente, promover a desapropriação. Só que a dita oferta é sempre baseada no valor atribuído ao imóvel para efeitos de cobrança do imposto predial e territorial, sendo, portanto, irrisória e muito distante do valor real do imóvel. Por essa razão, o proprietário quase sempre recusa a oferta. Assim, o Poder Público propõe uma ação judicial depositando o valor oferecido ao particular e alegando urgência na obtenção do imóvel.

O Poder Judiciário, então, determina a saída imediata do proprietário do imóvel, restando a este apenas a possibilidade de discutir o valor real do imóvel para fins de indenização. Até que o particular receba pelo bem desapropriado, vão-se décadas a fio, considerando todo o trâmite do processo judicial e a famigerada fila dos precatórios. Em termos mais claros, o cidadão que tem um bem imóvel desapropriado, se não aceitar o preço oferecido pelo Estado acaba despejado de seu imóvel sem receber um centavo por isso, sendo obrigado a lutar por décadas até o recebimento do valor devido pelo bem.

Felizmente, àqueles que veem sua casa própria desapropriada, não acontece bem assim. Menos mal, pois o desalojamento de famílias que encontram dificuldades, no sistema jurídico vigente, de obter uma indenização prévia suficiente para a obtenção de um novo lar, é ato que potencializa e muito problemas sociais já tão pulsantes no nosso país. Pensando nisso, o Decreto-Lei 1.075 de 22 de janeiro de 1970, reserva a esses proprietários uma proteção maior na hora da desapropriação.

Para esses que moram em imóveis residenciais urbanos (a casa própria ou bem de família), antes que o Judiciário determine a saída forçada do proprietário do imóvel, é necessário que ele seja ouvido sobre o valor do depósito feito pelo Estado, oportunidade em que poderá impugnar a oferta e demonstrar o valor real do imóvel (através de uma avaliação recente, por exemplo), o que deverá ser levado em consideração pelo juiz na fixação de um valor provisório do imóvel. Sendo esse valor provisório superior à oferta do Estado (desnecessário dizer que sempre será), fica este obrigado a complementar o depósito até a metade do valor fixado. Só então o proprietário será obrigado a sair do imóvel, mas com direito ao levantamento do valor integral do depósito.

Um exemplo com valores hipotéticos ajuda a visualização: imagine que um cidadão resida em sua casa própria cujo valor real é de R$ 100.000,00. Pretendendo desapropriar esse imóvel, a Administração Pública oferece R$ 10.000,00 pela casa, tomando por base o valor cadastral do imóvel para fins de cálculo do imposto. Se o morador recusa a oferta, o Estado propõe a ação de desapropriação e deposita os R$ 10.000,00 pretendendo obter a posse do bem imediatamente.

No entanto, o proprietário poderá impugnar essa oferta demonstrando que o valor da casa é R$ 100.000,00. Se o juiz fixar o valor provisório em exatos R$ 100.000,00, o Estado será obrigado a complementar o depósito até R$ 50.000,00. Por fim, o morador sai da casa com os R$ 50.000,00 na mão, e lhe restará brigar na justiça para receber os outros R$ 50.000,00.

Apesar de não corresponder ainda ao ideal de indenização prévia e justa, essa proteção legal se apresenta como um importantíssimo instrumento de defesa daqueles que mais sofrem com o mal necessário da desapropriação: os que veem a casa própria, muitas vezes conquistada a duras penas, ser repentinamente tomada pelo Estado a “preço de banana”. É necessário atenção para fazer valer a proteção outorgada pela Lei, pois caso contrário é provável que apenas a geração seguinte da família venha a ter acesso à indenização justa.

(*) – É advogado do escritório GMPR – Gonçalves, Macedo, Paiva & Rassi Advogados.