Ricardo Rocha e Gary Bolles (*)
Com a chegada de 2025 a tendência é que, no âmbito profissional, façamos nossas apostas sobre o que vamos resolver agora e o que pode “até” ficar para depois.
Aos líderes de companhias, trago um tema sobre futuro do trabalho que precisa entrar na lista do que vai ser resolvido no presente: temos hoje cinco gerações trabalhando simultaneamente e que, sinto lhes dizer, não se entendem.
São os grupos denominados geração silenciosa (1927 – 1945), baby boomers (1946 – 1964), geração X (1965 – 1980), geração Y ou Millennials (1981 – 1996) e os recém-chegados da geração Z (1997 a 2010). Nunca antes houve uma intersecção de cinco camadas de gerações distintas que precisassem fazer negócios e entregar resultados juntas.
Pense que temos na mesma sala de reunião um profissional da geração TikTok e um da era do futebol de botão. Eles, para além de serem pessoas diferentes, possuem visões completamente distintas sobre sucesso, diversão e propósito. Ainda assim, precisam colaborar para tomar uma decisão sobre a implementação de um projeto de tecnologia.
Se o mercado de trabalho estivesse em alto mar, eu diria que esse é o momento de afundar ou navegar. Esses conflitos, impasses, dificuldades de comunicação e de linha de pensamentos entre gerações já geram impactos nos resultados financeiros de diversas organizações. De acordo com um estudo conduzido pela ASTD Workforce Development em parceria com a VitalSmarts, um terço das companhias destinam ao menos cinco horas semanais para resolver conflitos geracionais no ambiente de trabalho, o que representa uma redução de produtividade de cerca de 12%. Outra pesquisa, liderada pelo InfoJobs, mostra que 62% das pessoas já enfrentaram situações de conflito entre gerações.
E a tal da falta de conexão, seja ela com quem se trabalha ou com o propósito do trabalho, só agrava esse cenário. Um estudo recente da Gallup aponta que 70% dos funcionários no Brasil estão desengajados e infelizes com sua ocupação. Não é preciso sequer entrar na discussão sobre o número de horas trabalhadas para concluir que um funcionário engajado contribui mais e melhor que um desengajado. Agora, imaginem cinco gerações diferentes, desengajadas, precisando colaborar para “sair do outro lado”. É uma receita para a erosão da performance e cultura de qualquer empresa.
A inteligência artificial joga um papel duplo neste cenário. Por um lado, tem o potencial de libertar os seres humanos de tarefas repetitivas e aumentar o nível de contribuição intelectual aos negócios. Por outro, suas aplicações podem exacerbar os desafios existentes, colocando em cheque a real contribuição das pessoas, ampliando a disparidade entre as gerações e dando luz à falta de alinhamento nas organizações. Mas, e se ao invés de aumentar as diferenças geracionais, a IA pudesse ser usada para aumentar dramaticamente a diversidade cognitiva, a colaboração entre gerações e o engajamento dos trabalhadores?
Ao longo da história, os avanços tecnológicos têm, em sua maioria, ampliado as capacidades humanas. Hoje, o uso da IA permite mapear profundamente os membros de uma organização, criando uma espécie de “raio-X” do potencial humano de cada indivíduo. Assim, por meio de suas experiências, conhecimentos, habilidades e maneira de ser e trabalhar, podemos alocá-los e conectá-los de maneira inteligente e produtiva, dando luz ao potencial de cada um — independentemente de sua geração, área ou função.
É sobre usar a tecnologia para aproveitar as diferenças e criar equipes produtivas e colaborativas, promovendo sinergias e inovação. Ironicamente, essas ferramentas de ponta contribuem para que nós possamos enxergar melhor aquilo que nos torna únicos e, portanto, verdadeiramente humanos.
Mas ninguém disse que seria fácil. No fim do dia, o desafio que precisa entrar na lista dos problemas a serem resolvidos já é o de ultrapassar a barreira da conexão e colaboração da inteligência humana, só assim poderemos colaborar também com a inteligência artificial. E a hora de resolvê-lo é agora, porque as gerações Alfa (2010 até 2024) e Beta vêm aí.
(*) Ricardo Rocha é CEO e Cofundador da acaso, startup com soluções de inteligência de skill-matching; e Gary Bolles é expert global e Chair de Futuro do Trabalho na Singularity University.