Heródoto Barbeiro (*)
As imagens da destruição são avassaladoras. A cidade destruída pelos bombardeios não contabiliza mais nenhuma construção intacta.
O que se vê pelas ruas são escombros do que foram, há pouco tempo, casas e prédios comerciais. Não é possível distinguir de onde vem tanto entulho, se já existiam ali ou caíram dos muros e paredes dos prédios. Poucas pessoas se arriscam a caminhar pelos escombros, dada a dificuldade de avançar e o perigo de ser atingido por uma bomba. Vez ou outra um cachorro esfomeado se arrisca e já se diz que se alimenta de cadáveres de moradores.
Os corpos estão espalhados por todo lado e nem mesmo os parentes se arriscam a levá-los para uma cova coletiva. Cemitério e cerimônia religiosa, nem pensar. Nem mesmo o tempo ajuda. Há uma chuva constante que enlameia tudo e dificulta ainda mais qualquer deslocamento de pessoas ou veículos. O frio faz ainda mais vítimas.
A cada dia que passa se renova a esperança de uma trégua entre os contendores. A opinião pública mundial se emociona com as imagens das crianças e dos hospitais apinhados de feridos. As potências mundiais estão envolvidas direta ou indiretamente no conflito. IsSo leva o debate de intervir ou não na guerra para os parlamentos nacionais e a consequência é uma divisão de partidos e de opiniões. Os refratários a uma intervenção direta argumentam que a guerra é problema de uma terra distante e, portanto, só pode ser resolvida com a vitória de um dos lados.
O fato é que a diplomacia falhou e quando isso acontece a guerra é inevitável. Como contatar as partes envolvidas se elas têm interesses econômicos e territoriais semelhantes? Não há uma entidade internacional com força para impedir a evolução do conflito, o aumento do número de mortos entre civis, a destruição das cidades e a economia de todos. Os estrategistas divulgaram que a guerra seria rápida e eficaz, mas ela se arrasta sem perspectivas de paz. Ninguém prevê a guerra de trincheiras e luta nas ruas da cidade.
A imagem dos contendores é distorcida pela propaganda. O imperador da Alemanha, Guilherme II, é retratado como um bárbaro que ameaça a civilização mundial e a cultura europeia. Por sua vez, os inimigos – França, Inglaterra e Rússia – são responsabilizados pela prática de uma política imperialista que busca, a qualquer preço, conquistar colônias, mercados consumidores de produtos de alto valor agregado e exportadores de matérias-primas de baixo custo. O resultado é arruinar o inimigo cerceando o comércio marítimo por onde transitam essas mercadorias.
Os afundamentos provocados pelos submarinos alemães atingem navios de países neutros. Inclusive americanos e isto é a alavanca que o presidente democrata, Woodrow Wilson, precisa para convencer o Congresso e declarar guerra ao Reich em 1917. Wilson propõe uma trégua no morticínio. Edita uma proposta de 14 pontos como base para construir a paz e diz que essa é a última guerra da humanidade, uma guerra contra todas as guerras. Os folhetos são lançados sobre as tropas alemãs.
O Kaiser aceita o cessar-fogo. O destino da paz do mundo será construído em Paris, com um tratado geral e a edificação de uma sociedade internacional de nações que será a guardiã da paz e impedirá a eclosão de uma segunda guerra mundial. Wilson errou. Os críticos dos 14 pontos dizem que Deus só precisou de 10 mandamentos, mas o americano edita 14.
(*) É jornalista do Record News, R7 e Nova Brasil (89.7), além de autor de vários livros de sucesso, tanto destinados ao ensino de História, como para as áreas de jornalismo, mídia training e budismo.