Andreia Soares Calçada (*)
O uso de celulares e dispositivos digitais faz parte do dia a dia das pessoas e o impacto negativo que isso provoca é o uso excessivo desses aparelhos.
Isso afeta a capacidade cognitiva e a saúde mental das pessoas, gerando um grande número de ‘dependentes digitais’, que são os casos de usuários que não conseguem ficar longe dessas tecnologias. Esses casos mais graves de dependência são classificados por ‘demência digital’.
A demência digital não é uma condição médica reconhecida, mas sim uma maneira de nomear os efeitos prejudiciais da dependência digital e da exposição constante a telas.
Os adultos dependentes digitais que não conseguem ficar longe dos celulares e das redes sociais podem ter diversos problemas como: redução da concentração, memória de curto prazo afetada, isolamento social, desenvolver hábitos sedentários que prejudicam a saúde física e mental podendo gerar estresse, ansiedade e depressão.
Mas é no crescimento do uso dos aparelhos digitais e das redes sociais pelas crianças e adolescentes que devemos ter atenção redobrada. Se bem direcionado pelos responsáveis, as crianças terão acesso a pesquisas e a conteúdos que são bons. O importante é que sejam monitoradas com relação ao tempo e também ao tipo de conteúdo que acessam para não se tornarem dependentes da tecnologia.
Sem supervisão o impacto do uso excessivo de telas pode gerar transtornos de ansiedade e depressão, já que a criança entra em um mundo em que a maioria não é real. Pode fazer comparações com outras crianças e adolescentes e colocar expectativas sobre a própria vida, que são irreais. Isso acontece principalmente com adolescentes em relação a questões vinculadas ao corpo, hábitos, padrões de beleza, família e de estilo de vida que são distanciados do real e da vida pessoal de cada um.
As crianças aprendem com o acesso às telas, um imediatismo que é diferente do aprendizado comum, que acontece na vida e na escola. O aprendizado normalmente acontece a partir de um processo. A leitura de um livro é um processo mais demorado. Com o uso da tecnologia, crianças e adolescentes entendem que um clique magicamente “resolve tudo” e perdem a paciência em investir em algo mais demorado para ser assimilado. Adolescentes clicam e pedem um iFood, um Uber e não tem noção do custo do que consomem e de quanto é preciso trabalhar para pagar aquela corrida ou comida. Isto pode gerar uma visão distorcida do mundo e da vida. Não entendem como um processo, mas como um clique que vai resolver suas necessidades de imediato.
Outro ponto negativo é que muitas vezes o pensamento crítico é afetado. Eles ficam num processo muito de input. As mídias sociais trazem conteúdo, mas normalmente as crianças não desenvolvem um pensamento crítico em relação àquilo que se apresenta. Então eles veem vídeos e jogos e acompanham notícias e na maioria das vezes não possuem um pensamento crítico em relação aos conteúdos. É difícil que os pais impeçam que os filhos tenham acesso à internet, mas é importante que a escola e os familiares trabalhem esse pensamento crítico e alertem para o fato de que muitas vezes o que se apresenta nas redes sociais é distorcido da realidade.
A demência digital é uma consequência desse processo. Ela pode ocorrer, pois a posição muito passiva, da criança e dos adolescentes frente às telas, movimenta pouco o cérebro, como acontece com o idoso. Afeta a atenção. Como tudo se dá através do imediatismo, eles não desenvolvem uma atenção mais ampliada. Os focos são direcionados para o momento. Na hora de ir para a escola e prestar atenção ou ler um texto maior, não desenvolvem ou perdem a capacidade de memorização ou ampliação do vocabulário. Uma coisa preocupante é em relação à própria criatividade. É uma das questões cognitivas que fica ainda mais comprometida. Eles ficam no processo de input e de pouco output de informações digeridas e elaboradas.
A melhor maneira de evitar a demência digital, tanto em adultos como em crianças e adolescentes, é usar de forma saudável a tecnologia definindo limites de tempo, fazendo pausas regulares para relaxar o corpo e a mente, trocar o online pelo off-line, como a prática de exercícios físicos, a leitura de livros, um encontro com amigos, limitar as notificações no celular, evitar usar as redes sociais antes de dormir e promover a educação digital, isto é, o uso responsável da tecnologia, alertando para os riscos associados à utilização excessiva.
Mas o principal é ter um equilíbrio entre o mundo digital e a realidade, usando a tecnologia e as telas com moderação e aproveitando mais a vida real.
(*) É psicóloga clínica e jurídica. Perita do TJ/RJ em varas de família e assistente técnica judicial em varas de família e criminais em todo o Brasil. Mestre em sistemas de resolução de conflitos. Autora de livros e artigos na área jurídica.