João Luiz Simões Neves (*)
Outro dia me perguntaram se antifragilidade e resiliência não seriam o mesmo. Respondi que antifragilidade é algo que está além da resiliência. É uma característica que possui as mesmas qualidades, mas não só. A pessoa ou a empresa busca evoluir diante de situações adversas. Não é ser forte ou resiliente. Não é esperar até que as coisas se acalmem e, enquanto isso, resistir. O antifrágil vai evoluir com os impactos que sofrer.
Tanto pessoas quanto empresas podem se beneficiar de momentos turbulentos e prosperar em ambientes adversos. No meu livro Pensando Claramente – Uma Visão da Bondade falo sobre esse conceito, sobre quando ocorrências relevantes e inesperadas acontecem de tempos em tempos e provocam grandes impactos em nossa vida. Vivemos num contexto de aleatoriedade e de incerteza, e se soubermos domesticar a aleatoriedade e a incerteza usando a antifragilidade — conceito apresentado por Nassim Taleb em A lógica do Cisne Negro e Antifrágil —, iremos nos fortalecer e nos posicionar de forma bastante vantajosa quando elas acontecerem.
Uma das ocorrências recentes que marcou a humanidade como um todo foi a pandemia da Covid-19 com seu início no final de 2019. Pela necessidade do distanciamento social, novos modelos de negócios e novos hábitos surgiram, e o equilíbrio de forças econômicas e sociais se modificou de forma relevante, impulsionando alguns e prejudicando ou enfraquecendo outros. Os livros de Nassim Taleb já haviam sido escritos quando do advento da pandemia. Nem mesmo o Fórum Econômico Mundial, organização independente localizada em Genebra, Suíça, com o propósito de organizar debates sobre economia e outros temas relevantes para o planeta, em seu documento Global Risks Report, edição 2020, havia considerado relevante o risco de pandemia. No relatório, o risco de doenças infecciosas não constava nem entre as dez maiores probabilidades, estando ranqueado apenas como o décimo risco em impactos que poderia ocasionar.
Como Taleb diria, “algumas coisas se beneficiam dos impactos; elas prosperam e crescem quando são expostas à volatilidade, ao acaso, à desordem e aos agentes estressores”. Ele ainda aponta que o tempo é semelhante a volatilidade, quanto mais tempo, mais acontecimentos, portanto mais desordem. A fragilidade é perdida com o tempo e ser antifrágil é saber prosperar com os fatores estressores, o inesperado. A privação e a proteção de agentes estressores nos prejudicam. A adversidade é, para o futuro, uma oportunidade. À luz desses conceitos, segue uma diretriz de grande valia: nunca devemos destruir por completo a oposição. O contraponto é fundamental, pois nos ajuda a refinar as nossas teses e as nossas competências. Se conquistarmos e desenvolvermos competências para nos aproveitar das situações dessa maneira, iremos nos posicionar numa situação bastante vantajosa.
Seguindo pelo pensamento empresarial, o erro não deve ser um aspecto da lógica empresarial a ser totalmente condenado. Se ocorrer no momento correto (por exemplo, num processo de inovação), o erro permite aprender lições e torna as pessoas e as instituições resilientes a ele. Assim nos fortalecemos, encontramos novas visões e caminhos. Não ser intolerante com o erro, mas construir resiliência a partir dele. O fracasso nos ensina mais que o sucesso, se soubermos fazer a leitura certa e o incorporarmos ao nosso aprendizado. Muitas vezes o problema não é o ocorrido indesejável em si, mas a forma como este é tratado. Em muitas situações, temos como reverter os efeitos negativos a nosso favor e transformá-los em consequências positivas. Depende muito da forma como capitalizamos o ocorrido, reforçando o problema ou, por outro lado, tirando proveito dele.
O antifrágil aprecia o imprevisível, a aleatoriedade, pois se abre um espaço para a criação, para a inovação, espaço esse não aproveitado pelos agentes que não estavam prevendo ocorrências. O antifrágil se aproveita dos erros e dos acontecimentos para se tornar mais resiliente, mais antifrágil ainda.
Para Taleb, o que não sabemos é mais importante do que o que sabemos. Livros lidos são menos valiosos que os não lidos ainda. Assim, devemos formar uma “antibiblioteca”: “superestimamos o que sabemos e subestimamos a incerteza por meio da compressão da faixa de estados incertos possíveis, ou seja, reduzindo o espaço do desconhecido”. Steve Jobs dizia estar orgulhoso tanto das coisas que tinha feito quanto das que não tinha feito. Inovação também é dizer não a muitas coisas. Devemos nos posicionar em situações assimétricas e não lineares. Assimetria significa nos colocar em situações de risco, nas quais, se perdermos, perderemos pouco ou teremos perdas limitadas, e, se ganharmos, ganharemos mais ou teremos ganhos ilimitados.
Trabalhar na construção de estratégias em que teremos mais a ganhar do que a perder. O risco é intrínseco às nossas atividades. Incorremos em riscos tomando decisões e fazendo coisas, como também não fazendo. A não ação também é um ato de determinação. Quantos heróis existem por não terem feito algo? Na Guerra Fria, por exemplo, quantos botões deixaram de ser apertados, mesmo que as regras, procedimentos e ambições direcionassem para isso? Construir flexibilidade para a sua empresa é o grande papel do CEO. Não sabemos qual será o futuro. Mas, qualquer que seja, se nos momentos decisivos tivermos flexibilidade para poder optar por alternativas diversas e tivermos construído condições estratégicas e acumulado recursos e capitais para seguir o caminho que acharmos adequado, teremos construído uma organização ou uma carreira forte e sustentável.
A opção é um agente da antifragilidade. A incerteza permeia nossos pensamentos, decisões e projeções do futuro, mas temos como qualificá-los adequadamente por meio da abordagem correta, desafiando, inclusive, o que pensamos conhecer ou não: O conhecimento negativo (o que é errado, o que não funciona) é mais robusto a erros do que o conhecimento positivo (o que é certo, o que funciona). Assim, o conhecimento cresce por subtração, muito mais do que pelo acréscimo — considerando-se que o que conhecemos hoje pode vir a se mostrar errado, mas o que sabemos ser errado não pode se revelar certo, pelo menos não com tanta facilidade. Assim, volto a reforçar que a diversidade, a volatilidade, os contrapontos e as anomalias e dizer que são de fundamental importância para nossas empresas e para nossas carreiras, individualmente. Pensar claramente passa por incorporar essas condições de forma positiva em nossas vidas, afinal, evitar pequenos erros faz com que os grandes sejam piores.
(*) É economista formado pela Unicamp, com MBA pela Business School São Paulo e Programa Executivo pela Universidade de Toronto, possui especializações em análise de sistema e marketing.
Atualmente, é diretor da Global Results, consultoria especializada em gestão e liderança (www.globalresults.com.br), além de palestrante e escritor da área de gestão e liderança, com artigo internacional publicado na revista Apics – EUA.