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Afinal, o Código de Defesa do Consumidor é vilão ou aliado das empresas?

em Manchete Principal
segunda-feira, 28 de junho de 2021

Danielle Braga Monteiro (*)

As relações de consumo mudaram ao longo dos anos, os consumidores estão cada vez mais conectados, conscientes dos seus direitos e a cada dia mais exigentes. Mas o que você, enquanto administrador da empresa, tem feito com essa informação? Preparar seu negócio para atender a legislação a que se submete é um passo fundamental para o sucesso da empresa e para garantir o pilar de uma reputação bem-sucedida.

Estruturar seu plano de negócios ou remodelá-lo para atingir a plena satisfação do consumidor e evitar qualquer frustração é uma forma de fidelizar e garantir que ocorra o consumo recorrente e a divulgação gratuita do produto ou serviço através da indicação, o que hoje, em um mundo conectado, se torna ferramenta essencial para o sucesso de todo negócio.

Sabemos que existe um elevado grau de subjetividade no fenômeno da experiência satisfatória do cliente, e o desafio do empresário, nesta ótica, está em atender os critérios para alcançar a conversão em resultados planejados. Mas, por onde começar? O desafio é grande e a busca pelo diferencial em setores extremamente competitivos demandam uma postura consciente e atenta do empresário.

Não é apenas o produto ou serviço final que requer um diferencial, mas é também na forma de fazer o negócio com excelência que reside a grande diferença entre a sua marca e a do concorrente. E nessa perspectiva é possível e preciso mudar a forma que se enxerga o Código de Defesa do Consumidor (CDC) na rotina empresarial. Esse pode ser o seu grande diferencial neste momento.

Será que não podemos transformá-lo em aliado ao invés de o vilão destruidor de sonhos e negócios? Se sua aplicação é uma realidade que não pode ser modificada, o que fazer, enquanto empresa, para tornar a convivência mais leve e vantajosa para todos?

Imagem: Freepik

O primeiro passo é entender que em todas as etapas do negócio, incluindo o lançamento do produto ou serviço ao eventual recall, existem direitos e obrigações que precisam de um olhar especializado e cuidadoso para resguardar a saúde jurídica e financeira da empresa, e o consequente resultado promissor daquele negócio

O CDC, Lei no 8078/90, foi editado para regulamentar o mercado de consumo no Brasil, equilibrando as relações entre fornecedores e consumidores. Sua existência estabelece princípios que visam garantir a excelência dos produtos e serviços, que é exatamente o que toda empresa e seus clientes buscam. Portanto, tratar as partes reguladas por esta lei como vilão e vítima não parece ser o melhor enquadramento prático a ser adotado no seu negócio, pelo contrário.

Para que se alcance resultados satisfatórios e para que eles se perpetuem ao longo do tempo, é preciso fazer bom uso das ferramentas legais e manter a lei ao seu lado. Mas se ela é uma lei que define e prescreve uma série de obrigações, como encará-la como aliada?

A resposta está na própria essência do tema. Consumidores exigentes compram e contratam com quem se destaca e entrega com diferencial um produto ou serviço de excelência. E a excelência é justamente o que o CDC busca em sua essência. Em um mundo competitivo e dinâmico, a busca pela entrega de produtos e serviços de excelência é algo inerente ao mercado.

Observar o CDC como uma lei que serve exclusivamente para proteger o consumidor é a interpretação mais fácil e superficial que se pode dar para sua dimensão e potência. Dar vida aos princípios estabelecidos pelo código não é apenas garantir que o consumidor não será prejudicado.

Muito além disso, é uma forma de agir em zona de segurança jurídica e entregar de ponta a ponta serviços ou produtos diferenciados para um nível de consumidor exigente, informado, conectado e extremamente crítico. É cada vez mais comum no mercado, consumidores que valorizam empresas alinhadas com seus valores pessoais e que observam e prestigiam os pequenos detalhes e cuidados, que fomentam em uma cadeia orgânica de troca de informações: dicas, indicações e sugestões.

Por outro lado, quando não atendida de forma satisfatória, essa nova geração de consumidores, além de ingressar com demandas administrativas e judiciais – que podem gerar multas, penalidades e condenações elevadíssimas – dissemina sua experiência negativa em seu círculo de amizades virtuais e pessoais, gerando um prejuízo exponencial para a imagem da empresa, no que se chama de marketing negativo.

Imagem: Freepik

Voltamos aqui para a chave da questão: a satisfação do cliente é o grande desafio do negócio. O empresário pode e deve usar todas as ferramentas disponíveis em seu benefício, incluindo o CDC, no rol de aliados. Se você tem ou administra uma empresa, é essencial conhecer as regras aderentes ao negócio, e nesse ponto um especialista é uma boa opção para estruturar um plano de adequação, revisar as cláusulas dos contratos para garantir segurança jurídica e mitigar os riscos de uma eventual disputa judicial.

Saber o que o Código prevê e regulamenta acerca dos direitos e obrigações dos consumidores e fornecedores, as práticas comerciais adequadas, a proteção contratual, as sanções administrativas, a atenção exigida na qualidade do produto e serviço e as ações para prevenção e reparação de danos, é estar à frente e adequado as expectativas do novo mercado de consumo.

Criar regras de procedimentos para seus funcionários e trabalhar o CDC na base, também é um bom caminho para implementar um compliance bem sucedido. Tenha o CDC disponível para consulta dos funcionários e clientes. Um consultor poderá treinar e reciclar seu time de colaboradores para atender as normas alinhadas com o seu plano de negócio. Saiba usar estratégias de marketing positivas que ressaltem sua cultura, alinhada com as demandas e o perfil do consumidor.

Em uma sociedade em que o número de processos judiciais e reclamações administrativas decorrentes de assuntos regulados pelo CDC é extremamente elevado – de acordo com o último relatório “Justiça em Números’, divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça em agosto/20, o assunto mais demandado na Justiça Estadual foi a “Responsabilidade do Fornecedor/Indenização por danos morais” – é preciso mudar o olhar da empresa e treinar a sociedade para receber excelência, tolerando exceções pontuais.

Partirá das empresas comprometidas com seus objetivos e alinhadas com o novo tempo em que vivemos, operar a transformação da mentalidade dos consumidores e, por tabela, do Poder Judiciário, transformando as adversidades em novas oportunidades.

(*) – É advogada graduada pela Faculdade Nacional de Direito da UFRJ, pós em Direito do Consumidor e Responsabilidade Civil pelo Instituto AVM da Universidade Candido Mendes e sócia do escritório Albuquerque Melo Advogados.