Maira Caleffi (*)
Somente em 2018, o câncer foi responsável por 9,6 milhões de mortes em todo o mundo.
Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), uma a cada seis mortes tem relação com a doença, o que torna o câncer a segunda principal causa de óbito no planeta. Os números causam extrema preocupação. Em diversos países a taxa de mortalidade vem aumentando, mesmo que estejamos presenciando o surgimento de tratamentos e técnicas que visam diminuir o impacto do câncer e garantir mais tempo e qualidade de vida aos pacientes.
Frente a esse panorama, no âmbito internacional, a discussão a respeito da Cobertura Universal de Saúde tem ganhado força na última década. Este modelo pressupõe um sistema que oferece todos os tipos de serviço de saúde, desde os mais básicos aos mais complexos, para toda a população, gratuitamente e sem discriminação.
No Brasil, temos bastante familiaridade com isso: o SUS é um exemplo desse tipo de sistema, visto como referência internacional em saúde. Por meio dele, ninguém precisa se colocar em risco financeiro para obter um serviço de qualidade – ou, pelo menos em tese, não precisaria.
A Cobertura Universal de Saúde foi considerada prioridade para o desenvolvimento sustentável pela ONU e tem sido pauta das principais discussões entre órgãos e representantes de saúde de diversos países. Foi, inclusive, debatida no painel “Além das manchetes: o que será necessário para enfrentar o crescente impacto do câncer”, realizado em Genebra, durante a 72ª Assembleia Mundial da Saúde, promovida pela OMS, do qual aceitei honrosamente participar e representar a voz dos pacientes.
O crescente interesse de governos ao redor do mundo por oferecer a saúde, um direito básico e fundamental, gratuitamente a todos demonstra, certamente, um cenário positivo. Porém, por que mesmo em países que já adotam esse sistema, o câncer continua tendo uma alta taxa de mortalidade? É necessário olhar para os modelos que já existem e aprender com suas trajetórias.
É notório que a doença ainda não é tratada como prioridade no Brasil, por exemplo – os pacientes atendidos pelo SUS acabam enfrentando desafios em relação ao câncer muito em função da falta de um bom planejamento, gestão e recursos bem administrados. A Cobertura Universal de Saúde é uma estratégia em tese eficaz para trazer respostas ao controle do câncer. No entanto, as dificuldades que precisam ser enfrentadas para mudar as taxas de mortalidade crescentes para a doença estão relacionadas à falta de acesso da população ao que essa cobertura deveria oferecer.
De maneira geral, a falta de programas estruturados de prevenção e rastreio para a maioria dos cânceres, as longas esperas para confirmação do diagnóstico oncológico e para o início do tratamento, opções restritas de tratamento oferecidas aos pacientes e a falta de acesso a abordagens multidisciplinares, equipes de profissionais de diversas especialidades que atuam na melhora dos prognósticos e qualidade de vida dos pacientes, são fatores importantes para entender os motivos pelos quais ainda não conseguimos virar esse jogo, mesmo já usufruindo há 30 anos da cobertura universal em nosso país.
Há vidas lutando contra o câncer neste momento. Quase 10 milhões delas foram perdidas mundialmente, só no último ano, por conta da doença. Será que isto não é grave o suficiente para repensar a assistência à doença e colocá-la no topo da lista de prioridades, contribuindo até mesmo com a criação de um modelo eficiente adaptado a cada realidade para reduzir seu impacto no mundo?
(*) – É presidente voluntária da Federação Brasileira de Instituições Filantrópicas de Apoio à Saúde da Mama e Chefe do Serviço de Mastologia do Hospital Moinhos de Vento.