Geração nem-nem já soma 11 milhões de jovens no País
O número de jovens que não estudam nem trabalham (os chamados nem-nem) é alto, mas não se deve desistir, afirmam especialistas dedicados à questão. A qualificação de jovens que vivem em abrigos para que tenham mais chances e deixem o universo dos nem-nem é o objetivo de projeto já aprovado pela Comissão de Assuntos Sociais (CAS)
Foto: Pillar Pedreira/Ag.Senado Jovens no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Brasília: educação deve ir além, dizem especialistas. |
Aline Guedes/Ag.Senado/Especial Cidadania
Do senador Ciro Nogueira (PP-PI), o projeto garante a esses jovens o acesso gratuito e com prioridade aos cursos de educação profissional e tecnológica. Também estabelece cotas para a contratação de adolescentes abrigados em programas de jovens aprendizes. O relator da proposta, Armando Monteiro (PTB-PE), acredita que a medida vai assegurar a educação e a entrada desses jovens no mercado de trabalho.
“A proposição, a nosso juízo, foi muito feliz em perceber o quanto é desoladora essa realidade. E em oferecer os mecanismos necessários para sua superação”, afirmou. O texto aguarda votação na Comissão de Educação (CE).
O alto índice de desemprego entre jovens é um problema mundial. Segundo a Organização Internacional do Trabalho (OIT), eles representam mais de 35% dos desempregados do planeta. Nesse grupo, a diferença entre os gêneros é expressiva: as mulheres jovens respondem por 34,4%, enquanto os homens jovens são 9,8%. Na lista dos dez países europeus com mais jovens nem-nem, estão Grécia (39,1%), Espanha (33,4%), Itália (30,8%), França (20,4%) e Portugal (20,3%).
No Brasil, 23% da população entre 15 e 29 anos de idade, ou mais de 11 milhões de jovens, não estudam ou trabalham. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), na pesquisa nacional por amostra de domicílios de 2012, os nem-nem eram 9,7 milhões, num universo de 49,4 milhões de jovens. De acordo com o instituto, entre 2016 e 2017, cerca de 619 mil se juntaram a eles.
Para a especialista em mercado de trabalho e professora da Faculdade de Administração da UnB, Débora Barem, o difícil cenário começou no momento em que muitas portas de emprego se fecharam, a renda diminuiu e, consequentemente, os jovens e suas famílias não conseguiram mais custear os estudos.
De acordo com a professora, muitos jovens ainda enfrentam dificuldades para definir em qual área desejam trabalhar, e isso se agrava pela falta de orientação dentro das universidades. “Apesar de o auge da crise econômica do país já ter passado, ainda estamos num momento muito ruim, em especial para essa faixa etária”.
Morador de Planaltina (DF), Douglas Belisio Farias de Albuquerque, de 22 anos, divide a casa com a mãe (que é pensionista e arca com todas as despesas), a irmã, de 25 anos, que faz trabalhos temporários como manicure e cabeleireira, e uma sobrinha de 9 anos. Enquadrado desde 2015 na categoria dos que não estudam nem trabalham, ele não conseguiu uma colocação no mercado após terminar estágio por meio do Programa Jovem Aprendiz.
Para Albuquerque, a escola está longe de preparar os jovens, já que faltam capacitação e oportunidades para que eles adquiram a experiência tão exigida hoje. “Muitos de nós terminam o ensino médio, não conseguem entrar para uma universidade nem se colocar profissionalmente e acabam ficando em casa, por falta de opção”.
A situação não é diferente para Alyson Maia, de 24 anos. Demitido do emprego de supervisor de vendas, o jovem não pôde mais pagar a faculdade de recursos humanos e foi obrigado a abandonar o curso quando faltava apenas um semestre para a formatura. Como a mãe não podia sustentar a casa e ainda os estudos do jovem, Maia também foi obrigado a ficar parado. Depois de concluir um curso de vigilante, o rapaz distribui currículos num mercado de trabalho cada vez mais disputado. “Meu sonho é terminar minha faculdade e começar outra, de odontologia”.
É difícil bater insistentemente em uma porta que não se abre. A professora Débora Barem afirma que, apreensivos com o futuro, esses estudantes sofrem de ansiedade com a possibilidade de não se colocarem no mercado de trabalho. Também destaca que a falta de ocupação pode resultar em problemas de saúde, como a depressão.
O deputado distrital Professor Israel (PV) vai além: diz que, em vez de nem-nem, esses jovens deveriam ser classificados como “sem-sem”, pois estão sem oportunidades e sem acesso a estudo gratuito e de qualidade.
Ele assegura que não se trata de filhos mimados, mas de pessoas que precisam de oportunidade, a fim de não se tornarem duplamente punidas. “Estamos falando da realidade de mais de 11 milhões de jovens brasileiros, sendo que mais de 70% deles estão entre os mais pobres do nosso país. Mas o Brasil tem potencial para ser líder mundial em valorização desses jovens”, disse Professor Israel, que assumirá uma vaga de deputado federal em 2019.
Estudo do Ipea traz uma análise detalhada do mercado de trabalho no Brasil. Segundo o documento, 73% da geração nem-nem é formada por mulheres, tendo a gravidez precoce como principal causa. A pesquisadora do Ipea Maria Andréia Lameiras aponta ainda a falta de qualificação profissional como uma das dificuldades para que os jovens conquistem uma vaga. “Uma das saídas para esse problema seriam cursos específicos, de curta duração e com objetivo mais determinado, a fim de qualificar essa mão de obra”, explica Maria Andréia.
O Brasil tem 3 milhões de pessoas desocupadas que estão procurando emprego há mais de dois anos, e cerca de 5 milhões de desalentados — aqueles em idade ativa que desistiram de procurar trabalho porque perderam a esperança. Segundo o Ipea, metade deles não completou o ensino fundamental, 25% estão na faixa etária de 18 a 24 anos e 60% moram no Nordeste.
A preocupação com a geração nem-nem foi demonstrada pelo relator da proposta que reformou o ensino médio, o senador Pedro Chaves (PRB-MS). Na discussão do texto, no começo de 2017, o parlamentar disse acreditar que a mudança no ensino médio ajudaria a criar novos padrões para a plena realização dos potenciais dessa juventude.