Fernando Valente Pimentel (*)
Precisamos analisar com serenidade e bom senso as declarações do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, sobre um pretenso protecionismo do Brasil.
É prudente, mesmo para os que defendem a abertura unilateral de nosso país, refletir com realismo sobre a questão, considerando o presente cenário internacional e a conjuntura interna. Precisamos, sim, nos engajar mais com o mundo, mas de maneira planejada e estruturada, avançando concomitantemente na agenda da competitividade e da produtividade e por meio de acordos internacionais que envolvam, comércio, serviços e investimentos.
Nosso país mantém impostos de importação coerentes com suas possibilidades e grau de competitividade. Há, ainda, a questão das reciprocidades, num cenário global em que se assiste ao recrudescimento do protecionismo em alguns mercados. Porém, não podemos acreditar que somos anacrônicos protecionistas e permitir que o mundo nos rotule assim. Somos respeitados na Organização Mundial do Comércio (OMC), na qual o Brasil é um importante ator na defesa do multilateralismo para o comércio global.
Temos déficit comercial em numerosos segmentos, conforme atualíssimo exemplo expresso nos dados de comércio exterior da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit): em relação a igual período do ano passado, de janeiro a setembro de 2018, as importações do setor (US$ 4,2 bilhões) cresceram 13,9%, diante de um mercado que não apresentou expansão e sim queda. Seriam esses números peculiares de um país protecionista?
Obviamente, não devemos nos resignar ao nosso presente estágio no mercado global. No tempo certo e sob as condições adequadas, precisamos almejar mais abertura e ampliação de nossos fluxos comerciais e de investimentos. Isso implica lições de casa profundas. Não é viável, entretanto, a redução imediata e unilateral do imposto de importação, muito menos num momento no qual o Brasil está negociando acordos com várias nações e blocos.
O País precisa desenvolver fundamentos eficazes para ampliar a abertura, sob risco de promovermos uma aceleração ainda maior da desindustrialização e agravarmos o sério problema do desemprego. Temos carga de impostos, inclusive sobre os investimentos, e juros reais entre os mais altos do Planeta; câmbio invariavelmente desfavorável às exportações; e infraestrutura deficiente e onerosa. Todos esses fatores são prejudiciais à competitividade.
São urgentes, portanto, as reformas estruturais, como a tributária e a previdenciária, e o combate à burocracia e insegurança jurídica. Sem essas medidas, nosso mercado ficaria muito prejudicado ante uma abertura extemporânea e não ganharia nada em troca, principalmente se não fizermos essa inserção por meio de acordos internacionais.
Uma abertura unilateral abrupta seria um golpe em nossa indústria, que é bem estruturada e tem uma história concreta de competitividade intramuros, apesar do muito que ainda teremos de fazer para estar em linha com as profundas transformações representadas pela chamada Indústria 4.0. Abrir mais as nossas fronteiras é um ato que exige planejamento e avanço dos fatores internos que influenciam nosso grau de competitividade.
Melhorar a capacidade brasileira de competir em patamares mais elevados no mercado global é uma tarefa árdua e importante para o novo presidente da República e a próxima legislatura do Congresso Nacional. Claro que não dará para esperar o País ficar pronto para estarmos inseridos no mundo, mas o açodamento poderá ser fatal para o presente e as nossas pretensões futuras.
(*) – É presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit).