Juiz detergente
Ele não foi o primeiro a ser considerado incorruptível.
Afinal um juiz tem poder para interferir em muitos assuntos públicos, da libertação de um preso a uma tentativa dos bancos formarem um cartel para dominar o mercado e impor taxas de juros escorchantes. Sua imagem estava mais associada ao bom senso, a coragem de enfrentar os adversários, mesmo os que se encastelavam no poder judiciário e nem todos os juízes podiam mostrar publicamente que não estavam a serviço desde ou daquele poderoso.
Não admitia os chamados jocosamente de “embargos auriculares“, ou seja quando as poderosas e riquíssimas bancas de advogados o pressionavam para que analisasse os casos sub judice com a ótica dos contratantes dos seus serviços.
Não era fácil resistir às pressões. Sua nomeação foi confirmada pelo senado, como manda a constituição, mas a sabatina, não foi uma ação entre amigos, nem um happy hour oferecido no final da tarde na capital, como tantos outros juízes da suprema corte tinham patrocinado. O resultado foi não foi folgado, 22 senadores votaram contra sua indicação pelo presidente que também saiu chamuscado do episódio. Tudo foi acompanhado e retratado pela imprensa.
A mídia ganhou musculatura com jornais que atingiam milhões de leitores. As ações do juiz, ora eram duramente criticadas, ora exaltadas como de grande sabedoria e coragem. As críticas eram dirigidas diretamente a ele e amplificadas pelos partidos políticos e associações de toda ordem. Para o bem o para o mal ganhou notoriedade.
Boa parte da população nunca tinha ouvido falar no seu nome e nem tinha ideia o que fazia um juiz na suprema corte, mas o fato é que tornou-se conhecido em todo o pais, convidado para palestras em universidades, cursos nas faculdades de direito, aulas magnas em grandes eventos culturais. Nem uma coisa nem outra mexeram com o seu ego.
Recusou-se a se tornar uma celebridade ainda que sua foto e frases aparecessem em diversas publicações populares. Ainda que sob uma chuva de críticas saiu em defesa da liberdade de expressão. Separou de uma forma clara o jornalismo da publicidade. Dizia que além de exigir da mídia a busca da isenção, era possível se afastar dela quando o público julgasse que não estava sendo equilibrada.
Parar de comprar um jornal, uma revista, ou desligar os aparelhos eram as armas que qualquer cidadão tinha ao alcance da mão e poderia usar quando bem entendesse. Ninguém era obrigado as se submeter às opiniões e críticas dos jornalistas. Havia que se preservar a pluralidade das versões.
Um juiz sempre foi respeitado pela sociedade. Concordando ou não com as suas decisões, o judiciário encontrou um nicho importante para a sua atuação na democracia. Era um dos contra pesos que atuava entre as disputas no congresso ou mesmo quando havia choque entre os poderes executivo e legislativo. Ser indicado pelo presidente de plantão de forma alguma vinculava o magistrado aos interesses do governo ou do partido político que estava no poder.
As portas do tribunal estavam fechadas para a charlatanice e as jogadas de bastidores que nem sempre a população tinha conhecimento. Sob essa ótica e até mesmo contra a vontade do seu próprio partido, o presidente Woodrow Wilson, nomeou Louis Brandeis para a Suprema Corte. O juiz atuou em muitas ações e buscava sempre o que chamava de justiça social. Quando era um advogado aproximou-se dos sindicatos e desenvolveu uma série de trabalhos pelos quais nada cobrava, defendendo trabalhadores.
Apoiou abertamente as ações do programa de recuperação nacional desenvolvido sob a liderança de Franklin Roosevelt, o New Deal. Foi autor de uma série de frases famosas, mas nada superou uma que pode ser aplicada em qualquer parte do mundo, seja em que idioma for: “A luz do sol é o melhor detergente”.
(*) – Jornalista, editor chefe, âncora do Jornal da Record News em multiplataforma.