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Estado precisa sintonizar-se com a manufatura avançada

em Opinião
quarta-feira, 28 de março de 2018

Fernando Valente Pimentel (*)

Necessidade de reavaliação permanente dos programas realizados com dinheiro público.

O Banco Mundial, em seu novíssimo relatório “Um ajuste justo: análise da eficiência e equidade do gasto público no Brasil”, dá números, forma e dimensão precisa a algo que todos nós sabemos há muito tempo: o Estado, em nosso país, gasta mais do que arrecada e aplica o dinheiro de maneira pouco eficaz. Esta síntese explica em grande parte o porquê de estarmos perdendo tantas posições no contexto econômico e comercial internacional e as dificuldades enfrentadas há tanto tempo pelos setores produtivos.

Louve-se o fato de o governo ter encomendado o estudo ao Banco Mundial, ainda no período em que a pasta da Fazenda era ocupada por Joaquim Levy, no contexto de um esforço voltado a sanar o déficit fiscal e corrigir as distorções relativas à Previdência, gastos com o custeio e salários, burocracia e emperramento da máquina pública.

Em meio a todas essas questões, há um aspecto importante a ser enfatizado, que se pode inferir no trabalho do banco: a necessidade de reavaliação permanente dos programas realizados com dinheiro público, para medir sua eficiência. É o princípio do orçamento anual de base zero, que permite nortear de modo mais eficaz a aplicação dos recursos públicos.

A análise é interessante e pertinente, pois evidencia um problema sério do Brasil: o Estado e o governo não caminham no mesmo ritmo e frequência das empresas. Neste momento, por exemplo, no qual a indústria já busca inserir-se no contexto da manufatura avançada, o setor público segue, com as exceções de praxe, em ritmo analógico, a despeito de várias iniciativas e ações lançadas no sentido de destravar o País e equilibrar as contas públicas.

O descompasso entre o público e o privado reflete-se, sim, na redução da competitividade de nossos setores produtivos, em especial a indústria. Eficácia empresarial depende de linhas adequadas de financiamento, juros acessíveis, normas duradouras e claras e não voláteis, políticas públicas de infraestrutura, segurança, saúde e logística, sistema tributário justo e descomplicado, segurança jurídica, condições inerentes ao papel do Estado nas nações democráticas, que é o de servir à sociedade.

Em todos esses indicadores, o Brasil está defasado em relação às principais economias e até mesmo às emergentes. A verdade é que o mundo civilizado avança no nivelamento e sintonização do Estado na frequência de eficácia e dinamismo na qual vibram as empresas. Por isso, é premente que o governo e o setor público brasileiros também ingressem na era da chamada indústria 4.0.

Tal avanço é fundamental para que nossa manufatura e todos os setores produtivos consolidem esse decisivo processo de transformação e possam recuperar sua competitividade sistêmica, ganhando novos espaços e mercados no cenário da globalização.

Não se pode simplesmente culpar as indústrias nacionais, como às vezes se observa, por serem ‘menos competitivas’ do que suas congêneres de outros países que apresentam melhores ambientes de negócios. Sem exageros e reconhecendo que todos os dias temos de fazer mais e melhor com menos recursos, nossa manufatura, intramuros, tem todas as condições de competir no mercado mundial.
Entretanto, no ambiente externo às suas instalações, há numerosas dificuldades tributárias, jurídicas, legais, burocráticas e de infraestrutura a serem solucionadas.

Tomara que o estudo do Banco Mundial, embora redundante em relação a tantos outros já realizados por entidades de classe, economistas e instituições acadêmicas de reconhecida competência, possa desencadear um saudável processo de sintonia do Estado com a iniciativa privada. Isso será decisivo para que o Brasil seja protagonista e não um mero polo passivo no contexto das nações e dos negócios mundiais, criando assim melhores padrões de vida para a população.

No advento das grandes mudanças tecnológicas, nas quais a manufatura avançada é um dos destaques, não poderemos ficar para trás devido a uma sintonia insuficiente entre o setor público em sua abrangência maior e o setor privado.

(*) – É presidente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (ABIT).