Vivaldo José Breternitz (*)
A biometria é a base da tecnologia de reconhecimento facial, comumente usada para tarefas diárias como desbloquear telefones, abrir portas e marcar amigos nas redes sociais, mas também usada por forças de segurança para identificação de suspeitos ou procurados.
Nos últimos dias, no Afeganistão, o Taleban teria apreendido dispositivos biométricos usados pelos militares americanos que poderiam ajudar a identificar cidadãos afegãos que trabalharam para as forças da coalizão, levantando preocupações no sentido de que o Taleban possa obter informações que permitam perseguir essas pessoas.
Os dispositivos, conhecidos como HIIDE (Handheld Interagency Identity Detection Equipment), armazenam informações relativas a varreduras da íris, impressões digitais e dados pessoais, podendo também ser usados para acessar um amplo banco de dados centralizado. Os HIIDE têm desempenhado um papel fundamental na guerra contra o terrorismo, tendo ajudado a identificar Osama bin Laden durante a operação que o matou em 2011 no seu esconderijo paquistanês.
No Afeganistão, foram usados para coletar dados biométricos de 80% da população afegã, ou cerca de 25 milhões de pessoas, até o início deste ano. Mais de 300 mil civis afegãos prestaram serviços às forças da coalizão nas últimas duas décadas, de acordo com o Comitê Internacional de Resgate. Como a retirada militar desencadeou o caos no país, apesar de 2 mil terem sido evacuados para os Estados Unidos, milhares de outros permanecem no Afeganistão.
É quase certo que, pessoas que trabalharam para a coalização como tradutores, motoristas, intérpretes e em outras funções, bem como seus familiares, venham a sofrer violências se o Taleban conseguir identificá-los. Em 2019, o governo chinês usou um software de reconhecimento facial para rastrear e controlar 11 milhões de uigures, uma minoria quase totalmente muçulmana que vive no país.
Utilizando uma ampla rede de câmeras de vigilância, a tecnologia identificou uigures com base em sua aparência, monitorou seus movimentos e colocou mais de um milhão deles e pessoas de outras minorias em campos de detenção situados na região de Xinjiang, no noroeste da China.
O reconhecimento facial é uma tecnologia que pode ser extremamente útil, mas que precisa ser utilizada com extremo cuidado.
(*) – Doutor em Ciências pela USP, é professor da Faculdade de Computação e Informática da Universidade Presbiteriana Mackenzie.