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Aspirina: a Coca-Cola das farmácias

em Tecnologia
quinta-feira, 28 de novembro de 2024

Serve para dores de cabeça, nas costas, no estômago. Febre e dores musculares. Dizem que reduz em 20% a probabilidade de um segundo ataque cardíaco e que até mesmo pode prevenir algumas formas de câncer.

Vivaldo José Breternitz (*)

Nestes tempos em que inteligência artificial e computadores quânticos prometem grandes avanços na área de desenvolvimento de medicamentos, é bom lembrar a Aspirina, que nasceu apenas com a missão de combater as dores do reumatismo e que, quase 130 anos depois, ainda é um sucesso.

A Aspirina tem muito a ver com tecnologia:   foi o primeiro fármaco a ser sintetizado na história da farmácia e não recolhido na sua forma final da natureza. Foi a primeira criação da indústria farmacêutica.

Sua história teve início quando o francês Charles Frédéric Gerhardt e o alemão Karl Kraut começaram a estudar a salicina, o princípio ativo da planta Spiraea ulmari. Mas foi em 1897 que Felix Hoffman, um jovem farmacêutico da companhia alemã Bayer, que procurava um jeito de ajudar o pai a combater o mal-estar crônico provocado pelo reumatismo, com a ajuda do professor Heinrich Dreser sintetizou o ácido acetilsalicílico, criando a fórmula de uma droga capaz de aliviar a dor sem muitos efeitos colaterais.

No ano seguinte a Bayer testou a nova droga com 50 pacientes, provando ser a mesma extremamente eficaz; mandou o produto para testes médicos e os resultados foram impressionantes. Além disso, a Bayer enviou um livro de 200 páginas sobre o medicamento para 30.000 médicos, mostrando as vantagens da nova droga – foi a primeira grande mala-direta da história.

Em 1899, o ácido acetilsalicílico foi lançado comercialmente na Alemanha sob a marca Aspirin; era inicialmente entregue às farmácias na forma de pó, em frascos de 250 gramas; estas o revendiam em embalagens de papel de um grama.

O nome Aspirin vem dos compostos usados na fabricação do remédio: “A” de Acetil, “Spir” da planta Spiraea ulmaria (de onde era retirada a Salicina) e “In” um sufixo comum para medicamentos.

O produto fez sucesso rapidamente, mas tinha uma desvantagem – era pouco solúvel em água. Mais uma inovação da Bayer: para resolver o problema, o produto passou a ser comercializado, em 1901, na forma de comprimidos, sendo, um dos primeiros medicamentos do mundo a estar disponível em uma dosagem padronizada.

A formulação em comprimido tinha três vantagens principais: assegurar que cada comprimido tivesse uma dosagem exata do ingrediente ativo, acabar com a falsificação do produto, e reduzir os custos de produção.

Os primeiros registros de venda da Aspirina no Brasil datam de 1901. O sucesso do novo medicamento foi tanto, que já em 1906, ano em que a marca foi registrada internacionalmente, a imprensa da época chamava a Aspirina de “The Wonder drug” (A droga maravilhosa).

A propaganda boca a boca garantiu fantásticos rendimentos à Bayer. Não só na Alemanha, como nos outros países da Europa e do resto do mundo, ela dominava o mercado. Há até quem diga que foi ela a verdadeira impulsionadora (ou criadora) da indústria farmacêutica. Produtos derivados foram sendo lançados, como a CafiAspirina, indicada para a enxaqueca, pois combina a ação analgésica e anti-inflamatória do ácido acetilsalicílico com um agente potencializador (cafeína).

A Bayer perdeu a posse da marca Aspirina em muitos países após a Primeira Guerra Mundial, como reparação de guerra aos países aliados. Outros problemas, como falsificações, afetavam a Bayer, mas a percepção de que o remédio ajudava a prevenir enfartes deram nova vida ao produto, no início da década de 1950 – em 1952, o Livro Guinness dos Recordes apontava a Aspirina como o analgésico mais consumido do mundo.

Na década de 1960, a Aspirina foi ameaçada pelos medicamentos à base de paracetamol e suas vendas caíram muito – mesmo assim, em 1969 as pílulas brancas chegavam à Lua, a bordo da nave Apollo 11, prontas para livrar os astronautas norte-americanos de eventuais dores de cabeça.  

Hoje, Aspirina é marca registrada da Bayer na Alemanha e em mais de 60 países. Calcula-se que o mundo consome atualmente cerca de 200 milhões de comprimidos por dia; de todas as drogas vendidas legalmente e sem receita, calcula-se que a Aspirina responda por 35%, o que faz dela um ícone, uma espécie de Coca-Cola das farmácias.

(*) Doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo, é professor, consultor e diretor do Fórum Brasileiro de Internet das Coisas – [email protected].