Inovação não-violenta
A comunicação não-violenta
Fernanda Dutra |
Fernanda Dutra (*)
Quando falamos em comunicação não-violenta, tem quem pense se tratar da maneira como se comunica alguém que é calmo e fala mansamente. Mas ela não se resume à entonação da fala. A comunicação não-violenta é uma metodologia criada pelo psicólogo americano Marshall Bertram Rosenberg. Em sua pesquisa, ele se questionou por que algumas pessoas são violentas e outras não, e chegou à conclusão de que, na realidade, todos somos violentos.
Quando dou essa explicação em algum treinamento, sempre tem alguém que diz: “é verdade, há dias em que perco a cabeça”. Nós associamos a violência a algum tipo de agressividade, seja física ou verbal, e não nos damos conta de que até mesmo a passividade pode estar ligada a ela. Por exemplo, quando alguém do nosso lado precisa de ajuda e o rejeitamos, estamos agindo de forma violenta. Pessoas que falam baixo e parecendo calmas também podem ser violentas ao dizerem coisas que machucam o outro. Há aquelas que não falam o que gostariam, mas induzem os outros a falar, gerando fofoca ou tornando a questão ainda mais agressiva.
A passividade pode ser uma grande alavanca para a violência. No mundo corporativo, é comum ver pessoas passivas, que não resolvem os conflitos por medo de falarem o que pensam e, assim, ficarem mal com algum colega ou perderem o emprego. O resultado disso é a geração de conflitos ainda maiores.
É preciso enxergar o todo
Antes de mais nada, em todas as situações, precisamos deixar o egocentrismo de lado. Nem tudo é sobre mim ou contra mim. Um outro exemplo: quando enviamos uma mensagem para o WhatsApp e vemos que a pessoa já recebeu e leu, mas não retorna, começamos a pensar que ela não deu importância, que não nos priorizou e mais um monte de coisas. O correto seria tirar o foco de nós mesmos e pensar que, de repente, nosso interlocutor está muito atarefado ou, simplesmente, não está a fim de responder naquele momento porque tem outros temas mais urgentes na cabeça.
A boa notícia é que Rosenberg destacou nosso lado violento, mas observou que também temos um lado compassivo natural. Foi a partir dessas conclusões que ele criou a comunicação não-violenta. De maneira simplificada, a comunicação não-violenta significa pôr em prática a empatia que habita em nós para ir além do que parece óbvio. A comunicação não-violenta começa quando decidimos enxergar todo o cenário e compreendemos que nem sempre somos o centro da questão. Precisamos, em todas as situações, colocar-nos no lugar do outro.
A empatia é, na realidade, um difícil exercício, já que se colocar no lugar do outro é quase impossível. Não temos os mesmos valores, mesmas crenças ou mesmo olhar de mundo e o que é algo desafiador para um, não o é necessariamente para o outro.
Por isso, o processo empático exige um exercício de compreensão do que levou o outro a agir como agiu, baseado nos 4 componentes da CNV:
OBSERVAÇÃO
Observar sem avaliar, sem julgar. Mas é possível não julgar? Na verdade, o julgamento é a resposta mais rápida que meu cérebro dá para as circunstâncias, uma vez que o julgar é usar minhas próprias referências como base no que outra pessoa esta fazendo. O problema é que as referências da outra pessoa são completamente diferentes das minhas.
Julgar é uma autodefesa, pois é como dar uma resposta instantânea ao que não se quer conhecer. Parto das minhas referências, o que me livra do problema de certa forma.
Por ter consciência de que não tenho controle sobre meus julgamentos é que sempre digo que o importante é ter consciência de que julgo os fatos. Questionar-se sempre. Por mais que tudo leve a crer em tal circunstância, perguntar-se se realmente foi isso o que ocorreu e procurar entender sobre outros pontos de vista.
SENTIMENTO
Já que observo mais os fatos, percebo que por trás de comportamentos existem sentimentos. Sim, até mesmo para as pessoas mais lógicas do mundo. São os sentimentos que propulsionam os comportamentos.
A vulnerabilidade é o que nos conecta de forma mais genuína e pode ajudar a resolver conflitos, de acordo com o Marshall.
NECESSIDADE
O terceiro componente são justamente as necessidades que existem por trás dos comportamentos, que estão absolutamente envolvidas com nossos sentimentos. Entender que quando alguém, e esse alguém pode ser a gente mesmo, age com alta expressividade, ou seja, com agressividade ou passividade ou qualquer outra forma violenta de comunicação, é porque esta pessoa tem necessidades não atendidas.
Compreender quais são as nossas próprias necessidades e das outras pessoas é primordial para ter uma visão mais sistêmica de todo o processo de comunicação para com o outro.
Lembrando que compreender não quer dizer que necessariamente eu concorde com o comportamento da outra pessoa.
PEDIDO
O pedido não deixa de ser uma negociação integrativa, porque quando sou capaz de compreender através da minha observação e aprofundamento da situação os sentimentos envolvidos tanto comigo quanto com a outra pessoa, sou capaz de formular pedidos mais congruentes e que gerem ganhos para ambos os lados. Aqui formulo um pedido para que aquilo que me viola de alguma forma não continue acontecendo, mas esse meu pedido é algo que vou fazer pensando também no outro lado da moeda, entendendo e compreendendo as necessidades da outra pessoa e, mais que isso, entendendo as necessidades de tudo e todos ao meu redor, pois a negociação só é boa quando dá bons resultados para todos, não é mesmo? De que adiante te pedir algo que beneficie você, a mim e ferrar tudo que esta ao nosso redor?
Onde entra a Inovação?
Inovação não é invenção ou descoberta. A descoberta é um fato físico ou científico a ser validado socialmente. Já a invenção pode ser um protótipo, uma construção, mas não foi comercializado. A inovação por sua vez, envolve a criação de produto, um empreendimento e passa a ser comercializado. A novidade é uma nova entrega por uma solução criativa e a Inovação é o aprendizado mais a ideia com solução e lucro.
A comunicação pode ser estruturada em três dimensões básicas: intracomunicação, intercomunicação e o pensamento sistêmico. E para cada dimensão há um papel fundamental nos processos de inovação.
A intracomunicação, ou a comunicação consigo, podemos definir como a interpretação que fazemos de nós mesmos, o autoconhecimento. Nesta etapa, potencializamos talentos e capacitamos pessoas para sua mais alta autenticidade e entrega em nível de estado de flow.
“O fluxo permite absorver essa informação, sintetizá-la e integrá-la. Isso impulsiona o processo criativo. Então, enquanto todo mundo é levado à distração, as pessoas em fluxo estão se adaptando, elas estão usando o estado para levar o desempenho para o próximo nível” Kotler, Philip.
“O estado de fluxo ou Flow está relacionado a uma autoconsciência mais baixa sugerindo que ela está relacionada a sentimentos e emoções positivas. Tanto o bem-estar psicológico quanto o subjetivo têm sido empiricamente ligados por inúmeros pesquisadores ao longo do tempo.” Bryce & Haworrth.
Na intercomunicação que de fato ocorrem os grupos de criação, onde precisamos de olhares multidisciplinares que nos levem a divergência para uma possível convergência.
“A comunicação, incluindo a rara arte de ouvir, é mais necessária do que nunca em nossa era digital, à medida que o ritmo da mudança acelera exponencialmente, a tecnologia se torna mais complexa e setores inteiros são interrompidos da noite para o dia com modelos de negócios imprevistos. Simplificando, as pessoas ouvem principalmente para responder, em vez de entender. No entanto, a digitalização exige uma escuta ativa do ecossistema para sobreviver e desenvolver estratégias colaborativas com startups, parceiros e clientes em todo o mundo.”Alex Goryachev, Forbes Communications Council, 5 de fevereiro de 2018.
Diretor Administrativo da Cisco de Estratégia e Programas de Inovação.
E no Pensamento Sistêmico, percebemos que a inovação só pode ocorrer quando a empatia esta sendo trabalhada. Inovar produtos ou serviços exige um olhar de trazer benefícios a todos.
Passamos a ver a inovação a partir de um paradigma sistêmico (ou circular) gerando um impacto com maior profundidade. O desafio de inovar de forma sistêmica e empática em uma cultura que tende a perpetuar um comportamento consolidado pela economia linear. A percepção que o desenvolvimento humano coletivo precisa acompanhar o desenvolvimento econômico e tecnológico e se moverem a um equilíbrio. Para isso a visão empática, e por isso a comunicação sistêmica (comunicação não-violenta com pensamento sistêmico) se faz tão necessária, já que precisamos ter ganhos de percepção individual e coletiva, mais coesão e não somente a entrega de valor. Aqui passamos a resgatar valores de equidade, inclusão e reaproveitamento dos descartes em uma economia circular: redução de necessidade e desperdício de materiais, reutilização de produtos e reciclagem de materiais.
Neste novo paradigma, é preciso Inovar a inovação e para isso é preciso começar pela Inovação do ser, entender os outros e ampliar a visão sistêmica!
Até a próxima!
(*) É Membro dos Empreendedores Compulsivos, é especialista em comunicação, sócia diretora da Flyflow, palestrante, coach, artista plástica, professora e consultora de inovação em desenvolvimento humano. Co-autora do livro PNL e Coaching e autora do livro Efeito-Melão. Saiba mais em compulsivos.org