Fernanda Dutra (*)
O que o filme “Milagre da Cela 7” e a Comunicação não violenta nos ensinam neste momento de crise. (contém spoiler)
O momento é de crise, uma crise que vai além da Pandemia e da Economia a meu ver. Esta é a crise da inovação da consciência, que nos mostra que estamos todos conectados e que a ação de cada um leva a consequências para outros.
Percebemos quanto estamos interligados e a nossa conexão vai além do contato físico. Um momento de rever a convivência familiar, dos valores e, principalmente do modo automático como estávamos vivendo.
Ouço muito a frase: “Quando tudo voltar ao normal”, como se fosse possível voltar ao que era. Na verdade, voltar seria um retrocesso. Vamos sair da crise, da tristeza e das perdas, isso é bem verdade e tenho fé nisso. Mas não voltaremos ao estágio anterior. Estaremos em um grau de consciência um pouco mais elevado, com novo olhar, revisitando serviços e produtos como algo que realmente faça sentido para a sociedade.
Um novo momento em que os possíveis concorrentes podem ser mais que nunca aliados para encontrar soluções em conjunto e inovar. As ações ocorrerão a partir de novos padrões comportamentais do sistema e de como estes elementos se relacionam. Em uma intervenção sistêmica de inovação, com o objetivo de alavancar uma mudança profunda e não apenas processual. Não vamos conseguir sobreviver sozinhos. Precisaremos uns dos outros para achar soluções e mais que nunca cuidar um dos outros.
O filme turco “Milagre da Cela 7”, que pode ser encontrado na Netflix , conta a história de Memo um pai solteiro com deficiência intelectual que vive em um pequeno vilarejo da Turquia com a filha, Ova e a avó, Fatma Muito amável, puro e simples e querido por todos do lugarejo. Apesar de Ova sofrer com com o bullying no colégio, a garota sabe que o pai é especial, o que não a faz amá-lo menos.
A vida de ambos muda quando Memo presencia um acidente no qual a filha de um importante tenente-coronel do exército turco acaba por falecer. Tomado pela raiva, este culpa Memo injustamente, levando-o a uma prisão comum, por meio da ocultação de sua deficiência, levando-o à pena de morte, sem direito a um julgamento justo.
Um personagem com a idade mental da própria filha, o que torna a relação de ambos os melhores momentos do filme, pela conexão empática que ultrapassa a barreira da distância, porque estão ligados na alma. Surge na natureza humana da amorosidade e da ligação sem julgamento, que não exclui o diferente.
Afinal, por quê a pequena Ova se deixaria abalar por ofensas que para ela não fazem sentido? A ofensa não tem força a não ser que seja validada pela pessoa a quem ela é dirigida. Então, por que nos sentimos tão ofendidos com as opiniões divergentes? Não é tempo de somar, mais do que dividir?
Logo ao ser preso, Memo sofre a violência do julgamento dos companheiros de prisão. Mas o convívio com ele traz um novo e melhor conhecimento de sua essência. Passam a compreender a incongruência entre o que julgam e o que percebem.
Entender empaticamente o que de fato ocorre, nos permite perceber que nem tudo é o que parece ser. Devemos ser capazes de observar sem o julgamento. O julgamento é a resposta mais rápida que o cérebro nos dá para as circunstâncias, uma vez que julgar é usar as próprias referências como base de entendimento do que a outra pessoa está fazendo. O problema é que as referências da outra pessoa são completamente diferentes das minhas. Por isso a dúvida é benéfica em relação à certeza.
Essa dúvida começa a emergir entre os presidiários, que presenciam cenas de conexão entre o pai e a filha. Como se fossem capazes de acessar um lado mais compassivo e que existe em todo ser humano.
A visão da menina vai humanizando os companheiros de Memo, já que para ela, todos ali são doentes em busca de recuperação, o que ajuda a construir um elo, mesmo com aqueles que cometeram crimes mais graves.
O milagre é a conexão empática. Esta que nos faz sair de nossos sentimentos, de nossas necessidades e das nossas crenças para migrar nos sentimentos, necessidades e crenças de outra pessoa, fazendo-nos entender que acima de tudo, nossa passividade pode ser tão prejudicial quanto qualquer outro tipo de violência. O milagre aparece em cada rosto: com durezas quebradas pela bondade, a mágoa transformada em cura, o perdão natural pela pureza de coração, do amor que não distingue a diversidade.
Será que nosso julgamento não nos está deixando com a visão turva em relação ao que realmente está ocorrendo em todo o mundo? Será que esse movimento de crise não surgiu para gerar dúvida de como vínhamos vivendo? Será que não somos todos doentes em busca de recuperação?
E se, independentemente do caminho de cada um, o milagre começasse a ocorrer? Se é que já não está ocorrendo, de nos conectarmos mais empaticamente? No filme, em meio a maior das agressividades, que é a da passividade perante uma situação injusta, a consciência prevaleceu. A violência da omissão, da indiferença, é substituída pela compaixão e entendimento da diversidade e da busca da verdade e conexão. E dentro da crença de cada um, ali a remissão ocorre.
Em tempos difíceis, uma obra de arte que fala de maneira sensível sobre o lado bom do ser humano e que pode ser potencializado para pensarmos em soluções coletivas, através da empatia.
Que em nossa realidade, igualmente a consciência prevaleça e que possamos pensar juntos, deixando de anular ideias divergentes. Passando a buscar soluções coletivas. Antes de mais nada, uma inovação do ser, ao viver cada momento como único e especial com as pessoas amadas e a conviver com aqueles que pensam diferente, encarando todo o trabalho realizado como uma importante peça em algo maior.
#Lingo Lingo
# Garrafas
Até a próxima!
(*) É Membro dos Empreendedores Compulsivos, é especialista em comunicação, sócia diretora da Flyflow, palestrante, coach, artista plástica, professora e consultora de inovação em desenvolvimento humano. Co-autora do livro PNL e Coaching e autora do livro Efeito-Melão. Saiba mais em compulsivos.org