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O debate sobre a taxação de fortunas no Brasil

em Opinião
quarta-feira, 10 de novembro de 2021

Ana Campos (*)

Volta e meia, a taxação sobre grandes fortunas entra no espectro dos debates tributários do país e hoje conta com 37 projetos no Congresso abordando o tema.

Só no período da pandemia, por exemplo, 18 propostas foram apresentadas a esse respeito. Previsto na Constituição de 1988, o imposto – na visão dos defensores da medida – seria uma forma de redução das desigualdades do país e de aumentar a arrecadação do Estado tendo em vista uma melhor oferta de serviços públicos.

Mas, do ponto de vista do contexto econômico brasileiro e global, a criação de um tributo sobre grandes fortunas é mesmo uma alternativa lógica e positiva para a resolução de problemas como a distribuição de renda no país? Quais seriam os possíveis impactos da implementação desse imposto?

Analisando a experiência internacional, um primeiro ponto que chama a atenção é o fato de que a taxação de grandes fortunas não contribui – na contramão do que se poderia imaginar – para um aumento significativo da arrecadação tributária. Na Suíça, por exemplo, que conta com a tributação sobre patrimônio desde 1840, o imposto corresponde a menos de 4% da receita fiscal do país e 1,1% do PIB (em termos percentuais, hoje, o Brasil tem uma carga de impostos que chegou a mais de 31% do PIB em 2020).

Ademais, um monitoramento do Insper atualizado em 2020 apontou que a política de taxação sobre grandes fortunas segue em queda entre os países ricos e só 3 países da OCDE, hoje, tributam o patrimônio dos mais ricos: a já citada Suíça, Espanha e Noruega – cujo peso do imposto, aliás, também tem pouco impacto na arrecadação tributária de suas economias; respectivamente 0,2% e 0,4%.

Outro ponto importante que advoga contra a taxação de grandes fortunas é o próprio custo da máquina fiscalizatória – que, não compensaria diante do baixo ganho de arrecadatório dos países. Mas, em termos de impactos, um dos principais prejuízos, conforme apontado pela própria OCDE, envolve a fuga de investimentos de países que tentaram aplicar taxações mais agressivas no patrimônio de grandes riquezas.

Um dos exemplos recentes mais conhecidos nesse sentido foi o da França que, no governo de François Hollande, chegou a tributar em 75% a renda anual dos mais ricos e viu um movimento de migração de grandes fortunas para domicílios tributários com cargas mais enxutas. Em 2017, com a eleição de Macron, a França revogou o imposto. Levando em conta o contexto internacional e tais experiências, é possível inferir, com tudo isso, que a taxação de grandes fortunas no Brasil seria um risco significativo a ser tomado, sobretudo em um momento de busca pela atração de investimentos, recuperação econômica e geração de empregos.

Nunca é demais reforçar que os mais ricos possuem meios econômicos para alterarem – vide o exemplo da França e de outras nações – suas residências fiscais, bem como, para contratarem consultorias de planejamento tributário para a redução de perdas de margens que, na prática, tornariam inócuo um imposto sobre grandes fortunas e não justificariam o custo fiscalizatório.

Outro ponto importante, conforme atesta a famosa Curva de Laffer, é a de que a relação entre aumento de tributos e expansão da arrecadação do Estado não é linear, mas sim, segue o raciocínio de uma curva, de um ponto de equilíbrio que, quando ultrapassado, pode se traduzir em perdas econômicas, de investimentos e inibir os movimentos de oferta e demanda. Dito isso, que caminhos poderiam ser tomados para uma maior mobilidade social e distribuição de renda no país?

Sem dúvidas, essa é uma equação difícil e sem respostas prontas. No entanto, do ponto de vista tributário, a redução do IRPJ – que, no texto atual da Reforma Tributária, pode partir dos atuais 15% para 5,5% em 2023 – teríamos uma alternativa interessante para a geração da demanda por investimentos e mão de obra. Ademais, como segue em discussão a taxação de dividendos na Reforma, teríamos uma via para acionistas manterem o capital por mais tempo nas empresas como forma de investimento.

Em todas estas linhas de raciocínio, é importante, por fim, que não se perca de vista a importância do equilíbrio entre arrecadação e o volume de impostos sobre o bolso do contribuinte – sobre este ponto, vale citar que o Brasil já conta com a segunda maior carga tributária de toda a América Latina, atrás apenas de Cuba, conforme ranking da OCDE.

Sem essa visão, a busca – genuína e importante – pela distribuição de renda pode gerar efeitos contrários e contribuir para a estagnação econômica de um país que, como se sabe, tem muitos desafios pela frente para voltar a crescer.

(*) – É especialista em Aquisições e Reestruturações e sócia fundadora da empresa Grounds (http://grounds.com.br/).