Marília Cardoso (*)
Há bastante tempo, venho falando sobre inovação para empresas de diversos portes e segmentos.
Infelizmente, na esmagadora maioria delas me deparo com um forte e robusto esquema que batizei de “sistema imunológico”. Na biologia, o sistema imunológico é composto por diferentes células, tecidos, órgãos e moléculas que tem a função de proteger o nosso corpo contra infecções. Nas empresas, percebemos uma série de regras, padrões e convenções sociais que visam a preservação do status quo.
Esse comportamento também é amplamente conhecido como Síndrome de Gabriela. Para quem é jovem demais para se lembrar, a novela Gabriela, Cravo e Canela, que foi ao ar na década de 70, tinha como protagonista uma personagem embalada pelo hit “eu nasci assim, eu cresci assim, eu vivi assim, eu sou mesmo assim, vou ser sempre assim”. Mais de quatro décadas depois, ainda tem gente achando que é melhor deixar tudo como está.
Por outro lado, também tem muita gente acreditando que é preciso se abrir ao novo, fazer diferente, experimentar coisas novas. Fato é que nos dois grupos há um sentimento bastante preponderante: o medo de errar. Sophia, a robô humanoide desenvolvida pela empresa Hanson Robotics, de Hong Kong, disse uma frase digna de filósofo em uma entrevista a um jornalista português: “o medo é o assassino da mente”. Consequentemente, o medo é também o grande assassino da inovação nas empresas.
Já identifiquei dezenas de serial killers por aí. Normalmente, eles estão sempre muito bem disfarçados e tendem a querer se passar por bons moços, dizendo coisas do tipo “É uma boa ideia, mas aqui não vai funcionar”, “Alguém já tentou isso antes?”, “Nos viramos bem sem isso até agora” e o pior de todos: “Conheço alguém tentou e foi demitido!”. Até o mais inovador dos inovadores se esmoreceria com esse tipo de colocação.
Segundo o dicionário, medo significa uma espécie de perturbação diante da ideia de que se está exposto a algum tipo de perigo, que pode ser real ou não. Na prática, quer dizer um sofrimento por antecipação. Uma angústia que nos toma e paralisa pelo simples receio das consequências de uma atitude – ou até mesmo da falta dela. No caso das empresas, o medo mais comum é o de errar. Um projeto fracassado, uma ideia não exitosa, um produto que não foi um estouro de vendas. Nenhuma empresa está livre do erro. Ele faz parte do processo.
Toda nova iniciativa está sujeita a ameaças e oportunidades, a vitórias e derrotas, perdas e ganhos, sucessos e fracassos. O grande problema é que vivemos numa sociedade que valoriza as medalhas e esconde as cicatrizes, ignorando que são elas as grandes responsáveis pelo êxito. Estamos acostumados com quadros que ovacionam fotos dos funcionários mais brilhantes do mês, enquanto os que cometem falhas – por menor que sejam – têm suas cabeças cortadas a fim de servirem de exemplo aos demais.
Enquanto estivermos em ambientes que colocam os erros debaixo do tapete, tudo o que dissermos sobre inovação não passará da mais pura demagogia. Thomas Watson, que foi presidente da IBM, dizia que “se você quer aumentar a sua taxa de sucesso, precisa dobrar a sua taxa de fracasso”. A lógica é simples. Se quisermos manter tudo do jeito que sempre foi, não iremos inovar e correremos o risco de ser sucumbidos. Agora, se decidirmos abraçar a inovação, temos que estar preparados para correr riscos e aprender a lidar com os fracassos.
Será preciso criar ambientes de segurança psicológica, onde todos os indivíduos tenham espaço para se expressar e interagir com o grupo sem qualquer tipo de repressão por ideias tolas ou erros honestos. Precisaremos ressignificar o próprio sucesso, entendendo que inovação se faz muito mais com transpiração do que com inspiração. Quem não acerta, aprende. E segue muito mais forte para a próxima batalha.
O impossível só existe até alguém provar o contrário.
(*) – É consultora de inovação na Palas, consultoria pioneira na ISO de inovação, a 56002.