Marcos Morita (*)
Temas aparentemente desconexos, podem sim interligar-se e provocar situações análogas e de alto custo emocional.
Qual a relação entre a saída do Reino Unido da União Europeia, também conhecida pelo acrônimo “Brexit”, e o conflito entre gerações nas empresas brasileiras, onde convivem pós baby-boomers, millennials e até alguns centennials, também conhecidos como gerações X, Y e Z?
Creio que poucos brasileiros tenham tido a chance de explorar os países membros do Reino Unido: Escócia, País de Gales, Irlanda do Norte ou mesmo o interior pobre da Inglaterra. Para a grande maioria, Londres e seus táxis pretos, palácios e símbolos, como o Big Ben, a monarquia e os Beatles, são a cara deste país moderno, rico e contemporâneo, o que fez soar estranho a decisão tomada em referendo.
Analisando os números da votação em detalhes, percebe-se uma acentuada e profunda divisão entre a capital Londres e algumas cidades pobres do interior da Inglaterra. Assim como um abismo entre as gerações, com os mais jovens votando maciçamente pela permanência no bloco, enquanto os mais idosos, por sua saída.
Talvez valha uma volta aos livros para relembrar a ex-primeira Ministra Margaret Thatcher que, com mão de ferro, governou a Inglaterra no início dos anos 80. Amada pelos capitalistas da City Londrina e odiada pelos trabalhadores, em especial os carvoeiros, foi a responsável pelo desmonte do Welfare State, ou Estado de Bem Estar, uma série de políticas criadas no final da segunda guerra, através das quais o governo provia assistência e programas sociais nos campos da saúde, educação e complementação de renda. Desempregados, empobrecidos e desassistidos, os agora cinquentões e sessentões deram o troco, uma vez que não aproveitaram os benefícios de pertencer à União Europeia.
Considerando as diferenças, tomo a liberdade de fazer um paralelo com a situação do Brasil nos anos 80, através da música “Ideologia”, de Cazuza. Em seu refrão ele entoava: “meus heróis morreram de overdose, meus inimigos estão no poder. Ideologia, eu quero uma para viver”. A música era cantada pelos outrora rebeldes da geração X, os quais curtiram Janis Joplin e Elis Regina, e saíram às ruas para lutar pelas Diretas Já. Estes, hoje, ocupam cargos de liderança nas empresas.
É natural que com o tempo acabemos nos tornando mais conservadores. Sociedade, família, filhos e ascensão profissional criam uma blindagem e um ar de respeito. O problema está nos excessos, quando deixamos de escutar e adotamos nossas convicções como verdades absolutas, tomando decisões com base em preconceitos e modelos antigos, alijando e impondo-as aos colaboradores com pensamentos mais inovadores e alinhados com o mundo atual. Pare e reflita se não tem adotado algumas vezes, como líder, este tipo de postura.
Lembre-se de que já foi um centennial dos anos 80, curtiu Paralamas, Ultraje e Titãs e vestia-se de calça laranja com blusa verde-limão. Seja mais aberto as opiniões das novas gerações, até porque dentro em breve você provavelmente estará do outro lado, como consultor aposentado de um millennial em cargo de liderança. Saiba que, no final, o peso de sua decisão retrógrada recairá nos ombros da nova geração, os quais não tinham tempo de casa ou posição hierárquica para fazer valer sua voz, mas que assim como os jovens que disseram não ao Brexit, serão obrigados a conviver com o peso de uma decisão ruim.
(*) – É executivo, professor, palestrante e consultor. Sua palestra ‘As 4 Chaves do Pensamento Estratégico’ aborda de maneira lúdica e participativa, temas como definição de metas, inovação, gerenciamento do tempo e motivação (www.marcosmorita.com.br).