José Eduardo Gibello Pastore (*)
As questões estão postas. O novo Ministro do Trabalho assume o compromisso de reformar a Reforma Trabalhista.
Alega que precisa haver uma “revisão” daquilo que entende ser prejudicial ao trabalhador. Aponta três temas que serão “revistos”. O primeiro é o trabalho intermitente. A pergunta que se faz é: Como este modelo de trabalho prejudica o trabalhador se, antes do trabalho intermitente, estes trabalhadores exerciam estas atividades 100% na informalidade, sem direito algum?
Quem dignificou o trabalho intermitente, concedendo a estes trabalhadores todos os direitos da CLT foi justamente a Reforma Trabalhista. Mas alguém pode alegar que, se o trabalhador intermitente trabalhar menos do que o valor correspondente ao salário mínimo, ele terá que pagar sua contribuição previdenciária.
Para corrigir esta disfunção legal, há que se fazer o ajuste na lei previdenciária, e não na trabalhista, ou seja, não na Lei 13.467/17. Esta é a lei que beneficiou o trabalhador intermitente. Então, insisto: Como o trabalho intermitente prejudica o trabalhador para justificar a “revisão”?
O segundo tema que o governo pondera que trouxe prejuízos para o trabalhador é a ultratividade. A Reforma Trabalhista determinou que, a cada dois anos, as partes, por meio de negociação coletiva, devem negociar novos direitos. Com isso, não permitiu a perpetuação destes direitos, que é o que a ultratividade fazia.
Com o fim da ultratividade, sindicatos laborais e de empregadores podem negociar novos direitos e, quando entendem que a negociação é prejudicial ao trabalhador, simplesmente não negociam. A perpetuação de direitos só estava fazendo com que houvesse restrição nas negociações: era impossível negociar novos direitos protetivos para os empregados justamente porque a ultratividade os perpetuava.
Quem deseja negociar “o que negociado está” para sempre? O fim da ultratividade trouxe benefícios para o trabalhador e, por este motivo, não haveria por que se falar em “revisão” deste tópico. O terceiro e último ponto se refere ao fato de a Reforma Trabalhista ter extinguido a contribuição sindical obrigatória.
Em outras palavras, a partir da Lei 13.467/17, os sindicatos podem se sustentar, desde que trabalhadores e empresas contribuam espontaneamente para seus respectivos sindicatos. Com isso, a Reforma Trabalhista corrigiu uma anomalia que só existia no Brasil: um sistema de custeio obrigatório para sindicatos, com desconto de um dia de salário do trabalhador e um porcentual do faturamento da empresa. Alguns alegam que o fim da contribuição sindical obrigatória foi prejudicial para os sindicatos.
A pergunta que se tem que fazer é: Se hoje é possível se contribuir voluntariamente para os sindicatos, e não são poucos os empregados e empresas que não desejam contribuir espontaneamente para os sindicatos, este problema é da Lei 13.467/17 ou dos sindicatos? Então, não há por que colocar na conta da Reforma Trabalhista a desorganização do sistema sindical.
Não bastasse este argumento, há um estudo do Professor Hélio Zylberstajn mostrando que, desde 2017, as entidades sindicais, buscando novas fontes de custeio, implementaram outras modalidades de contribuição e fizeram-nas constar dos acordos e convenções coletivas. São contribuições estas que superam o valor da antiga contribuição sindical obrigatória.
Se estes são os três principais pontos que o atual governo pretende discutir para “revisar” o conteúdo da Reforma Trabalhista, então ele precisa inicialmente apontar o motivo pelo qual deseja fazê-lo.
E, ainda que assim se concretizasse, o sistema de negociação que o governo deseja implementar para discutir o que pode ser “melhorado” na Reforma Trabalhista — o sistema tripartite, em que de um lado se sentam o governo e sindicatos e de outro, as empresas –, significa que as empresas serão sempre voto vencido, uma vez que governo e sindicatos representam o mesmo interesse. O sistema de tripartismo é assimétrico.
Por fim, o lugar adequado para se discutir mudança de lei é o parlamento.
(*) – É advogado, consultor de relações trabalhistas e sócio do Pastore Advogados.