Que atire a primeira pedra quem nunca associou a inovação à tecnologia. Não podemos ser extremos: é claro que existem diversos recursos tecnológicos completamente benéficos para levar a inovação às empresas e impulsionar seu crescimento, mas, essa não é uma regra absoluta. Para inovar, nem sempre é preciso contar com esse apoio. O sucesso dessa jornada depende muito mais da capacidade de se adaptar ao seu mercado e às adversidades que possam surgir, estando preparado para driblar esses obstáculos e enxergar oportunidades até nas ameaças. E, muitas histórias comprovam essa relação.
A inovação não é algo recente. Ela está presente em nossa sociedade há séculos, com grandes ideias que revolucionaram nosso modo de pensar e operar de maneira muito mais simples que, na época, não tinham tamanho apoio tecnológico. O próprio surgimento da roda foi considerado como uma das maiores inovações da humanidade, que permitiu uma maior velocidade de locomoção, transporte de cargas mais volumosas e a abertura para evoluções cada vez melhores para a população.
Anos mais tarde, a mesma premissa de adaptação ainda pode ser vista. Observando as iniciativas feitas globalmente, o Nepal, um pequeno país asiático localizado entre a Índia e a China, pode ser considerado um país inovador sem depender de tecnologia nenhuma para isso.
Vivendo sob temperaturas extremas durante boa parte do ano, clima seco e vento gelado agravados anualmente em decorrência das abruptas mudanças climáticas, muitos de seus povos – especialmente os Sherpas, uma etnia oriunda do Tibet que se refugiou para a cordilheira do Himalaia para viver da agricultura e da criação de Iaques, um tipo de bovino que habita a região – não dispõem de quantias financeiras para se sustentarem com qualidade e se protegerem contra esse cenário. A solução, então, foi se adaptar com os recursos que tinham.
A pele dos Iaques é frequentemente utilizada como protetor térmico para que consigam suportar o clima rigoroso da região. Além disso, os animais são utilizados para transportar os equipamentos dos alpinistas que se aventuram na montanha do Everest, como barracas, alimentos, tanques de oxigênio, entre outros. Dada a dificuldade do desafio, muitos turistas de primeira viagem não conseguem finalizar a caminhada nem até o acampamento base devido ao frio extremo e baixa oxigenação.
No solo, os impactos climáticos também dificultam o plantio e cultivo de diversas matérias-primas. Mas, foram descobertos tipos específicos de batatas que crescem na região para a subsistência deste povo e, mais uma vez se adaptando ao cenário, buscaram como inovação o uso das fezes dos Iaques como fonte de inflamação para cozinharem seus alimentos, já que a falta de plantas e madeiras impedia tal tarefa. Ideias simples que não precisaram de nenhuma tecnologia para garantir sua sobrevivência no local.
É claro que as condições de vida destas pessoas e de muitas outras ao redor do mundo evidenciam discrepâncias sociais graves que devem ser compreendidas e combatidas a partir de medidas que reforcem essa preocupação – como se promove comumente nos famosos pilares do ESG (Environmental, Social and Governance).
Entretanto, são essas histórias que também servem como inspiração para mudanças efetivas que podemos aderir em nossa sociedade, em nossas empresas, sem grandes investimentos ou tecnologias. Basta criatividade e força de vontade para analisar os recursos disponíveis e fazer mais mesmo com tão pouco.
Transportando essa ideia ao mundo corporativo, vemos cada vez mais a busca das empresas por tecnologias robustas que agilizem seus processos e permitam o aperfeiçoamento de processos em prol de seu destaque. É claro que essa pode ser uma estratégia a ser considerada, mas não necessariamente será o ponto primordial a ser implementado na jornada inovadora.
O que fará a diferença para o sucesso ou não da inovação nas empresas será sua capacidade e preparo de adaptação em seu cenário, aproveitando o melhor de seus recursos e identificando o que pode ser ajustado para o seu melhor desempenho. É o famoso fazer mais com o mesmo ou até menos.
Nem sempre isso será conquistado a partir de uma ferramenta tecnológica. Um pequeno ajuste aliado a uma cultura inovadora pode trazer resultados ainda melhores, desde que estejam prontos para essas possibilidades. Com uma mente aberta para o novo e um processo bem estabelecido, muitas trilhas de sucesso podem ser seguidas para um futuro brilhante.
Alexandre Pierro é mestrando em gestão e engenharia da inovação, bacharel em engenharia mecânica, física nuclear e sócio-fundador da PALAS, consultoria pioneira na ISO de inovação na América Latina.