Vitor Cavalcanti (*)
Pelo menos nos últimos oito anos eu ouço de forma enfática que faltam profissionais qualificados para o mercado de tecnologia no Brasil, tanto do lado de quem vende tecnologia, quanto de quem compra. Mas nem todo apelo num país que soma milhões de desempregados e subempregados parece fazer diferença.
Como noticiado recentemente pelo jornal Folha de S. Paulo, na contramão do mundo, o País reduziu a quantidade de pessoas formadas em áreas estratégicas (Ciências, Engenharia, Matemática e Computação) ou naquilo que o mercado convencionou chamar de STEM, usando a sigla em inglês para as mesmas verticais de formação.
Entre 2009 e 2019, a quantidade de diplomados nessas áreas caiu de 67 mil para 60 mil, de acordo com levantamento da consultoria IDados a partir de dados do Inep. Mas o buraco é mais em baixo. Com uma base fraca de matemática e lógica, meninos e meninas que se animam a estudar programação, por exemplo, encontram dificuldade imensa em avançar nesse tipo de curso e desistem.
Lá na frente, isso impacta em graduandos, uma vez que, falhando em coisas básicas, a maioria optará por cursos que exijam menos esse tipo de conhecimento, resultando em um volume muito maior de pessoas formadas em ciências sociais, comunicação e negócios. O grande problema é que a necessidade por profissionais 100% STEM ou mesmo com habilidades tecnológicas e digitais só cresce.
Nos próximos anos, a demanda por profissionais de tecnologias em nível iniciante, ou seja, programadores e suporte, até os mais seniores, como cientistas de dados e profissionais avançados em inteligência artificial e quântica, por exemplo, passará de 800 mil vagas, facilmente podendo chegar a um milhão de vagas, se utilizarmos informações tanto da Brasscom, quanto da McKinsey. Para complicar ainda mais a equação, o país sofre com perda de capital humano, cuja concorrência deixou de ser apenas para propostas de expatriação.
A pandemia acelerou a possibilidade de trabalhar remotamente a partir de qualquer lugar do mundo, assim, empresas brasileiras concorrem com companhias globais por profissionais vivendo em cidades brasileiras. Isso seria ótimo se formássemos pessoas na quantidade necessária para suprir nossa demanda e, também, exportar talentos, mas não é nem de longe nossa realidade. Já passou da hora de entendermos que a falta de uma política clara de educação e incentivos para carreiras estratégicas comprometerão o futuro do país.
Essa falta de pessoas bem capacitadas, entre inúmeros problemas, gera dois vácuos na economia: geração de empregos de qualidade, levados para nações que apostam e investem em profissões do futuro, e produção de tecnologia. Existem diversas sementes plantadas para ajudar a formar mais gente. O Instituto IT Mídia, por exemplo, mantém há 14 anos o programa Profissional do Futuro que concede bolsas em graduação de tecnologia.
Foram mais de 650 bolsas, pouco para o tamanho do problema, mas o suficiente para mudar a história de 650 vidas. O mesmo Instituto lidera a plataforma Eu Capacito, que ajuda em duas frentes: despertar o interesse pela tecnologia e prover habilidades digitais e humanas. Em um ano e meio, mais de 800 mil pessoas impactadas com pelo menos 1 dos 135 cursos.
Se nosso ensino básico fosse de qualidade, eu poderia inclusive falar em 800 mil pessoas capacitadas, mas a maioria não consegue concluir um curso de programação pela falta de conhecimento básico de lógica. De novo, precisamos de um projeto de país que priorize a educação em todos os níveis e frentes e incentive carreiras estratégicas que nos levarão ao futuro.
Precisamos que cada vez mais empresas cumpram com seu papel social de apoiar projetos como os do Instituto, em promover alianças para apoiar a pesquisa das universidades públicas e a financiar projetos que advoguem pela qualidade do ensino básico. A educação transforma, mas antes disso precisamos de visão de país e mãos que apoiem para transformarmos não 600, mas milhares de vidas.
(*) – É diretor-geral do Instituto IT Mídia (www.institutoitmidia.com.br).