Para especialista em Direito do Trabalho do Andrade Maia Advogados, a mudança na jornada pode trazer impactos jurídicos e econômicos para as empresas
A estrutura de trabalho tradicional, com cinco dias úteis, tem sido alvo de debates recentes sobre a possibilidade de reduzir para apenas quatro dias de trabalho, sem que haja desconto do salário do trabalhador. Esta proposta suscita importantes questões sobre os possíveis impactos na produtividade, saúde dos funcionários e equilíbrio entre a vida pessoal e profissional. Mas o que diz a lei e como ficam os direitos trabalhistas?
A semana de quatro dias surgiu a partir de um projeto piloto em 2018, na companhia neozelandesa Perpetual Guardian, do ramo de gestão patrimonial. O fundador desta empresa, Andrew Barnes, em seu Ted Talk intitulado “The 4 day week”, tratou sobre a redução do número de dias trabalhados em troca de maior foco e rendimento. Além da Nova Zelândia, outros países já aderiram a este formato de trabalho, dentre eles, Dinamarca, França, Espanha e Reino Unido.
De acordo com Leandro Castro, sócio do Andrade Maia Advogados e especialista em Direito do Trabalho, no Brasil não há uma legislação específica para a flexibilização da jornada de trabalho. “Não existe uma regulamentação específica para a redução da jornada semanal para quatro dias, mas também não existe proibição. A Constituição Federal prevê o limite máximo de 44 horas semanais para trabalhadores em geral, ao passo que a legislação esparsa prevê jornadas especiais de trabalho para determinadas categorias. A CLT, prevê, ainda, o chamado Regime de Tempo Parcial, que é um regime de jornada que vai até 25 horas por semana. Entre essas 25 horas por semana até as 44 horas semanais existem muitas alternativas, especialmente através de celebração de acordo ou convenção coletiva de trabalho. Algumas empresas, ainda, sensíveis a pautas sindicais já adotaram a redução da jornada de 44 semanais para 40 horas semanais. As oportunidades de redução devem ser avaliadas sempre dentro de um contexto de viabilidade da operação e do resultado final esperado pelo empregador”, explica.
Pensando num empregado que trabalha 40 ou 44 horas semanais, num período de cinco ou seis dias, é possível flexibilizar o horário mediante alguns acordos, conforme explica o especialista: “É muito comum empresas negociarem diferentes regimes de jornada através de acordos coletivos, ou mesmo a própria redução da carga horária, hipótese que pode ser feita, inclusive, através de aditivo aos contratos individuais de trabalho, mantido o mesmo salário”, afirma.
Leandro avalia que a mudança no perfil da jornada de trabalho pode trazer impactos tanto jurídico quanto econômicos para as empresas. “No momento que eu reduzo a jornada e mantenho o mesmo salário, o salário-hora passa a ser maior. Isso vai impactar, por exemplo, no pagamento de horas extras e respectivas integrações. O valor da hora trabalhada passa a ter um valor superior considerando o novo divisor”, calcula. “Além disso, temos um impacto jurídico que pode não permitir o retorno à condição anterior por se tratar de uma alteração benéfica ao trabalhador. O empregador que se inserir nesse novo modelo terá grande dificuldade para a retomada da jornada anterior, caso não tome algumas cautelas”, avalia.
Leandro explica que para evitar riscos jurídicos por parte da empresa empregadora, é indicado que essa altercação seja feita através de acordo coletivo, justamente para prever e possibilitar a retomada da jornada anterior, se necessário. “É importante que através de um acordo fique demonstrado se tratar de um período transitório e de experiência. Esse novo sistema de jornada se baseia no 100% de produtividade. Esse sistema é conhecido como 100-80-100. Ou seja, 100% do salário, 80% da jornada e 100% de produtividade. Existe uma expectativa de manutenção da mesma produtividade. Se isso não se concretizar, o empregador deve deixar o caminho pavimentado para permitir a retomada da jornada anterior. Por isso, para esse período de experiência e adesão ao projeto, é indicado que a redução ou alteração da jornada seja feita através de acordo coletivo com o sindicato”.
Sobre o possível interesse das empresas brasileiras consentirem com a redução da jornada semanal, Leandro esclarece. “A adesão das empresas para essa experiência dependerá de uma avaliação prévia de compatibilidade, pois muitos segmentos econômicos ou atividades não guardam relação com produtividade, como é o caso do comércio, da indústria, tecnologia e de várias atividades administrativas em geral que precisam ser realizadas diariamente” (Fonte: Andrade Maia Advogados).