David Braga (*)
Embora tenhamos testemunhado um aumento na presença feminina, disparidades persistem, especialmente em termos de equidade salarial e oportunidades. A determinação do papel da mulher no mercado de trabalho é uma escolha pessoal, muitas vezes envolvendo decisões difíceis entre família e carreira, o que influencia diretamente a presença delas em cargos de liderança corporativa.
Antes de adentrarmos em qualquer discussão, lhe convido à reflexão: quem disse que, para uma mulher ser feliz, é necessário ocupar posições de liderança? Trago essa provocação, pois a sociedade cria estereótipos que definem padrões de “sucesso”. Assim, acredita-se que para ser feliz é preciso casar, ter uma casa própria ou mesmo alcançar cargos de liderança.
Um estudo recente realizado em 2023 pela Visier, uma plataforma de análise de pessoal e planejamento de força de trabalho, revela uma tendência interessante: os funcionários estão trocando cargos de liderança por tempo livre. O estudo, conduzido nos Estados Unidos, investigou as ambições dentro e fora do local de trabalho, incluindo a gestão de pessoas, dos entrevistados.
Conclusão: 91% dos funcionários liberais preferem não se tornar gestores, seja pelo estresse adicional, seja pela satisfação com suas funções atuais. Embora a pesquisa tenha considerado profissionais de diferentes faixas etárias, essa tendência de equilibrar trabalho e qualidade de vida já é uma característica marcante na Geração Z (nascidos entre 1996 e 2010), que representa os futuros líderes das organizações.
Durante a pandemia, muitos puderam equilibrar melhor vida pessoal e profissional, percebendo que há mais na vida do que apenas trabalho e finanças. É essencial entregar resultados no trabalho de maneira sustentável, preservando a saúde mental e evitando o esgotamento profissional, que pode prejudicar tanto o colaborador quanto a empresa.
Para as mulheres que aspiram avançar em suas carreiras e ocupar posições de liderança, há um dado encorajador: em 2023, pela primeira vez na história das empresas listadas na Fortune 500, 10% dos CEOs eram mulheres, representando um marco significativo. Apesar de ainda haver espaço para crescimento, essa porcentagem já é superior à de anos anteriores.
A inclusão delas em todos os níveis de liderança está se tornando um tema frequente, impulsionado pelas práticas de ESG (Environmental, Social and Governance) exigidas das organizações. Neste ano, não há mais espaço para empresas com práticas machistas e excludentes. Nos processos seletivos, há uma crescente busca por diversidade, em todas as esferas e, principalmente, de ideias.
Ignorar essa questão pode levar ao fracasso e à falência das organizações, uma vez que os consumidores exigem diversidade e inclusão de forma contundente. As mudanças precisam ocorrer em todos os âmbitos da sociedade, não apenas dentro das empresas. O sistema precisa ser transformado. Quem disse que é papel da mulher cuidar da casa, do trabalho e da carreira? Por que essa sobrecarga precisa recair principalmente sobre elas?
Da mesma forma, é crucial entender que o processo de mudança não ocorre da noite para o dia e requer consistência, resiliência e, sobretudo, competências. A implementação de políticas público-privadas que garantam direitos e deveres iguais para homens e mulheres, como a ampliação da licença paternidade, também é relevante para que as mulheres tenham as mesmas condições de competitividade.
Cada mulher deve buscar a felicidade e o autoconhecimento, seja por terapia ou coaching, independentemente do cargo ocupado. Não importa se você é uma analista, coordenadora, gerente, diretora ou presidente, mas sim se está impactando vidas com seu trabalho e se, ao final do dia, sente-se realizada. O importante é impactar vidas com seu trabalho, conforme Antoine de Saint Exupéry destacou: ‘O que se leva da vida é a vida que se leva’.
Com a evolução do mercado empresarial, a valorização das chamadas soft skills, competências e habilidades comportamentais, tem se fortalecido globalmente. Neste contexto, as mulheres se destacam e impactam positivamente o desempenho financeiro das organizações. Diferentemente dos homens, que tendem a ser mais pragmáticos, as mulheres demonstram sensibilidade, sensatez e assertividade, características essenciais para a gestão de conflitos.
Além disso, possuem habilidades superiores para trabalho em equipe e negociação eficaz. Integrar essas características femininas pode ser o diferencial necessário para as empresas se adaptarem e se reinventarem constantemente. Quanto à competitividade, o mercado de trabalho demanda profissionais competentes e dotados do maior conjunto possível de habilidades, independentemente de gênero, raça, cor ou outros fatores.
Nesse sentido, as mulheres têm todas as condições necessárias para competir e se destacar. É essencial que elas desenvolvam competências, habilidades e conhecimento técnico nas áreas em que atuam, permitindo que assumam cada vez mais responsabilidades e cargos de maior complexidade, caso desejem.
O etarismo, ou preconceito contra os idosos, ganhou destaque após a pandemia, especialmente com a crescente aceitação das mulheres em relação aos cabelos brancos naturais. Esse aumento de visibilidade trouxe o assunto para discussão, mas ainda enfrenta obstáculos significativos no ambiente corporativo. É comum que as empresas busquem profissionais mais jovens, mesmo para cargos de alta gestão, como gerentes e diretores, uma prática que não reflete a sensatez.
Hoje, uma mulher de 60 anos pode ser tão jovem, ativa e produtiva quanto qualquer outra, trazendo consigo uma vasta experiência profissional e pessoal valiosa para contribuir com as empresas. Assim cabe aos órgãos de administração das empresas, desde os conselhos de administração até a alta gestão, não apenas discutir, mas também implementar práticas eficazes para a inclusão e valorização dessas profissionais.
(*) – Conselheiro de Administração e professor convidado pela Fundação Dom Cabral, é CEO, board advisor e headhunter da Prime Talent. Instagrams: @davidbraga e @prime.talent.