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Museu do Ipiranga questiona os sentidos da independência

em Especial
terça-feira, 04 de setembro de 2018
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Museu do Ipiranga questiona os sentidos da independência

Nos dias 7 e 8, festival vai promover discussão sobre abolição e independência através da diversidade cultural

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Fotos: Helio Nobre

Fachada do Museu Paulista da USP, também conhecido como Museu do Ipiranga, em São Paulo.

Luiz Prado/Jornbal da USP

É uma independência às portas de seus 200 anos. A imagem de um portal é boa. Evoca os negros crepitando com o inverno dos grandes centros urbanos, os indígenas estrangulados pelo latifúndio e as mulheres saltando diariamente no campo minado do machismo. Independência para quem? Quantos estão comendo e bebendo do lado de dentro do baile? Quem ficou de fora?

Essa é a reflexão crítica que o evento Museu do Ipiranga em Festa! quer imprimir em sua segunda edição. Nos dias 7 e 8 de setembro, o Parque da Independência será ocupado por dança, teatro, música, poesia e cortejos conjurados para questionar, através da celebração, os significados da Independência na atualidade. O Museu Paulista (MP) da USP – também conhecido como Museu do Ipiranga – divide a organização e curadoria da programação com o Serviço Social do Comércio (Sesc). Todas as atividades são gratuitas.

Três marcos históricos direcionam o repertório de atividades. O primeiro deles é a própria Independência de 1822 e seus desdobramentos ao longo do século 19, com destaque para o problema da abolição da escravatura. A apresentação do bloco afro Ilu Obá de Min, composto apenas de mulheres, o cortejo de maracatu de baque virado do Grupo Zabelê, de Cubatão, e a roda de jongo da Comunidade do Tamandaré de Guaratinguetá resgatam as tradições negras marginalizadas pelo processo de constituição da nação. A roda Xondaro, uma dança guerreira dos guaranis mbya, da aldeia Rio Silveira, em Boraceia, soma a identidade indígena à festa.

“É bom lembrar que o Brasil foi o último país a abolir a escravatura no contexto da América Latina e isso tem um significado”, comenta a diretora do Museu Paulista, professora Solange Ferraz de Lima. “O Brasil continuou recebendo uma população africana até meados do século 19 e isso deixou marcas em nossa cultura, de desigualdades, inclusive. Se hoje nós temos uma marca muito evidente da cultura africana nas nossas comidas, na nossa música, na nossa religiosidade, isso não significa que essa convivência seja absolutamente pacífica. Existe uma coincidência entre racismo, preconceito, pobreza e essas populações. E nada mais apropriado, quando se fala de independência, quando se pensa esse museu para 2022, do que trazer essas questões. E isso feito de uma maneira acolhedora, de uma maneira alegre. E uma festa é uma boa maneira de mostrar a nossa diversidade.”

O segundo eixo da curadoria é 1922, com as comemorações do centenário da Independência e a explosão cultural da elite paulista, materializada na Semana de Arte Moderna como uma “renascença paulista”. Esse é o espaço para as intervenções do Grupo XIX de teatro, representando personagens e textos da época.

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Fotos: Ailton Martins

O Grupo Zabelê realiza cortejo de maracatu de baque virado, de origem pernambucana.

A reflexão também perpassa essas atividades, de acordo com Solange. Valendo-se da liderança política, econômica e cultural, São Paulo foi responsável por estabelecer narrativas sobre a história do Brasil, como a celebração dos bandeirantes. “São Paulo se coloca no lugar de narrar a formação da nação. É o lugar onde as vanguardas estão acontecendo e você tem uma produção cultural que é importante. Tão importante que se torna matriz para os livros didáticos e coloca essa narrativa no imaginário nacional. Hoje, quando se fala da Independência, esse edifício-monumento, construído para celebrar a independência, e todas as suas pinturas históricas são de alguma maneira lembrados. São narrativas complicadas que precisam ser problematizadas, mas elas estão aí, não podemos ignorá-las. A ideia é trazer isso para um debate vivo. E, como estamos num momento de festa, vamos tratar dessas questões também por meio da arte.”

Cem anos depois e próximo de nós, 2022 surge como o terceiro marco, representativo da promessa: o bicentenário, a reabertura do museu (fechado para reformas desde 2013) e o futuro que surge com a juventude. É um espaço também de atualidade, com apresentações de poesias de refugiados da Venezuela, República Democrática do Congo, Angola, Palestina, Haiti e Guiné.

A programação Museu do Ipiranga em Festa! conta com patrocínio da Petrobras e, através da Lei Rouanet, da resseguradora IRB Brasil RE e do Banco Santander. O apoio institucional é da Lei de Incentivo à Cultura, Instituto Bandeirantes e Prefeitura de São Paulo.

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Fotos: Cristine Takua

Guaranis mbya levam ao evento a roda Xondaro, roda de dança que prepara os guerreiros para a caça e o combate.

Sobre o museu
O edifício-monumento está fechado para visitação pública desde 2013. Passa atualmente por reformas e sua reabertura está prevista para 2022, bicentenário da Independência. O projeto executivo da reforma teve início em 2018 e é elaborado pelo escritório Hereñu + Ferroni Arquiteto Ltda, vencedor de concurso promovido pela Fundação de Apoio à Universidade de São Paulo (Fusp) em 2017.