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Misto de sentimentos marca saída dos militares brasileiros do Haiti

em Especial
segunda-feira, 17 de julho de 2017
Marcello Casal/ABr

Misto de sentimentos marca saída dos militares brasileiros do Haiti

A pouco mais de três meses para o fim da Missão de Estabilização da Organização das Nações Unidas (ONU) no Haiti, os últimos 978 militares brasileiros a participar da chamada Operação Minustah (abreviatura do nome da missão, em francês) se preparam para retornar ao Brasil, experimentando um misto de sentimentos e a expectativa de que o povo haitiano conheça tempos melhores.

Marcello Casal/ABr

Após 13 anos, missão brasileira no Haiti está próxima do fim.

Segundo a Resolução 2.350/2017, aprovada pelo Conselho Segurança das Nações Unidas em abril, todo o efetivo militar empenhado na missão deve deixar o país gradualmente, até 15 de outubro, quando a operação será oficialmente encerrada. A partir desta data, a ONU instituirá sua Missão de Apoio à Justiça (Minujusth) naquele que é considerado o país mais pobre das Américas e um dos mais carentes do mundo.

A desmobilização do efetivo teve início no último dia 26. As ações, no entanto, continuam. O Batalhão de Infantaria brasileiro, por exemplo, vem ajudando no mapeamento dos locais mais suscetíveis a desastres naturais. O conhecimento prévio destes locais é extremamente importante caso o país caribenho volte a ser atingido, por exemplo, por um furacão, fenômeno comum entre os meses de junho e novembro. Segundo dados da ONU, o Haiti é o país com o maior número de vítimas fatais por catástrofes naturais.

Em 15 de junho, a Minustah transferiu para a Polícia Nacional haitiana o policiamento de Cité Soleil, comuna do coração da capital haitiana, Porto Príncipe, que, até 2006, era dominada por gangues que ameaçavam os moradores, trabalhadores e qualquer pessoa que visitasse o local. A tropa brasileira continua ocupando a base militar instalada no local e realizando patrulhas esporádicas, mas após ter sido considerada uma das áreas mais violentas do mundo, hoje, Cité Soleil é tida como local relativamente seguro.

Desde 2004, quando foi escolhido para liderar a missão de estabilização formada por tropas de 16 países, o Brasil enviou ao país cerca de 37 mil militares.De acordo com o Ministério da Defesa, a previsão é encerrar as operações de manutenção da lei e da ordem até o dia 1º de setembro e trazer de volta à casa 90% dos militares brasileitos até 15 de setembro. Os soldados e oficiais que permanecerem no país após esta data serão encarregados de cuidar exclusivamente das últimas medidas administrativas necessárias à repatriação, até 15 de outubro, de todo o material e equipamento brasileiro.

Segundo o comandante de esquadrão do Pelotão de Fuzileiros, cabo Walace Leite Dantas, um misto de sentimentos cresce à medida que se aproxima a data do encerramento da missão. “O sentimento de servir no Haiti, especialmente neste contingente responsável por encerrar a presença brasileira junto a Minustah, mistura felicidade com a responsabilidade de não jogar fora tudo o que foi feito pelos que nos antecederam”, disse Dantas. “Não vou dizer que a expectativa de retornar ao Brasil aumenta à medida que se aproxima a data final porque a vontade de ficar e continuar ajudando quem precisa é maior”, completou.

Em janeiro de 2010, quando o Haiti foi devastado por um terremoto de 7 graus na escala Richter, a situação humanitária se agravou e a ajuda internacional se tornou ainda mais necessária.Desde 2004, quando foi escolhido para liderar a missão de estabilização formada por tropas de 16 países, o Brasil enviou ao país cerca de 37 mil militares, segundo o Ministério da Defesa. O maior contingente é o do Exército, que mobilizou 30.359 homens e mulheres. A Marinha enviou 6.299 militares e a Aeronáutica, 350. O efetivo que se encontra no Haiti desde maio é o 26º e último contingente brasileiro deslocado com a missão de ajudar a reestabelecer a segurança e a normalidade institucional após a turbulência política que culminou com episódios de violência durante protestos e manifestações políticas e com a renúncia do então presidente Jean Bertrand Aristide, eleito em 2000.

Para o comandante do esquadrão de fuzileiros, capitão Daniel Nicolini de Oliveira, a participação brasileira no Haiti deixa o sentimento de dever cumprido, mas também a apreensão pela responsabilidade de que os resultados positivos da missão sejam mantidos. “Hoje, ao andarmos pelo Haiti, constatamos o quanto a Minustah ajudou o país. A expectativa de retornar ao Brasil e rever a todos os que nos apoiaram e que torcem por nós é grande. Assim como é grande a responsabilidade de desmobilizarmos o batalhão e repatriar todo o material brasileiro, o que demanda uma logística muito grande”, comentou o capitão, convencido de que o efetivo brasileiro “somou positivamente para com a missão da ONU”.

Quando recebeu o convite do Conselho de Segurança da ONU para liderar a Minustah, o governo brasileiro enxergou a oportunidade de, além de ajudar o Haiti, projetar a imagem do Brasil internacionalmente, o que coincidiu com o projeto estratégico de tentar consolidar a liderança regional do país. Em janeiro de 2010, quando o Haiti foi devastado por um terremoto de 7 graus na escala Richter, a situa­ção humanitária se agravou e a ajuda internacional se tornou ainda mais necessária. Mais de 220 mil pessoas morreram, entre elas a médica brasileira Zilda Arns, fundadora da Pastoral da Criança, e o diplomata brasileiro Luiz Carlos da Costa, vice-chefe da missão de paz da ONU. Cerca de 300 mil pessoas ficaram feridas e mais de 1,5 milhão de haitianos ficaram desabrigados.

A pouco mais de três meses para o fim da Missão no Haiti, os últimos 978 militares brasileiros a participar da chamada Operação Minustah se preparam para retornar ao Brasil.Infelizmente, a tragédia haitiana ainda estava longe do fim. Em outubro de 2016, o país foi atingido pelo Furacão Matthew, que afetou cerca de 2 milhões de pessoas, matando centenas delas. O furacão também destruiu sistemas de água e esgoto recém-construídos, provocando inundações e agravando os problemas de saúde pública. O efetivo da Minustah foi novamente acionado para desobstruir estradas bloqueadas e levar água, comida e medicamentos à população de comunidades isoladas, além de, mais uma vez, ajudar na reconstrução de casas e da infraestrutura afetada.

Os brasileiros de “capacetes azuis” (usados pelos militares que integram a missão de paz) também tocaram obras de engenharia importantes para a reconstrução do Haiti. Para se ter uma ideia, entre os 978 militares do atual contingente brasileiro no país, 120 integram a Companhia de Engenharia de Força e Paz. Ao longo dos anos, a companhia participou de inúmeras ações com vista à melhoria da infraestrutura nacional e das condições de vida dos haitianos, como a construção de escolas, orfanatos, hospitais, unidades de polícia e estradas e outras instalações militares, além da perfuração de poços artesianos, regularização de terrenos e remoção de escombros e de entulho.

Já os 850 membros do Batalhão de Infantaria continuam encarregados da missão de manter um ambiente seguro e estável, realizando patrulhas, escoltando comboios, fiscalizando o movimento nas principais estradas e avenidas haitianas e dando a segurança necessárias às demais ações humanitárias. Segundo dados do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal, de 2004 até o fim de 2016, o Brasil investiu cerca de R$ 2,5 bilhões na Minustah. Cerca de R$ 431,3 milhões foram reembolsados pela ONU.