Frutas nativas brasileiras podem ser alternativa de renda
Na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em Piracicaba, vem sendo desenvolvido um projeto com frutas nativas da Mata Atlântica que visa tornar estas espécies importantes comercialmente
O cambuci é uma das espécies que poderiam enriquecer a dieta da população brasileira. |
Caio Albuquerque, da Esalq/Agência USP de Notícias
“O Brasil possui uma grande diversidade de espécies frutíferas com potencial de se tornarem importantes comercialmente, mas são desconhecidas da maioria da população. Podemos citar espécies como: cambuci, grumixama, uvaia, cereja do rio grande, cambucá, cabeludinha, pitanga, pitangatuba, pitomba, araçá, feijoa, camu-camu, umbu, cajá, guabiju, bacuri, cupuaçu, pupunha, pitomba, sapota, etc.”, conta o professor Angelo Pedro Jacomino, do Departamento de Produção Vegetal da Esalq.
De acordo com o docente, essas espécies poderiam enriquecer a dieta da população brasileira em níveis nacional ou regionais com benefícios em termos de sabor, aroma, nutrientes e compostos bioativos, entre outros. “Estas espécies podem também representar alternativa de renda, especialmente para pequenos produtores rurais e agroindústrias”.
Outra importância do uso destas espécies é na recomposição de áreas que precisam ser reflorestadas. “Por serem nativas do Brasil, elas são permitidas para este fim, trazem benefícios para a fauna e flora, e podem ser manejadas de forma sustentada para geração de renda”, explica. Além disso, segundo o docente, “é necessário o desenvolvimento de pesquisas visando selecionar material genético com maior potencial comercial, ou seja, que atendam bons índices de produtividade, sanidade, rendimento, qualidade, conservação pós-colheita, entre outros”.
O Brasil é um dos maiores produtores mundiais de frutas, atrás apenas da China e da Índia. Nossa produção anual ultrapassa a marca de 40 milhões de toneladas de frutas cítricas, banana, mamão, manga, maçã, uva, melão, abacaxi, abacate, maracujá e goiaba, dentre outras menos expressivas. “Entre estas frutas, bastante conhecidas e consumidas, apenas a goiaba, o caju, o maracujá e o abacaxi são nativas do Brasil. Todas as demais foram introduzidas de outros países”, conta o professor.
Espécies
A Mata Atlântica é um dos biomas mais ameaçados do mundo e um dos mais ricos em termos de diversidade genética. “A área remanescente representa uma pequena fração da mata original, a qual foi substituída, inicialmente, pela cultura do café. Atualmente esta região abriga, na sua maioria, propriedades que praticam pecuária extensiva com baixa rentabilidade e baixa sustentabilidade”, descreve Jacomino.
Em uma primeira fase, as principais espécies estudadas serão cambuci, uvaia, grumixama e cereja do rio grande. Segundo o docente, o cambuci ganhou espaço na mídia principalmente devido às atividades da Rota do Cambuci, que tem contribuído para a visibilidade desta espécie. “Há pequenos produtores desta fruta na região da Serra do Mar paulista e já existe algum comércio de produtos artesanais e de polpa congelada.
A uvaia é uma fruta da qual muitas pessoas já ouviram falar, mas praticamente não existe comércio dela. A grumixama e a cereja do rio grande são as menos conhecidas entre estas quatro espécies, mas destacam por serem saborosas e ricas em compostos antioxidantes”.
Em andamento
Os estudos tiveram início com a localização e o georreferenciamento de plantas de cada uma das espécies em pequenos produtores, fundos de quintais, bancos de germoplasma de instituições de pesquisa e iniciativa privada, bem como na floresta nativa. “Os trabalhos com o cambuci estão mais avançados. Já foram analisadas mais de 100 plantas no ano passado e uma nova expedição para identificação de plantas e coleta de frutos terá início nas próximas semanas”, conta Jacomino.
De acordo com o docente, foi observada uma grande variação no tamanho e formato dos frutos, bem como nos teores de acidez e de açúcares, indicando que há grandes possibilidades de sucesso em trabalhos de melhoramento genético. “Inclusive já está sendo realizada a caracterização molecular de cada uma destas plantas e a formação de bancos de germoplasma para preservação da diversidade genética”.
Também já tiveram início os estudos de determinação de ponto ideal de colheita, uma vez que atualmente os produtores colhem os cambucis no chão, o que prejudica a qualidade e durabilidade da fruta. “O objetivo é desenvolver técnicas que permitam identificar e colher o fruto na planta com toda a qualidade do fruto maduro. Estudos de conservação in natura e de conservação da polpa sob diversas condições de processamento e armazenamento também serão realizados. Isso permitirá o abastecimento do mercado com matéria prima ao longo do ano, uma vez que, nas condições naturais, estas espécies possuem um curto período de safra”, complementa.
Mudas
Outro foco do trabalho é o desenvolvimento de técnicas de produção de mudas que permitam a manutenção das boas qualidades das plantas mães. “Já tiveram início também estudos de tecnologia de produção destas espécies para entender as respostas das plantas às diferentes condições de solo e de adubação. Em breve, iniciaremos estudos de manejo das plantas, tais como podas, irrigação, controle do florescimento e da época de colheita, dentre outros aspectos. Assim pretendemos que o projeto traga benefícios ambientais, sociais e econômicos desde a produção até o consumidor final”, afirma.
Cientistas criam sorvete com sabor juçara de baixas calorias
Antonio Carlos Quinto/Agência USP de Notícias
Um sorvete sem lactose, à base de água, com sabor juçara e baixo valor calórico! O produto foi desenvolvido por cientistas da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) da USP, em Pirassununga, que conseguiram desenvolver formulações probióticas e prebióticas do sorvete.
Os sorbets (como são conhecidos os sorvetes à base de água) foram elaborados durante a pesquisa de mestrado da bióloga Júlia Fernanda Marinho, no Departamento de Engenharia de Alimentos da FZEA. O fato de ser intolerante à lactose foi uma das motivações que levou Júlia ao desafio de desenvolver o sorvete à base de água. Já a opção pelo fruto do palmiteiro juçara, além do sabor, que é semelhante ao do açaí, se deu pelo fato de existir um “apelo sustentável”. “A extração dos frutos permite que a árvore seja preservada e há muitas comunidades ribeirinhas que utilizam a fruta como fonte de renda”, lembra.
A extração do palmito da planta tem como principal consequência a extinção da espécie em diversas áreas da Mata Atlântica. E Júlia lembra que o fruto de juçara é rico em compostos fenólicos, principalmente antocianinas, que são poderosos antioxidantes capazes de impedir os efeitos danosos dos radicais livres no organismo, retardando o envelhecimento e prevenindo o surgimento de doenças como câncer, Alzheimer e doenças cardiovasculares.
Júlia conta que os testes para o desenvolvimento do produto foram compostos de cinco formulações. Na primeira delas, considerada controle, a composição teve polpa de juçara, água, açúcar e emulsificante; Na segunda formulação, além dos componentes da primeira, foi adicionado o probiótico Lactobacillus acidophilus. Numa terceira formulação além dos itens da segunda, adicionou-se a fibra polidextrose (prébiótico) obtendo uma amostra “simbiótica”. “Na quarta composição utilizei um outro tipo de probiótico, o ‘lactobacillus paracasei’ e retirei a polidextrose”, conta Júlia. A última composição foi semelhante à quarta, mas com a polidextrose adicionada. “A polidextrose é uma fibra industrializada muito usada na indústria alimentícia”, explica a pesquisadora.
Todas as formulações passaram por diversas análises durante os quatro meses em que estiveram armazenadas. “Nos quatro meses de armazenamento não houve nenhuma alteração do produto”, afirma, lembrando que, ao final conseguiu obter duas amostras probióticas e outras duas simbióticas. As análises sensoriais envolveram 100 provadores. “Além do sabor, foi levada em conta a intenção de compra, após os produtos serem provados. A maior aceitação foi em relação ao produto probiótico”, conta Júlia.
Os microrganismos probióticos são importantes para a regulação da microbiota intestinal e têm diversos outros benefícios já comprovados, como diminuição do colesterol e fortalecimento da imunidade. “Já os prebióticos são fibras alimentares capazes de potencializar a ação dos probióticos no organismo de quem os consome e trazer também inúmeros benefícios”, afirma a bióloga.
A pesquisa de Júlia teve a orientação da professora Carmen Silvia Fávaro Trindade , do Departamento de Engenharia de Alimentos da FZEA. Os estudos tiveram início em 2014 e a dissertação Desenvolvimento e avaliaçãode sorbets probióticos e simbióticos elaborados com polpa de juçara (Euterpe edulis) acaba de ser apresentada na FZEA.