Leonardo Grapeia (*)
Não é novidade para ninguém que o Brasil é um país de desigualdades sociais, econômicas e financeiras.
Parte considerável da população está desempregada e outra parcela atua na informalidade, condições que, por vezes, levam os cidadãos a tomarem empréstimos com juros exorbitantes ou a entrarem em dívidas que os tornam inadimplentes.
Segundo dados do IBGE, temos atualmente a inflação em ascensão (4,29% nos primeiros quatro meses de 2022) e o desemprego alto (10,5%), além das taxas de juros básicas (Selic) em dois dígitos (13,25%). Esses três fatores combinados levam a uma corrosão no poder de compra do consumidor, na capacidade de honrar dívidas, na instabilidade das finanças pessoais e na necessidade de fontes de crédito de custo mais alto.
De acordo com dados da Serasa Experian, a inadimplência também bateu novo recorde: em abril, mais de 66 milhões de brasileiros estavam com o nome no vermelho, o maior número da série histórica iniciada em 2016. Deste número, mais de 2 milhões de brasileiros se tornaram inadimplentes em 2022. Com relação ao perfil das dívidas, os segmentos de Bancos e Cartões possuem 28,1% dos débitos, enquanto contas básicas como água, luz e gás representam 22,9%.
Na comparação com abril de 2021, o setor de Financeiras foi o que teve maior aumento na participação de inadimplência, indo de 9,6% para 12,4%. Dados da Pesquisa de Endividamento e Inadimplência do Consumidor (Peic) apontam que o endividamento com cartão de crédito atingiu nível recorde entre famílias com maior renda. Nos últimos anos, o cartão de crédito se consolidou como o tipo de dívida mais comum entre os brasileiros.
E aí é que mora um grande perigo. O uso dessa modalidade deve ser feito somente quando o consumidor tiver renda para efetuar o pagamento da fatura no vencimento. Além disso, deve-se evitar o pagamento mínimo do cartão, pois as taxas de juros cobradas podem chegar a 371% ao ano, segundo dados da Pesquisa Anefac, e jamais deve-se utilizar o limite do cheque especial como forma de crédito (taxas de 150% ao ano, segundo o mesmo levantamento).
O problema é que grande parte da população não tem acesso a esse tipo de informação. No Brasil, ensino religioso e química orgânica fazem parte do currículo escolar obrigatório, mas as finanças básicas, por exemplo, não. Juros e porcentagem são distantes para a maioria dos brasileiros.
Por conta da ignorância financeira perpetuada em nosso país, é fácil compreender como tanta gente assume dívidas impagáveis, comprometendo seu futuro financeiro. A maioria ignora o efeito brutal dos juros compostos, presentes nas dívidas do cartão de crédito e do cheque especial, por exemplo. Endividados pouco se atentam às decisões políticas que os afetam, uma vez que sua atenção está voltada aos inúmeros boletos e contas acumuladas.
Vale reforçar que a tomada de crédito tem que ser uma solução e não a ampliação de um eventual problema financeiro. Uma alternativa para estancar a bola de neve que se cria é buscar negociações com cada operadora ou em alguns casos acessar empréstimos pessoais, com juros mais baixos, para o pagamento das dívidas dos cartões.
No entanto, a minimização desses riscos passa pelo consumo consciente como parte fundamental de uma boa educação financeira, especialmente em função da relação entre o consumo e a perda de controle das finanças pessoais. O consumo por impulso leva a uma necessidade de fontes de crédito de custo mais alto, como cheque especial e cartão de crédito e a um nível de comprometimento de renda acima do que é considerado saudável no mercado brasileiro.
O consumo consciente e a educação financeira nunca foram tão importantes para o brasileiro da vida real.
(*) – É CEO da Focus Financeira, instituição especializada em crédito, financiamento e investimentos (www.focusfinanceira.com.br).