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Spotify e sua expansão fora da música

em Economia da Criatividade
quinta-feira, 09 de setembro de 2021

No dia 16 de junho de 2021, o Spotify lançou o Greenroom e entrou oficialmente na “batalha” dos aplicativos de áudio ao vivo, espaço dominado pelo Clubhouse. O lançamento, entretanto, era uma questão de tempo. Em março deste ano, ao anunciar a aquisição da Locker Room, aplicativo de áudio focado em esportes, o Spotify declarou que essa compra ajudaria a acelerar a entrada da empresa no mercado de áudio ao vivo. Agora, com mais de 140.000 downloads, de acordo com dados divulgados pela Sensor Tower, o Greenroom tem muita estrada pela frente para alcançar os milhões de usuários que utilizam o Clubhouse mensalmente. Como já vimos antes, não podemos duvidar da capacidade que a empresa sueca tem de superar seus adversários.  

Hoje em dia podemos dizer que o Spotify é a “bola da vez” quando o assunto é podcasts, mas para que isso acontecesse levaram muitos anos e milhões de dólares de investimento. Seu principal concorrente, a Apple, começou a disponibilizar podcasts no iTunes desde 2005 enquanto o Spotify incorporou-os somente em 2015. Na época, o então senior staff writer da Fast Company John Paul Titlow escreveu que “com o bom andamento da ‘era dourada’ do podcast, adicioná-los na plataforma parece ser um passo lógico”. Em 2021, segundo a Statista, é previsto que finalmente o Spotify supere nos Estados Unidos a Apple Podcasts em número de ouvintes mensais com 28,2 milhões contra 28 milhões da empresa americana.

Quando uma empresa domina o seu segmento é normal pensar em diversificar sua oferta de produtos ou serviços uma vez que novos competidores surgem com propostas distintas e inovadoras. No caso do Spotify não foi diferente. Em maio de 2015, quando decidiu disponibilizar podcasts em sua plataforma, a empresa já havia visto o lançamento da Tidal em outubro de 2014 e previa uma competição ainda mais forte com as chegadas de Apple Music em junho e YouTube Music em novembro do mesmo ano. No entanto, foi em 2019 que começamos a notar as reais intenções do Spotify perante o mercado de podcast.

GIMLET & ANCHOR

Em fevereiro de 2019, ocorreram as duas primeiras grandes aquisições realizadas pelo Spotify entre tantas realizadas nos últimos 2 anos. A Gimlet Media, uma startup podcast network teve sua compra avaliada em torno de US$230 milhões, enquanto a Anchor FM, plataforma que auxilia criadores a gravar, publicar e monetizar seus podcasts, não teve valores divulgados publicamente. Fontes na época informaram que a venda tinha ficado na casa dos US$150 milhões.

Em uma publicação feita pela The Verge, o CEO Daniel Ek comentou que em apenas dois anos a empresa havia se convertido na segunda maior plataforma de podcasts e que “os ouvintes de podcast da plataforma passavam quase duas vezes mais tempo na plataforma e passavam ainda mais tempo escutando música.”

Ao centralizar e integrar dois tipos de conteúdo no mesmo aplicativo você consegue atrair três tipos de usuários que predominantemente consomem: música, podcasts ou as duas formas de entretenimento. Se focamos na afirmação dada na época por Ek, consumidores de podcast realmente passam mais tempo conectados em função de que a duração de um podcast equivale, em sua grande maioria, a no mínimo 10 músicas de 3 minutos. Neste caso, incrementar o conteúdo de podcast na plataforma aumenta o número de assinantes que consomem podcasts que permanecerão por mais tempo conectados, seja ouvindo vários episódios seja combinando podcast e música.

PARCAST

Menos de 2 meses após a dupla aquisição, o Spotify agiu novamente e adquiriu a Parcast por US$56 milhões, podcast network especializado em programas de investigação, mistério e ciência-ficção. A compra, apesar de focar no conteúdo específico, foi realizada estrategicamente já que, segundo a empresa, os gêneros dos programas produzidos pela Parcast eram dos favoritos entre os usuários da plataforma. A partir desta última aquisição, o Spotify não só passou a ter mais conteúdo como também conteúdo mais segmentado.

THE RINGER & MEGAPHONE

No começo de 2020, seguindo a mesma estratégia de compra focada em conteúdo segmentado, a empresa gastou US$196 milhões para adquirir o The Ringer, network de podcast que contém mais de 30 podcasts sobre esportes além de outros sobre cultura pop que acumulavam mais de 100 milhões de downloads por mês. Em nota publicada pela Tech Crunch, Ek disse que “a tendência pela qual estamos investindo é que o radio está indo para o online e acabamos de comprar a próxima ESPN”.

No final de 2020, o gigante da música deu mais um passo para converter-se no principal player de podcasts quando anunciou a compra da Megaphone, plataforma de hospedagem de áudio e tecnologia de publicidade, por US$235 milhões. Neste caso, a estratégia de compra foi realizada principalmente pela tecnologia de inserção de publicidade da Megaphone chamada “Streaming Ad Insertion (SAI)” que, segundo a The Verge, “tem as publicidades inseridas em tempo real ao invés de serem trocadas antes de uma reprodução”. Agora o Spotify consegue aproveitar as informações que já possui sobre os seus usuários e pode tomar melhores decisões sobre qual publicidade o ouvinte deve escutar.

Com a aquisição da Megaphone, o Spotify passou a ter um vasto network de podcasts com uma plataforma de reprodução, um software de criação, duas plataformas de hospedagem e um time de publicidade que combina o acesso de dados com uma tecnologia de inserção em tempo real. Atualmente, após divulgar seu último relatório trimestral no dia 28 de julho, o Spotify mostrou um aumento anual de 627% em receita de publicidade de podcasts que, de acordo com a empresa, se atribui muito a essas grandes aquisições e contratos de exclusividade.  

CONTRATOS DE EXCLUSIVIDADE

Como hoje em dia vemos conteúdo sendo produzido e disponibilizado em abundância, a batalha pela atenção e tempo das pessoas ficou ainda maior, sobretudo no entretenimento. Por conta disso, muitas empresas têm adotado a estratégia de garantir a exclusividade de certos programas, filmes, atores, roteiristas, diretores, produtores etc.

No caso do Spotify, foram feitos acordos milionários exclusivos de licenciamento com alguns dos principais programas a nível regional e global como: “The Joe Rogan Experience” com Joe Rogan e “Call Her Daddy” com Alex Cooper, ambos dos Estados Unidos, e “Primocast” com Thiago Nigro no Brasil, além de contratos com personalidades como Barack e Michelle Obama e Príncipe Harry e Meghan Markle. Com isso, o Spotify aposta na premissa de que as pessoas estarão onde seus programas/personalidades favoritas estiverem para conseguir incrementar o número de horas que essas pessoas passam na plataforma possibilitando um aumento na receita de publicidade.

Hoje, 25% dos 365 milhões de usuários mensais ativos escutam podcasts na plataforma e esse percentual deve seguir aumentando já que os investimentos e aquisições devem continuar além da procura por inovações que possam oferecer uma melhor experiência ao ouvinte. O Greenroom, citado no começo, é só mais uma opção de interação com áudio que pode ser também reutilizado para converter-se em podcast e, com a recente compra da Podz em junho deste ano, o Spotify visa “melhorar a descoberta de novos podcasts, entregando aos ouvintes o conteúdo no momento certo e acelerar o crescimento da categoria mundialmente” e se consolidar ainda mais como referência em podcasts.

Guilherme Canineo é ex tenista profissional, jornalista, apresentador e especialista em podcasts. Mestre em Entertainment Business pela Full Sail University e formação em jornalismo pela University of West Florida. Comanda, toda quinta 17:30h, a live “Resumão da Semana” nos canais da Full Sail Brazil Community.