Gabriel Ronacher (*)
Nos últimos anos, os eventos climáticos extremos tornaram-se uma preocupação crescente em todo o mundo, impactando significativamente o mercado de seguros.
No Brasil, essa realidade foi tragicamente evidenciada nos dias finais de abril de 2024, quando o Rio Grande do Sul enfrentou uma série de chuvas, enchentes e enxurradas que devastaram 478 dos 497 municípios do estado. Esses eventos afetaram 2,4 milhões de pessoas, resultando em mais de 4 mil desalojados, 173 mortos e 38 desaparecidos.
Esse cenário catastrófico não apenas ressaltou a vulnerabilidade das comunidades, mas também destacou a importância da prevenção e da adaptação no mercado de seguros. Neste contexto, o papel do corretor de seguros se torna ainda mais crucial, não apenas como vendedor de apólices, mas como consultor e educador, ajudando os segurados a entenderem os riscos e a se prepararem para eles.
. A função consultiva do corretor de seguros em meio à crise climática – Em países mais desenvolvidos, o corretor de seguros desempenha um papel consultivo proeminente, ouvindo as demandas dos consumidores e oferecendo seguros customizados que atendam às necessidades específicas dos clientes. No Brasil, essa prática está em desenvolvimento e vem ganhando visibilidade.
O corretor brasileiro entende criticamente os produtos disponíveis e as necessidades dos clientes, educando-os sobre os riscos e as coberturas adequadas. Além disso, o corretor constrói uma relação de confiança e um relacionamento de longo prazo com os clientes, o que o torna um conselheiro insubstituível.
Essa confiança e relacionamento permitem que o corretor eduque e recomende as melhores soluções ao cliente final, algo difícil de ser replicado por tecnologias como a inteligência artificial. Eventos climáticos extremos, como os que ocorreram no Rio Grande do Sul, tornam evidente a necessidade de seguros personalizados que se adaptem às condições climáticas em constante mudança de cada região.
As demandas por seguros residenciais no país ainda são muito baixas em relação aos automóveis. Pouco mais de 18% das residências são seguradas, comparado a quase 93% nos Estados Unidos. Na região Sul do país, por exemplo, que possui a maior taxa de seguros residenciais, menos de 30% das casas são protegidas. Apesar de uma residência valer mais que um carro, o seguro residencial é muito mais barato para esta modalidade.
O seguro para uma casa, por exemplo, custa entre 0,1% a 0,5% do valor total do imóvel. Já o seguro para um automóvel é, em média, de 4 a 6% do valor total do automóvel. Mas por que é comum contratar um seguro para um carro do que para uma casa? A falta de conhecimento é um dos fatores. É comum pensarmos que se uma casa vale mais, a cobertura para ela também será mais cara.
Apesar disso, o mercado de seguros brasileiro tem um objetivo ambicioso de aumentar sua representatividade no PIB dos atuais 6% para 10% até 2030. Para alcançar essa meta, é essencial que as seguradoras criem produtos acessíveis e que os corretores desempenhem um papel ativo em educar os consumidores sobre a importância do seguro residencial, especialmente em áreas propensas a desastres naturais.
. Tecnologia como aliada – A tecnologia pode ser uma grande aliada dos corretores, ajudando-os a gerenciar seus portfólios de maneira mais eficiente e permitindo que eles dediquem mais tempo ao atendimento e à orientação dos clientes.
O uso da tecnologia no mercado de seguros não apenas agiliza processos, mas também melhora a precisão das cotações e a adequação dos produtos oferecidos aos clientes. Isso é crucial para enfrentar os desafios impostos pelas mudanças climáticas, que demandam soluções cada vez mais específicas e customizadas.
Além disso, uma das funções mais importantes do corretor de seguros é educar o cliente sobre os riscos e as coberturas necessárias. No contexto das mudanças climáticas, isso significa entender os padrões do clima que cada região está propícia a ter, visando informar e conscientizar o segurado sobre o conjunto de riscos que são cobertos na apólice.
O corretor deve ser capaz de traduzir termos técnicos e explicar de forma clara e acessível as vantagens de determinados tipos de cobertura. Essa habilidade de comunicação é fundamental para construir uma relação de confiança com o cliente, que muitas vezes pode se sentir intimidado ou confuso com a linguagem do mercado de seguros.
As seguradoras também precisam se adaptar às novas realidades climáticas, criando produtos que sejam mais acessíveis e relevantes para os consumidores brasileiros. Isso inclui a oferta de seguros que cubram uma ampla gama de eventos climáticos e que sejam flexíveis o suficiente para se ajustarem às necessidades específicas de cada cliente.
Inovações como seguros paramétricos, que pagam automaticamente ao segurado quando determinados parâmetros climáticos são atingidos, podem ser uma solução eficaz para lidar com desastres naturais. Além disso, programas de incentivos para que os segurados adotem medidas de prevenção, como reforçar a estrutura de suas casas ou instalar sistemas de drenagem eficientes, podem reduzir significativamente os danos causados por eventos climáticos extremos.
No Brasil, a cultura do seguro ainda é bastante incipiente se comparada a países desenvolvidos. Isso se reflete na baixa penetração de seguros residenciais e na falta de conscientização sobre a importância de estar protegido contra desastres naturais. A desigualdade social e a falta de recursos financeiros também são barreiras significativas que dificultam a expansão do mercado de seguros.
O recente desastre no Rio Grande do Sul serve como um lembrete doloroso da importância da prevenção e da adaptação. Para mudar essa realidade, é necessário um esforço conjunto de seguradoras, corretores e do próprio governo, promovendo campanhas de conscientização e educação sobre os benefícios do seguro e criando políticas públicas que incentivem a contratação de seguros.
(*) – É empreendedor e sócio gestor do fundo Arco Capital e CEO da Agger (https://www.agger.com.br/).