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Por que tokenizar ativos está em alta? É possível emitir um token para qualquer ativo?

em Destaques
segunda-feira, 24 de julho de 2023

Rodrigo Pimenta (*)

A tokenização tem o poder de revolucionar o cenário financeiro, mudando intrinsecamente a forma como os investimentos são gerenciados, usados e monetizados. O processo de tokenização facilita a criação de uma infinidade de novos produtos financeiros, permitindo que cada pessoa e organização no mundo diversifique seu portfólio de investimentos em escala global, independentemente de renda ou tamanho.

O processo de tokenização começou a ganhar popularidade com o surgimento das criptomoedas e da tecnologia blockchain, especialmente após o lançamento do Bitcoin em 2009. No entanto, a tokenização realmente começou a estar em alta por volta de 2015-2017, desde o padrão ERC-20 (“Ethereum Request for Comments nº 20”), quando as ofertas iniciais de moedas (“ICOs”) – uma espécie de Oferta Pública de Capital “IPOs” em bolsa de valores – , se tornaram uma forma popular de financiamento para projetos baseados em blockchain. Durante esse período, muitas empresas e projetos começaram a criar e emitir seus próprios tokens para levantar capital e facilitar transações dentro de suas plataformas. Desde então, a tokenização tem sido cada vez mais adotada em diversos setores, incluindo finanças, imóveis e arte.

A tokenização de ativos envolve o processo de representação digital de ativos físicos reais em livros contábeis distribuídos ou a emissão de classes de ativos tradicionais em formato de quantidades menores (“ou tokenizado”). Dentro do contexto da tecnologia blockchain, a tokenização é o processo de converter algo de valor em um token digital utilizável em um aplicativo blockchain e um token representa uma parte bem menor, e acessível, da propriedade no ativo subjacente. Esse processo pode funcionar para ativos tangíveis como ouro, imóveis, dívidas, títulos e arte, ou certas formas de ativos intangíveis, como direitos de propriedade ou licenciamento de conteúdo. O que é ainda mais empolgante é que a tokenização permite transformar propriedades que tradicionalmente são ativos indivisíveis em um ativo divisível através do fracionamento em forma de tokens.

Somente 30 segundos, são suficientes para a emissão de um token na blockchain. Onde é possível emitir um token para qualquer ativo ou para qualquer qualquer fim, mas vendê-lo oficialmente, sem embaraços, é uma outra história, pois deve estar em conformidade com as leis e regulamentações aplicáveis. Os tokens podem representar ativos tangíveis, como imóveis e ouro, ou ativos intangíveis, como ações de empresas e direitos autorais. No entanto, a tokenização de ativos pode ser complexa e envolver questões legais, técnicas e de conformidade. A questão está na permissão de oferecimento dos tokens ao público. Por exemplo, no Brasil, a CVM legisla sobre bens mobiliários e restringiu a venda dos tokens enquadrados como “renda fixa” em Abril/2023 – conforme orientação CVM 40 – assim como a SEC, equivalente à CVM nos EUA, também possui suas proibições e restrições. Por isso é importante consultar especialistas antes de prosseguir com a emissão de tokens para um ativo específico.

Com a tokenização, as transações de ativos digitalmente nativos são armazenadas e listadas em um livro-razão digital em uma rede blockchain, fornecendo um padrão ouro de veracidade em todo o mundo. Também, o processo de alavancar contratos inteligentes registra permanentemente as transações e as torna imutáveis e executadas instantaneamente. Isso não apenas fornece velocidade às transações, mas também reduz o trabalho administrativo, pois há menos intermediários, reduzindo os custos.

O procedimento de emissão de um token é feito com um código de programação no padrão ERC-20 que possui o nome do token, a quantidade máxima inicial, a unidade de medida e a quantidade de decimais e é traduzido para uma linguagem específica, chamada “código compilado”. Este código é então enviado para rede de blockchain compatível num processo chamado de “deploy”. Após o deploy, é criado o “Smart Contract” (“Contrato Inteligente”) que terá a lógica e o comportamento do código ERC-20 e com isso o token nasce na rede blockchain desejada.

Seguindo o padrão ERC-20, os token são registrados inicialmente numa carteira específica em toda sua totalidade ou são transferidos a medida em que sejam emitidos e “mintados” (Mynt), ou seja, no “Contrato Inteligente” existe um recurso de emissão sob demanda, o que é muito bem visto no caso de stablecoins USDT, EURT, BRLT, que só são emitidas caso o lastro de garantia exista inicialmente no mundo físico real (em conta bancária).

O Parecer de Orientação da CVM nº 40 (de Outubro/2022), ilustra mais especificamente que existem 3 opções de categorias de tokens: (1) Token de Pagamento (cryptocurrency ou payment token), (2) Token de Utilidade (utility token), (3) Token referenciado a Ativo (asset-backed token) que são subdividido em 4 tipos: (3.1) “security tokens”, (3.2) “stablecoins”, (3.3) “NFTs” (non-fungible tokens) e (3.4) os demais ativos objeto de operações de tokenização. No item 3.4 temos ainda o Ofício-Circular nº 4 (Abril/2023), que faz a caracterização dos “tokens de recebíveis” ou “tokens de renda fixa” (em conjunto como “TRs”) como valores mobiliários, portanto regulamentando e restringindo ainda mais oportunidades da emissão e gestão deste tipo de ativo somente para algumas instituições autorizadas.

Após a suspensão das emissões de Tokens de Recebíveis/Renda Fixa pela plataformas tokenizadoras, foi solicitada em uma reunião representada pela ABCripto uma possibilidade de flexibilização pela CVM com três propostas: não considerar tokens de recebíveis como “valores mobiliários”, a aplicação de somente de algumas regras da Resolução 88 da CVM em relação ao “crowdfunding” e a elaboração de um modelo de licenciamento que foca em tokenização. Estes pedidos foram baseados no fato de que o próprio modelo de tecnologia blockchain e seus protocolos seja por L2 ou L3 (Camada2 ou Camada3), são capazes de provar o “depósito centralizado” e de “escrituração”, no caso da securitização de recebíveis, assim como layers de privacidade (por exemplo, a tecnologia “Tessera” no blockchain Hyperledger BESU – o mesmo blockchain escolhido pelo Banco Central do Brasil, BACEN, para emissão do Central Bank Digital Currency (“CBDC”), o real digital brasileiro, previsto para o final de 2024. Isto torna o ecossistema mais “coerente”, “seguro”, “componentizado”, “com privacidade”, na medida em que o amadurecimento da regulamentação BACEN e CVM em relação a criptoativos e a tokenização de ativos evolui.

Embora a tokenização ofereça uma infinidade de possibilidades, ainda há muito trabalho a ser feito em termos de regulamentação global consistente e desenvolvimento de soluções de nível de produção necessárias para ampliar a adoção. À medida que o investimento em tecnologias de tokenização continua a aumentar e os benefícios de novos ativos se tornam mais evidentes, as instituições financeiras devem começar a pensar em qual infraestrutura é necessária para dar suporte à tokenização, por exemplo, onboarding, gerenciamento e integração com sistemas legados, a fim de fazer parte do setor financeiro do futuro.

Apesar dos desafios regulatórios que envolvem a utilização dos tokens, podemos dizer que a tokenização de ativos está em alta porque oferece uma forma de investimento mais acessível e democrática para os casos em que os órgãos reguladores autorizam. Com a tokenização, ativos que antes só estavam disponíveis para grandes investidores institucionais, agora podem ser fracionados em pequenas partes e vendidos como tokens para investidores individuais. Além disso, a tokenização também permite uma maior liquidez aos tokens que puderem ser negociados em plataformas de criptomoedas a qualquer momento, sem a necessidade de intermediários. Outro fator que contribui para a popularidade da tokenização é a segurança oferecida pela tecnologia blockchain, que garante a autenticidade e rastreabilidade dos ativos tokenizados. E você, está pronto para fazer parte deste novo universo de tokenização? Afinal de contas, serão cerca USD 16 Tri em jogo até 2030, conforme a Boston Consulting Group.

Rodrigo Pimenta é engenheiro elétrico formado pela Poli-USP, MBA em Economia, Finanças e Operações na FGV-SP, palestrante TEDx Speaker sobre “blockchain” e autor de publicação de Inteligência Artificial e Algoritmos Genéticos. Conta com experiência de 14 anos Banco Itaú, onde atuou como um dos primeiros Arquitetos de TI Corporativo e, atualmente, é CEO e fundador da Hubchain Tecnologia, cujo trabalho pioneiro dedica-se a oferecer soluções inovadoras em “blockchain”, inteligência artificial, e-wallets digitais, exchanges as services, Gateway de Pagamentos, plataformas de negociação de ações e de criptoativos, emissão de tokens, NTFs e outros Smart Contracts, além de softwares e hardwares para IoT/IoM, integrado com tecnologias “blockchain. Rodrigo participou de algumas grandes discussões, elaboração de projetos de leis sobre criptoativos para alguns países sobre ecossistemas em “blockchain” e é considerado um dos maiores especialistas técnicos do segmento.

(*) É CEO e fundador da Hubchain Technologies.