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O Real pode mesmo ser digital?

em Destaques
domingo, 04 de junho de 2023

Orli Machado (*)

A moeda de um país é o principal mecanismo de compras da sociedade, é a partir dela também que a força de uma nação é parametrizada: uma moeda forte representa uma nação mais equilibrada e economicamente estável; já uma moeda fraca, pode representar menor consumo da sociedade, inflação alta e, consequentemente, um país fragilizado, que apresenta dificuldades nas questões socioeconômicas.

Como exemplo de moeda forte, podemos citar o Dólar, Euro ou Libra, países ou blocos econômicos, que possuem tendência de ser líderes globais em diversas questões. Por outro lado, atualmente, a Argentina, com alta inflação e instabilidade financeira, vê a moeda do país, o Peso, perder valor em meio a um cenário econômico complexo.

O Brasil, que é um dos países com maior potencial econômico do mundo, mesmo com a grande flutuação do Real em relação às moedas mais fortes nos últimos anos, iniciou recentemente o processo de bancarização da população brasileira e a digitalização de sistemas financeiros no país, o que provavelmente trará ainda mais tecnologia para as transações realizadas no país.

Segundo dados do Banco Central, pouco antes da pandemia, em 2019, o Brasil possuía 165,6 milhões de pessoas bancarizadas. Hoje, são mais de 188,3 milhões, representando um crescimento de quase 14%. Estima-se que o país possua apenas 16% da população adulta fora do sistema financeiro.

O Real Digital é uma iniciativa que vai de encontro com a total digitalização prevista por Roberto Campos Neto, presidente do BC, e chega para modernizar o sistema financeiro e consolidar a digitalização da economia brasileira. Open Finance e PIX foram os precursores para a digitalização e abriram caminho para o Real Digital, que terá uma vertente diferente de tudo que existe no mercado atual.

O Real Digital será nada mais que uma versão virtual da moeda física, como conhecemos hoje, com a mesma conversão e valor. Ele poderá ser utilizado para realizar transações comerciais, pagamentos, transferências e remessas, entre outras operações financeiras. A moeda digital terá paridade e será linear com o Real – um para um; podendo seu usuário decidir por qual moeda ele deseja transacionar.

A ideia, assim, é criar uma forma de pagamento eletrônico, mais segura e eficiente, que possa ser utilizada por qualquer pessoa ou empresa que tenha acesso à internet. A expectativa é que sua circulação seja garantida pela autoridade monetária brasileira, como acontece com a moeda física atualmente. Além disso, especula-se que o Real Digital possa ser integrado a uma plataforma de blockchain, o que permitiria maior rastreabilidade e segurança nas transações realizadas utilizando a moeda digital.

Diferentemente do Bitcoin, que são moedas digitais descentralizadas e funcionam em uma rede blockchain pública, o Real Digital deverá ter o controle e regulamentação de uma rede comandada pelo próprio Banco Central.

Qual será o impacto do Real Digital na sociedade brasileira? – Tradicionalmente, a sociedade brasileira esteve muito conectada com “pagamentos físicos”. Dinheiro em espécie, cartões de crédito e de débito sempre fizeram parte das compras e do dia a dia do cidadão no país, mas o movimento de digitalização que atingiu o mundo como um todo tem mudado não somente o modo como o brasileiro consome, mas também como paga suas contas e realiza suas atividades financeiras.

De acordo com dados da Febraban, sete em cada 10 operações bancárias realizadas no país em 2021 foram feitas por meio do celular ou internet. A digitalização do brasileiro pode ser um aliado para o Real Digital que, ainda em fase de testes, demonstra potencial para dar continuidade ao desenvolvimento do cidadão dentro de um ambiente que cada vez mais é parte essencial da sociedade.

A chegada do Real Digital pode trazer inúmeros benefícios para a sociedade brasileira, segundo o Banco Central, entre eles:

  • Redução do uso do dinheiro em papel: ainda de acordo com o Banco Central, o dinheiro em papel representa 3% do montante disponível para operações no Brasil. A chegada do Real Digital poderia concentrar as operações no mesmo, diminuindo a necessidade da emissão de cédulas e moedas;
  • Inibição de crimes: crimes conhecidos no país, como lavagem de dinheiro podem ser diminuídos com a presença do Real Digital, pois ele elimina a necessidade da conversão monetária, podendo ser utilizado em qualquer lugar do mundo;
  • Estímulo à concorrência no ambiente digital: de acordo com um levantamento do Banco de Compensações Internacionais (BIS), mais de 80% dos bancos centrais do mundo estão desenvolvendo moedas digitais. Além disso, potências estabelecidas no cenário mundial, como China, Estados Unidos e Japão já possuem moedas digitais.

Apenas o futuro irá validar as projeções do BC para o Real Digital e para o papel do cidadão brasileiro dentro deste sistema, mas as expectativas se tornam positivas ao observar o recente crescimento do uso de aplicativos bancários, a ascensão meteórica do Pix, e da própria conscientização do cidadão quanto à modernização dos processos.

(*) – É CEO da C&M Software (https://br.cmsw.com/).