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Modelo clube-empresa pode ser solução no Brasil?

em Destaques
terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

Renan Tanandone/ANSA

A Câmara dos Deputados aprovou em 2019 um projeto que permite aos clubes brasileiros de futebol se tornarem empresas, modelo já difundido na Europa. Mas a experiência de outros países, como a Itália, mostra que nem sempre essa é a solução para problemas de gestão. Os times brasileiros, que em sua grande parte são entidades sem fins lucrativos, se transformariam em sociedades anônimas ou limitadas e poderiam fazer fusões, cisões ou incorporações, buscando atrair mais investimentos.

Mas nenhum clube seria obrigado a aderir ao modelo, que se tornaria mais uma alternativa à disposição. “O projeto define um regime tributário especial que permite aos clubes que decidirem se transformar em empresas recolher menos impostos que uma empresa comum, mas apenas pouco acima das associações [sem fins lucrativos]. Este é o grande motivo para que haja uma lei, já que atualmente qualquer clube pode ser empresa. Mas o projeto inclui alguns incentivos às associações que quiserem se transformar, como facilidade de pedir recuperação judicial e mudanças nas relações trabalhistas, por exemplo”, disse o economista Cesar Grafietti.

Segundo o especialista, o time que virar empresa ficaria “independente do clube social, permitindo gestão mais eficiente”. Além disso, ficaria apta a receber aportes de capital, ganhando “capacidade de pagar as dívidas e aumentar o nível de investimento”. No Brasil, algumas equipes já adotaram o modelo clube-empresa, como Botafogo de Ribeirão Preto, Resende (RJ) e Grêmio Osasco Audax. No entanto o caso mais conhecido é o do Red Bull Bragantino, formado quando a fabricante de energéticos comprou o tradicional time de Bragança Paulista para facilitar seu acesso à primeira divisão do futebol brasileiro – a Red Bull também é dona do RB Leipzig, da Alemanha, e do RB Salzburg, da Áustria.

“Entre os clubes que adotam esse modelo de negócio atualmente no Brasil, podemos destacar o RB Bragantino, que faz parte do conglomerado austríaco, uma holding de clubes de futebol, com representantes em Alemanha, Áustria, Brasil e EUA. A partir deste ano, o clube entra na elite do futebol nacional e já começou a executar sua estratégia, investindo em jovens jogadores com potencial de venda”, explicou Renato Bragagnollo, especialista em gestão esportiva.

Na Itália, uma das grandes escolas do futebol mundial, o modelo clube-empresa é dominante na elite. Os principais times do país têm proprietários, e alguns deles, como a Juventus, são até cotados na Bolsa de Valores. Controlada pela família Agnelli, dona da Fiat Chrysler Automobiles (FCA) e da Ferrari, a Velha Senhora virou um caso de sucesso no futebol internacional, com uma gestão eficiente que ajudou a consolidar sua hegemonia na Itália.

Mas nem todos seguiram pelo mesmo caminho. O Milan, que durante mais de 30 anos pertenceu a Silvio Berlusconi, passou recentemente pelas mãos do empresário chinês Li Yonghong e hoje é comandado pelo fundo americano Elliott, mas o clube permanece estagnado. Já a rival Inter é controlada por Steven Zhang, herdeiro do grupo chinês Suning, após uma breve gestão do indonésio Erick Thohir, que encerrou a era Moratti na equipe nerazzurra, porém apenas nesta temporada voltou a desafiar a Juventus em campo.

O Napoli, por exemplo, pertence ao produtor de cinema Aurelio De Laurentiis, enquanto as rivais Roma e Lazio são dos empresários James Pallotta e Claudio Lotito, respectivamente. Nos últimos anos, no entanto, diversos times italianos tradicionais declararam falência por causa de dívidas contraídas em gestões empresariais, como Fiorentina, Parma e Napoli, e seus retornos à elite sempre passaram por uma troca de proprietário. Outras equipes, como Modena e Cesena, também quebraram, mas não conseguiram retornar ao mesmo patamar.

Grafietti disse que, para não repetir os maus exemplos de times italianos, os clubes do Brasil precisam ter uma “gestão eficiente dentro e fora de campo, a partir de controle de custos que possibilite pagamentos em dia e dentro das possibilidades das receitas”. No Brasil, um exemplo de que a gestão empresarial não resolve todos os problemas é o Figueirense, que chegou a dar W.O. em agosto, pela falta de pagamento dos salários. A partida era contra o Cuiabá, na Arena Pantanal, válida pela 17ª rodada da Série B do Campeonato Brasileiro.

“Normalmente, os clubes vão à falência quando a lei não os protege, ou seja, ou pagam as dívidas ou acabam. No caso brasileiro, vários clubes estão endividados há muito tempo, mas sempre tiveram essa bondade das leis e da justiça, de protelar dívidas, de renegociar e adiar a solução do problema. Na Europa, existem normas mais rígidas, como o fair play financeiro, que prevê várias sanções imediatas para clubes endividados. É uma forma de obrigar a melhorar a gestão. Quem não se encaixa nessas normas sofre as punições”, disse o mestre em gestão do esporte Luiz Antonio Ramos.

Já o deputado federal Pedro Paulo Carvalho (DEM-RJ), relator do projeto clube-empresa, disse que a iniciativa possibilita que os clubes tenham “segurança jurídica” e “acesso ao mercado para atrair investimentos, bem como a chance de quitar as dívidas”. Aprovado pela Câmara em novembro, o projeto precisa agora da aprovação do Senado. Até o momento, a votação não tem uma data marcada, mas deve ocorrer ainda em 2020.