Diego Senise (*)
O mercado brasileiro está enfrentando uma das piores crises da história. Diante desse desfio, as empresas são obrigadas a se reinventar e buscar alternativas para sobreviver. É nesse momento, em que os consumidores não saem de casa, que estratégias de vendas mais eficientes assumem um papel importante. O chamado Direct to Consumer (DTC) é o modelo de negócio adotado por empresas inovadoras para vender seus produtos e serviços diretamente aos consumidores finais, sem intermediários: lojas, vendedores/consultores ou terceiros.
Apesar de ser uma tendência relativamente antiga, é recente o movimento de grandes marcas nesse sentido. Existem modelos pioneiros no mercado, como o da Dell, que em 1994 decidiu implementar vendas online customizadas, focando no relacionamento direto com o cliente. A estratégia resultou à Dell uma taxa de 49% de crescimento anual em vendas e 62% em lucro1. Hoje, muitas empresas digitais já nascem com esse mindset, como a de vestuário Amaro, marca digital que eliminou os intermediários em toda sua cadeia, do design à entrega.
Na prática, para a maioria dos negócios, o benefício do modelo Direct to Consumer é a construção de uma fonte diversificada de faturamento, o que soa inicialmente como uma receita incremental. Isso porque, até o novo coronavírus chegar ao Brasil, a maior parte dos resultados era gerada pelo ponto de venda. No varejo, por exemplo, esse número pode representar 90%. Uma pesquisa realizada pela Boa Vista, com 350 empresas de todo o país, entre janeiro e fevereiro deste ano, constatou que em 42% delas o comércio online ainda representa até 10% do faturamento total.
O atual momento desafiador evidencia mais claramente as vantagens competitivas das companhias que estão mais evoluídas nessa frente. Quem se preparou antes tem mais capacidade de diminuir o impacto no faturamento ou, até mesmo, de crescer, dependendo de seu segmento de atuação. Agora, é uma forma de respiro para o mercado. Mas, a longo prazo, é uma alternativa capaz de aumentar a margem de lucro das empresas.
O modelo DTC deve ser visto também como uma oportunidade de fortalecimento de branding, já que as empresas passam a estabelecer um relacionamento direto com o consumidor e a agregar mais valor às suas marcas. Outros benefícios são a maior taxa de recorrência de compra e retenção. Companhias tradicionais já vêm se estruturando nesse sentido, ainda que em diferentes estágios.
A Nike é um bom exemplo com seu Nike Plus, canal de venda direta, serviço e relacionamento com o consumidor; a Ambev atua desde 2016 com o serviço de entrega de bebidas Zé Delivery; a Unilever, adquiriu no mesmo ano o Dollar Shave Club – clube de assinaturas focado em lâminas de barbear – em um investimento de US$ 1 bilhão.
É um mercado promissor, o Brasil ocupa a 6ª posição global e a 2ª nas Américas, com 5% de participação nas vendas diretas de todo o mundo, segundo a Associação Brasileira de Venda Direta. Os últimos dados mostram que, em 2019, o volume de negócios gerado foi de R$ 45 bilhões. Mas para entrar nesse jogo é inevitável uma gestão data-driven. Negócios que já possuem uma maturidade nesse sentido são os que tratam os dados como ativos.
Com uma boa estratégia de dados, essas empresas têm a capacidade de acionar rapidamente informações específicas para manter a relação direta com seus consumidores, independente do contexto e do seu tamanho. O modelo DTC é mais do que uma simples prateleira digital como qualquer e-commerce. Ele envolve um relacionamento proativo e ágil com o consumidor, com a captura de dados próprios sobre seu perfil, hábitos, preferências e feedbacks, gerando decisões mais assertivas que vão desde price point até inovação.
O mercado está começando a entender que os dados não são apenas um jeito de otimizar resultados das operações atuais, mas sim um investimento de longo prazo que marca uma nova forma de pensar. Os poucos que embarcaram antes nessa tendência e criaram estratégias de dados em DTC aproveitarão esse momento de baixa nos pontos de venda físicos. A maioria que viu a tendência, mas deixou arquivada em algum Power Point, colocará o assunto como prioridade no planejamento de estratégia 2021.
(*) – É head de Data Tech e co-fundador da Ilumeo Data Science (https://ilumeo.com.br).