Paulo Gomes (*)
Um recado a fraudadores e pessoas mal-intencionadas diante da nova rotina de home office: saibam que a auditoria interna continua atenta, trabalhando remotamente, com respaldo de recursos tecnológicos avançados como big data e inteligência artificial, utilizados para manter a integridade da governança corporativa das empresas.
Em momentos de crise aguda, como as restrições e confinamentos impostos diante da pandemia do Corona Vírus, em que as pessoas estão mais fragilizadas e tentando se adaptar à nova rotina temporária de trabalho em casa, costumam surgir aproveitadores e oportunistas prontos a cometerem fraudes ou atitudes ilícitas contra companhias dos mais diversos setores.
É fácil pressupor que nesse cenário atípico a auditoria abrirá a guarda. Doce engano. O auditor pode e deve ter acesso a qualquer equipamento que pertença a empresa, podendo acessar, por exemplo, um notebook de um funcionário remotamente.
As normas internas, principalmente das grandes empresas, devem prever esse tipo de verificação, mas é preciso deixar claro, que essa intervenção ou inspeção, deve ser realizada somente em caso de necessidade e no momento em que o auditor estiver executando um trabalho de auditoria oficial. Os gestores da empresa também devem ser comunicados, caso haja a necessidade de uma ação dessas.
Evidente que há desafios relevantes causados pela falta da presença física de um profissional de auditoria dentro da organização em que atua. Faz parte da rotina diária de um auditor interno acompanhar de perto áreas como expedição, produção, logística, contratação de materiais e serviços e até de visitas externas em fornecedores, parceiros e clientes. O auditor é, hoje, considerado pelo mercado corporativo como um agente fundamental da boa governança – um profissional dotado de visão holística sobre toda a estrutura da empresa.
Porém, graças a tecnologia muitas dessas limitações do confinamento podem ser minimizadas ou até mesmo mitigadas com o uso de recursos e de análises disponíveis nos bancos de dados das empresas. Os chamados programas ‘Analytics’ usados nas principais auditorias internas, tem revolucionado a profissão. Com o apoio do uso de Inteligência Artificial, as avaliações contábeis e financeiras sobre a ‘saúde estrutural’ da empresa, são, hoje em dia, feitas em poucas horas e de qualquer parte do mundo. Antes, exigia-se um número bem mais elevado de profissionais e semanas de trabalhos.
O que antes era visto apenas como uma habilidade de um hacker, hoje é corriqueiro entrar no notebook de um colaborador, seja para consertar algum problema técnico ou para avaliar arquivos que foram extraídos ou não do banco de dados da empresa.
Em 1989, quando atuava como auditor no setor elétrico, cheguei a participar de um protótipo de auditoria a distância, via acesso discado, no chamado ‘sistema telefônico microondas’. Tratava-se de uma tecnologia de transporte de dados através de cabos de fibra ótica, instalados em torres de transmissão de energia elétrica. Há mais de 30 anos, os resultados já eram surpreendentes. Hoje, as conquistas são quase surreais.
Com uma suspeita de fraudes no radar, em consenso com a alta administração da empresa, o auditor interno poderá entrar nos notebooks corporativos e vasculhar qualquer dado que ele julgue relevante para o processo de investigação em curso. Muitas vezes, é necessário entrar na máquina de um colaborador que não está envolvido na possível fraude, a fim de levantar provas ou evidências que exponha o verdadeiro fraudador.
Além do trabalho investigativo, o auditor interno pode, remotamente, realizar diversas ações que o colocam como um profissional de importância fundamental na gestão de riscos e na governança corporativa. Pode, por exemplo, cruzar os dados acessados, identificando divergências e solicitando explicações e evidências eletrônicas. Algumas poucas pendências que exijam verificação física, também poderão ser enviadas por foto ou vídeo.
Em alguns casos de extrema urgência, o auditor interno, pode, inclusive, pedir à direção que corte o acesso do funcionário investigado ao banco de dados da empresa, se as evidências apontarem para reais ameaças. Caberá, posteriormente, as devidas ações administrativas e até judiciárias, se a situação assim exigir.
Ser o guardião da ética e da boa conduta nesse momento de isolamento social é papel relevante do auditor interno. Porém, cabe a ele também ser um agente capaz de identificar oportunidades de redução de despesas e sugerir novas fontes de receitas, por meio de soluções criativas, rápidas e eficazes, que contribuam com a diminuição das perdas e danos que a pandemia invariavelmente causará. Em um momento de incertezas e riscos, a atuação do auditor poderá ser um bálsamo em dias desafiadores.
(*) – É diretor-geral do Instituto dos Auditores Internos do Brasil – IIA Brasil ([email protected]).