André Dratovsky (*)
O Brasil, uma nação marcada por desafios socioeconômicos complexos e por baixa escolaridade, necessita constantemente buscar soluções inovadoras para impulsionar o desenvolvimento e a equidade. Nesse contexto, o recente programa de governo “Juros por Educação” emerge como uma promessa de transformação no cenário da formação profissional, especialmente no que tange à qualificação da mão de obra.
O cerne do programa reside na ideia de reduzir o custo de rolagem das dívidas dos Estados junto ao Governo Federal, a partir da redução das taxas de juros vigentes, tendo como contrapartida, que os Estados invistam os valores economizados na ampliação de matrículas. Em caso de cumprimento das metas do programa a redução da taxa de juros torna-se permanente.
A expectativa é que mais jovens tenham acesso à formação profissional, mais oportunidades de trabalho e renda. Em teoria, essa abordagem representa um avanço significativo, incentivando os jovens a investirem em sua educação continuada e adquirirem habilidades relevantes para o mercado de trabalho atual e futuro. É uma estratégia para atender a um pleito de redução de custos financeiros, e por outro lado, fomenta o ensino técnico/profissionalizante, visando aproximar o Brasil das metas e padrões da OCDE – Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico.
Atualmente, a Alemanha desponta como um país modelo e exemplar no uso do ensino técnico com sucesso na base para o desenvolvimento econômico. O Brasil, por sua vez, figura atrás de países como Colômbia e Chile. Ao incentivar investimentos públicos estaduais, o programa promove e alinha os interesses individuais de jovens – especialmente de média e baixa renda – com as necessidades do mercado, criando um ciclo virtuoso de desenvolvimento pessoal e econômico.
Afinal, uma mão de obra qualificada não apenas impulsiona a produtividade e a inovação, mas também abre portas para oportunidades de ascensão social e redução das desigualdades. Segundo dados do próprio Governo Federal, em 2024, a União prevê um total de pagamentos de prestações da ordem de R$ 39 bilhões, dos quais R$ 23 bilhões são referentes a juros. O saldo da dívida alcança o montante de R$ 740 bilhões, sendo que 4 Estados (SP, RJ, RS e MG) respondem por R$ 660 bilhões (90% do estoque).
Já dados do Censo da Educação de 2023 mostraram que, embora tenhamos 7,7 milhões de matrículas no Ensino Médio (85% de responsabilidade dos Estados), apenas 1.1 milhão estão integradas à formação profissional e somente 20% são de tempo integral. O ensino para jovens e adultos (EJA) médio com formação técnica possui apenas 40 mil matrículas no Brasil.
Mesmo diante de potenciais vantagens, é necessário encarar algumas questões críticas e desafios que podem comprometer a eficácia e o sucesso do programa. Primeiramente, a acessibilidade e a qualidade dos cursos oferecidos devem ser cuidadosamente monitoradas para garantir que atendam às necessidades do mercado, evitando a proliferação de programas de baixa qualidade, cujos resultados de aprendizagem são jamais mensuráveis e que apenas perpetuam a desigualdade educacional.
Além disso, é fundamental considerar a diversidade de realidades regionais e socioeconômicas do Brasil. Enquanto áreas urbanas podem se beneficiar plenamente das oportunidades oferecidas pelo programa, regiões remotas e economicamente desfavorecidas podem enfrentar obstáculos adicionais, como a falta de infraestrutura adequada e acesso limitado à internet, o que pode minar os esforços de inclusão e equalização de oportunidades.
Uma provocação que surge é: estaremos realmente preparados para garantir que, além de acessíveis de forma equitativa, os programas educacionais entregarão resultados de aprendizagem válidos ao universo empregador? Ou corremos o risco de além de desperdiçar uma oportunidade e o escasso recurso financeiro, criando uma aproximação fantasiosa entre aqueles que têm acesso às oportunidades educacionais de qualidade e os que são abandonados?
Apesar dos desafios, é inegável que o programa “Juros por Educação” representa um passo corajoso na direção certa. Se implementado com sucesso e acompanhado de políticas complementares que abordam as lacunas identificadas, poderia desempenhar um papel catalisador na construção de uma força de trabalho mais qualificada e, por extensão, em um Brasil mais próspero e justo.
No entanto, apenas o tempo dirá se as promessas serão totalmente realizadas ou se este programa se tornará mais uma iniciativa bem-intencionada perdida nas complexidades da realidade brasileira.
(*) – É fundador e CEO da Elleve, ed-fintech voltada para o financiamento profissional e impulsionamento de carreiras (https://elleve.com.br).