Fabio Arruda Mortara (*)
Fica muito claro, como temos sustentado há anos, que existem espaços para todas as mídias.
A informação, baseada em dados de 1.200 editoras dos Estados Unidos, de que as vendas de livros eletrônicos caíram 10% no país nos cinco primeiros meses deste ano, confirma o resultado de pesquisas internacionais e do Brasil quanto ao gosto das pessoas pelas edições convencionais. Reforça, também, a tese sustentada pelas entidades representativas da indústria gráfica brasileira, desde o advento da internet e, depois, do e-book, de que as novas mídias não representavam risco de extinção da comunicação impressa, como se profetizou de modo amplo.
Em 2014, a participação dos livros eletrônicos no mercado norte-americano, repetindo o ocorrido em anos anteriores, foi de 20%. De maneira paulatina, tudo tende ao equilíbrio, passada a euforia inicial com o lançamento dos e-readers. Fica muito claro, como temos sustentado há anos, que existem espaços para todas as mídias. Nesse sentido, vale a pena lembrar os resultados de pesquisa do Instituto DataFolha, realizada em 2014 para a Campanha Two Sides, movimento mundial de valorização dos impressos, que tem no Brasil a participação de 42 entidades de classe.
No País, segundo o DataFolha, 59% dos leitores de livros e 56% de revistas optam pelas edições convencionais. No caso de jornais, 48% preferem acessá-los em computadores, tablets e celulares e 46% continuam fiéis às formas tradicionais. É interessante o fato de que 80% dos entrevistados brasileiros afirmaram que ler em papel é mais agradável do que em uma tela.
Estudo da Nielsen BookScan, publicado pelo jornal britânico Financial Times, é coerente com os dados brasileiros: o número de livros impressos vendidos nos Estados Unidos em 2014 subiu 2,4%, alcançando 635 milhões de unidades. No Reino Unido, o setor encolheu 1,3%, mas a queda foi muito menor do que em 2013, quando as vendas retrocederam 6,5%.
Todas as pesquisas e, agora, a realidade do mercado demonstram que o eletrônico não mata o gráfico. Ao contrário, ambos complementam-se como canais de conhecimento, informação, cultura e entretenimento. As editoras, ao contrário de análises equivocadas da questão, perceberam isso há tempos, reposicionando-se como provedoras de conteúdos, que podem chegar aos leitores nos livros impressos ou na forma de e-books. O mais importante é que as mídias retroalimentam-se, tendendo a contribuir para o aumento do número de leitores.
Essa convergência remete a uma questão essencial no Brasil: o índice de leitura de apenas 1,2 livro por habitante/ano, conforme releva a última edição da pesquisa Retratos da Leitura. É um indicador da precariedade do ensino público e da baixa renda de parte expressiva da população. Além disso, temos 14 milhões de analfabetos absolutos e cerca de 35 milhões de analfabetos funcionais (20,3% dos habitantes/IBGE 2012). Estes, para o IBOPE (2005), são 68%.
O problema, portanto, transcende em muito à discussão sobre qual mídia prevalecerá. Precisamos, mesmo, é de boas escolas, crescimento econômico e melhor distribuição de renda, conquistas sempre adiadas pelas crises intermitentes, como a atual, e políticas públicas equivocadas. Se vencermos os problemas que emperram o desenvolvimento, com certeza haverá leitores e consumidores em profusão para conteúdos e produtos impressos e eletrônicos. Diante da grandeza do desafio, é muito pequena e inútil a discussão sobre o canibalismo das mídias.
(*) – É presidente do Sindicato das Indústrias Gráficas, coordenador do Comitê da Cadeia Produtiva do Papel, Gráfica e Embalagem da Fiesp, presidente da Confederação Latino-americana da Indústria Gráfica e country manager da Two Sides Brasil.