Sigrid Guimarães (*)
Sempre que um cliente fala em alterar sua alocação de recursos como reação a previsões sobre o comportamento da economia e dos mercados, começo por lembrá-lo do objetivo básico de qualquer investimento patrimonial: sustentar suas necessidades pessoais no curto, no médio e no longo prazo.
Assim, quando recebo clientes que cogitam transferir investimentos para o exterior, minha primeira e singela pergunta é: que despesas você pretende cobrir com essa medida? Na grande maioria das vezes, a resposta vem na forma de conjecturas sobre o panorama político e econômico, sem se ater a qualquer necessidade particular.
Explico, então, que investimentos que visam garantir a manutenção de alguém devem ser feitos na mesma moeda em que as suas contas serão pagas, de modo a evitar os riscos do descasamento.
O contra-argumento costumeiro é que dificilmente moedas como o Dólar ou o Euro perdem poder de compra em relação ao Real e, portanto, não haveria razão para temer as variações do câmbio. A princípio, parece uma colocação bastante razoável. No entanto, é preciso lembrar que, por mais forte que uma moeda seja, sua flutuação não está direta e imediatamente atrelada ao seu custo de vida em Reais, que é o que realmente importa, se é em Reais que as suas contas vencem.
O que de fato protege a capacidade do investidor de pagar as contas é a correlação entre seus rendimentos e a inflação do país onde ele vive e cuja economia está inserido. É de se esperar que a inflação e, consequentemente, os juros correntes em um país com “moeda forte” sejam, em média, inferiores aos nossos e aos da maioria dos países em desenvolvimento. Contudo, o importante mesmo é notar que, independentemente de os rendimentos serem menores ou maiores, ao investir em um país estrangeiro você se expõe à diferença entre as variações do custo de vida lá e cá, um perigo que definitivamente não se deve correr com recursos comprometidos.
Seguindo a mesma lógica elementar de casamento entre despesas e receitas, se você efetivamente tem pagamentos programados em um país estrangeiro, como manutenção de propriedades, gastos com uma longa estada no exterior ou com filhos estudando fora, convém contar com recursos na moeda daquele país em volume adequado às despesas e com rendimentos compatíveis com a inflação por lá. Sendo assim, a abertura de uma conta no exterior é uma opção, mas considere que aplicações em fundos cambiais podem ser uma solução nacional mais simples e conveniente, evitando, com o automatismo do come-cotas, a burocracia do recolhimento de impostos (não o pagamento).
Uma segunda situação em que a destinação de uma parcela da carteira patrimonial para investimentos no exterior seria recomendável se dá quando se dispõe de um montante financeiro suficiente para arcar com sua aposentadoria e seu custo de vida no Brasil. A partir desse momento, o excedente pode e deve ser diversificado em diferentes moedas e fronteiras, já que o risco cambial aqui não mais afeta sua renda previdenciária.
Em boa parte, a atração por contas no exterior parece um anacronismo, um fetiche remanescente de um tempo em que investir fora era privilégio de super-ricos. Nesse passado já razoavelmente distante, vivíamos em uma economia fechada a sete chaves, na qual a simples compra de moedas estrangeiras era proibida por lei e os instrumentos de acesso aos mercados internacionais eram praticamente inexistentes. Tão pouco existiam as tecnologias atuais que permitem aplicações imediatas em mercados externos a partir do Brasil. Hoje, no entanto, qualquer investidor nacional dispõe de instrumentos para isso, tanto para fazer frente a despesas no exterior quanto para diversificar riscos de longo prazo.
Seja qual for o seu caso, o mais importante é lembrar-se sempre de que a primeira e indispensável missão da gestão patrimonial é proteger sua capacidade de arcar com as suas despesas. São elas o fato que deve determinar suas decisões e não conjecturas incertas sobre um contexto que está além do seu domínio.
(*) Sigrid Guimarães é sócia e CEO da Alocc Gestão Patrimonial.