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O papel do Brasil na nova Rota da Seda

em Artigos
segunda-feira, 02 de dezembro de 2024

A eleição de Donald Trump levou o governo de Pequim a adotar um amplo pacote de estímulo econômico de US$1,4 trilhão, com o objetivo de combater possíveis consequências na relação futura com os americanos. As ameaças de Trump de tarifas de até 60% sobre produtos chineses ocorrem em um momento delicado para o país, que já enfrenta uma grave crise imobiliária, gastos fracos do consumidor e crescente dependência de exportações.

Nem tudo são flores em Pequim. Em resposta à iminente ameaça de tarifas elevadas, os formuladores de políticas chineses aprovaram um pacote de resgate substancial. O Congresso Nacional do Povo endossou o plano como uma contramedida para estabilizar a economia, com foco no refinanciamento da dívida e no reforço de projetos de infraestrutura para mitigar o impacto das políticas comerciais de Trump.

Apesar do estímulo, o plano cobre apenas uma fração da dívida oculta chinesa, estimada pelo FMI em mais de US$8 trilhões. O retorno de Trump já impactou os mercados financeiros: enquanto as ações chinesas caíram, as ações nos EUA subiram, refletindo as preocupações dos investidores sobre a escalada das tensões comerciais. A ação de Pequim para implementar o estímulo expõe sua preparação para uma rivalidade econômica prolongada.

Enquanto o presidente eleito Donald Trump se prepara para reimpor tarifas sobre a China, o líder chinês Xi Jinping busca fortalecer laços com países como o Brasil. A estratégia de Pequim é fomentar relações baseadas em interesses econômicos compartilhados. Logo após a cúpula do G20, foram anunciados 37 acordos envolvendo agricultura, comércio, tecnologia e energia, delineando um modelo robusto de interdependência econômica.

O Brasil é o maior fornecedor de soja, minério de ferro e carne bovina para a China, enquanto a China fornece ao Brasil semicondutores, fertilizantes e peças automotivas. Esses laços deixam claro que a China busca mitigar os efeitos das tarifas dos EUA, usando o Brasil como peça em sua disputa comercial com os americanos.

No entanto, apesar das relações profundas que desenvolve com Pequim, o Brasil mantém cautela quanto a um alinhamento total com a China. Embora Xi deseje que o Brasil se integre plenamente à Nova Rota da Seda, Lula esclareceu que seu governo pretende apenas “estabelecer sinergias entre a Iniciativa da Rota da Seda e as estratégias de desenvolvimento do Brasil”, descartando uma adesão integral.

Esse posicionamento reflete a estratégia global da China de aprofundar parcerias e redes comerciais para aliviar suas próprias pressões econômicas internas. É nesse contexto que o Brasil precisa ser cuidadoso, evitando a sinodependência comercial, a reedição de um novo pacto colonial e, sobretudo, o risco de servir como contrapeso na economia chinesa em sua disputa com os americanos.

Os dados mostram que a China enfrenta elevados níveis de dívida e uma situação econômica que requer atenção. Atrelar o destino brasileiro às diretrizes traçadas por Pequim pode ser um caminho arriscado, já que “negócios da China” frequentemente escondem armadilhas difíceis de identificar.

(*) – É Presidente do Instituto Monitor da Democracia e Conselheiro da Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais.