Paulo Stucchi (*)
Sei que todos passam por dificuldades, mas não carrego solitário o sofrimento do mundo.
Sempre estive pronto para ser usado livremente como remédio para diversos males, incluindo, o da solidão. Por isso, clamo: não me deixe morrer.
Nunca estive entre as preferências nem no topo dos desejos, mas sempre estive disponível entregando-me facilmente a quem optou por me decifrar e explorar. Por isso, clamo: não me deixe morrer.
Às vezes sou difícil. Muitas outras, incompreendido. Porém, nunca me fechei a dar uma segunda chance àqueles que desejaram caminhar comigo. Por isso, clamo: não me deixe morrer.
Nunca fui protagonista, somente coadjuvante, na vida de muitos. Mas, mesmo num cantinho escondido da bagagem, estive lá, uma companhia solitária e muda, mas sempre pronta a servir de interlocutor para seus maiores devaneios. Por isso, clamo: não me deixe morrer.
Muitos sonharam me tendo em mãos, mas nunca efetivamente estiveram ao meu lado; mas não guardo rancor. Outros amaram, entregaram-se ao sexo, ao gozo, viajaram pelo exótico e insólito, sentiram medo, pavor, e, ainda assim, me tratam com carinho. Por isso, clamo: não me deixe morrer.
Não sou um, mas muitos. Não tenho dono, mas sou de todos. Sou tão antigo quanto o desejo da humanidade de eternizar seus sonhos, e, se me for, irá comigo uma porção maravilhosa de tudo o que faz de você diferente, especial. Não sou o fim, mas o meio. O meio pelo qual histórias são criadas e contadas; almas, despidas e penetradas.
Nunca fui amante, mas já estive ao seu lado potencializando noções sobre o amor. Lamento por quem me despreza, mas nunca cederei ao desprezo, dando a todos os que desejarem me possuir, uma segunda chance.
SOU O LIVRO. E, clamo: por favor, não me deixe morrer.
(*) – É escritor, atuou como redator, jornalista responsável e editor em jornais impressos e revistas. Também foi professor e coordenador de curso de Comunicação.