Paulo Dutra Constantin (*)
O processo inflacionário brasileiro possui três razões principais.
Uma externa – a inflação, em dólares, dos preços dos produtos relacionados a retomada do crescimento econômico mundial – e duas internas – a falta de credibilidade na condução da política fiscal e a crise hídrica.
A conjunção destes três fatores somada à baixa taxa de crescimento nos setores que utilizam mão de obra de forma intensiva, faz com que a percepção do poder de compra no Brasil seja sentida com maior intensidade, principalmente, quando comparada aos países que apresentam recuperação econômica mais acelerada e em diversos setores.
No Brasil, o índice oficial de inflação é o IPCA, mensurado mensalmente pelo IBGE, apresentando a variação do custo de vida médio de famílias das principais regiões urbanas do país com renda mensal entre 1 (um) e 40 (quarenta) salários-mínimos e dividido em nove grupos (1. Alimentação e bebidas; 2. Habitação; 3. Artigos de residência; 4. Vestuário; 5. Transportes; 6. Saúde e cuidados pessoais; 7. Despesas pessoais; 8. Educação; e 9. Comunicação).
Este indicador não é referente à variação do custo de vida individual porque, cada um de nós, possui uma cesta de consumo diferente daquela que é adotada pela metodologia do IBGE, por isso, quase sempre escutamos “o governo está escondendo a inflação” ou “a minha inflação é muito maior que a divulgada pelo governo”. A variação do IPCA acumulada nos últimos doze meses é de 9,68%, muito acima do centro da meta para 2021 que é de 5,25%.
A perspectiva para a inflação no Brasil em 2021 permanece de alta porque, conforme indicado no primeiro parágrafo, os fatores de pressão persistem e, podem ser ampliados. A inflação de custos possui dois componentes: o primeiro é decorrente do aumento em dólares dos insumos de produção relacionados a retomada do crescimento econômico mundial, como as commodities agrícolas e minerais
O segundo, está relacionado a falta de credibilidade da condução da política fiscal, decorrente do descontrole das contas públicas com a possibilidade de rompimento do teto orçamentário com políticas populistas como a proposta de incremento do programa Bolsa Família e de “maquiagem” ao não realizar o pagamento de precatórios. Esta falta de credibilidade estimula a desvalorização cambial porque o risco de não pagamento da dívida pública aumenta.
Aumentando o risco, o Banco Central (BC) eleva a taxa de juros tornando os títulos da dívida pública mais atrativos com objetivo de evitar que os credores do governo vendam seus títulos e comprem moeda estrangeira. Como há defasagem entre os acontecimentos políticos e as reuniões do Copom, que ocorrem a cada 45 dias, para definição da taxa Selic, há desvalorização da taxa de câmbio e isto torno o preço dos produtos cotados em dólares ainda mais altos, aumentando os custos de produção que são repassados para o consumidor final.
O terceiro fator impactante é a crise hídrica, a pior em 90 anos, que além de impactar o consumidor final, impacta toda a cadeia de produção. O consumidor final é afetado diretamente pelo aumento no preço da energia elétrica, que nos últimos 12 meses teve acréscimo de 21,08%. A cadeia de produção é afetada pela falta de água, para as commodities agrícolas, pelo aumento de custos da energia para a produção de bens e serviços, e pela possível falta de energia, o que contribuirá para redução da taxa de crescimento da economia brasileira.
A avaliação final é a de que diante deste cenário e com o agravante da possibilidade do Federal Reserve (FED) aumentar a taxa de juros da economia dos Estados Unidos, desvalorizando ainda mais o Real, existe potencial para termos uma taxa de inflação acima dos dois dígitos no Brasil de 2021.
(*) – Graduado em Ciências Econômicas e doutor em Administração, é professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie.