Ronaldo Oliveira (*)
Após um ano de 2023 desafiador no qual o saldo do crédito alcançou a menor alta em 4 anos em virtude, sobretudo, de questões estruturais e macroeconômicas internas (mudanças de governo e de arcabouço fiscal, taxa básica de juros na casa de 13,75% durante todo o primeiro semestre, incerteza inicial sobre a definição das políticas econômicas e andamento da reforma tributária), os ventos do mercado de crédito parecem retomar o rumo da expansão que, em anos anteriores, o moveram para patamares recorde.
Em parte, o novo ambiente se justifica pela melhora dos ânimos do mercado e, concomitantemente, por uma maior clareza quanto aos rumos econômicos do país. Dentro desse contexto, em relatório de março do Banco Central, a projeção para o saldo de crédito alcançou indicador próximo aos dois dígitos (9,4%) e, de fato, atingindo esse patamar no plano do crédito livre para pessoas físicas (que passou de 9,0% para 10%).
É também nesse ambiente de retomada que vemos tanto o fortalecimento do crédito privado, quanto a tendência de bancarização e aumento da oferta de serviços financeiros em segmentos como o varejo, a partir de uma nova perspectiva: o varejista passa a ser uma instituição financeira independente e não mais depende da parceria com outros bancos para disponibilizar, por exemplo, modalidades de crédito rotativo, cartões, pagamentos e a própria disponibilização de crédito para clientes.
O banking as a service (CaaS) – cuja infraestrutura tecnológica, via de regra, se dá por meio de habilitação do varejista como correspondente bancário e API para, por exemplo, a formalização de contratos de crédito – é uma verdadeira disrupção que otimiza a entrada de novos agentes no grande ambiente de negócios e serviços financeiros do país. Não por acaso, estamos falando de um mercado que segundo pesquisa da Future Market Insights, deve alcançar faturamento superior a US$ 12,2 bilhões até 2031 globalmente.
Além disso, um estudo da Deloitte estima que toda a receita do varejo físico brasileiro – em conjunto com outros setores como o e-commerce, empresas de distribuição e consumo de bebidas, hotéis e agências de viagem deve crescer em cerca de R$ 24 bilhões a partir da oferta de serviços financeiros (sendo que deste montante, nada menos que R$ 13,9 bilhões seriam advindos da oferta de crédito).
Em outras palavras: o cenário que se constrói alimenta as expectativas de fortalecimento do varejo nacional – que, aliás, já vem acumulando bons indicadores em 2024, incluindo a alta recorde de R$ 209,9 bilhões no volume de vendas totais em fevereiro, segundo números da Confederação Nacional do Comércio (CNC) –, mas que pode e deve ser mais explorado pelas empresas no decurso dos próximos anos e em diálogo com outras tendências de inovação do sistema financeiro, como o Open Banking, open finance, PIX e a consolidação do ecossistema nacional de fintechs.
Esse olhar para a bancarização por parte das empresas do varejo pode trazer ainda outros benefícios diretos, como a fidelização de consumidores, a democratização de serviços financeiros no país e um maior fluxo de negócios que se traduz, como vimos, em um potencial expressivo de aumento de receita para os varejistas.
Como se sabe, grandes companhias do varejo físico e digital – como Magazine Luiza, Leroy Merlin, Pernambucanas e Mercado Livre – já estão atentas a esses ganhos e colhendo os frutos de uma revolução de base financeira. O marketplace da Magalu, por exemplo, viu na oferta de serviços agregados (do crédito a logística) um caminho para o aumento de margens no e-commerce dentro de um segmento bastante acirrado no país.
E, no futuro, o que se espera é que, de modo cada vez mais massificado e democrático, outros varejistas (incluindo organizações de médio e pequeno porte) participem dessa corrida, aumentando a disponibilidade de crédito e de serviços financeiros no mercado em benefício tanto de seus clientes, quanto do fortalecimento de seus negócios. Para tanto, é fundamental contar com parcerias estratégicas e o apoio de soluções que descomplicam e automatizam todo o processo de bancarização dos novos entrantes.
Todo esse contexto, por fim, é valioso para a economia brasileira – que tem no crédito e no varejo dois de seus principais pilares –, fomentando uma cadeia de impactos positivos a partir de uma jornada disruptiva que, acreditem, está apenas começando.
(*) – É Founder e CEO da Giro.Tech (https://giro.tech/).