Larissa Milkiewicz (*)
A pandemia da Covid-19 sucedida pela Invasão da Ucrânia pela Rússia em fevereiro de 2022 foram eventos que provocaram uma crise mundial sem precedentes, a partir da qual emergiu atenção sobre a segurança alimentar, que foi posta em xeque pelas dificuldades para mitigar a fome mundial devido à escassez de alimentos e consequente elevação dos preços.
Em razão da Guerra entre Rússia e Ucrânia, dois países estes com papel de destaque no agronegócio mundial, entidades internacionais se juntaram para debater medidas em prol da garantia da segurança alimentar, a qual poderia ser acometida em virtude da paralisação das cadeias do agronegócio, especialmente no caso da exportação de grãos e de insumos para produção de fertilizantes a partir dos países envolvidos diretamente no conflito.
Sob essa perspectiva, Rússia, Ucrânia, Turquia e as Nações Unidas celebraram um acordo intitulado “Iniciativa do Mar Negro”, o qual permitiria a saída de cereais e fertilizantes de três portos ucranianos para abastecer 45 países em três continentes, resguardando a segurança daqueles que trabalham nesse deslocamento de alimentos e das matérias-primas que são transportadas pelo Mar Negro.
A importância desse acordo diplomático entre Moscou e Kiev é tremenda, haja vista os indicadores que sinalizam que, até 12 de julho de 2023, 33 milhões de toneladas de alimentos já foram transportadas desde o início da Guerra, o que está diretamente alinhado com o viés humanitário da segurança alimentar, bem como visando conter a elevação dos preços internacionais, tanto para os países ricos quanto para os menos favorecidos economicamente.
Os cereais que saem da Ucrânia abastecem, em destaque, países como Etiópia, Quênia, Afeganistão, Somália, ou seja, países com baixo desenvolvimento econômico em que a segurança alimentar poderia ser colocada em maior perigo. De mais a mais, além desses países abastecidos diretamente pelos cereais que vêm da Ucrânia, é de suma importância destacar que a segurança alimentar é pauta mundial, haja vista que a ONU aponta probabilidade de 80% de que a população mundial seja entre 8,4 e 8,6 bilhões em 2030 e entre 9,4 e 10 bilhões em 2050. A partir disso, projeta-se que a produção de alimentos deverá crescer 60% a fim de atender à crescente demanda mundial.
Ocorre que o acordo de grãos entre Rússia e Ucrânia, o qual foi mediado por Turquia e ONU e permitiu a liberação da exportação dos grãos ucranianos através do Mar Negro, foi o único êxito diplomático entre Moscou e Kiev desde o início da guerra, e recentemente, próximo da data da renovação (julho de 2023), o acordo foi desfeito com a saída unilateral da Rússia.
A não renovação do acordo coloca o mundo em estado de alerta, uma vez que se questiona se haverá quantidade suficiente de alimentos para toda a população a fim de impedir a fome, bem como se o preço dos produtos que direta e indiretamente são necessários para a produção, como matérias-primas e seus derivados, tenderão a aumentar. Nesse contexto, o Brasil, na condição de grande player do agronegócio mundial, desempenha um papel crucial na garantia da segurança alimentar e poderá auxiliar nesse complicado momento no combate à fome, como vem realizando por meio de sua ampla e sustentável produção de alimentos.
(*) É professora doutora e advogada atuante no Agronegócio e Direito Ambiental Empresarial.