José Pio Martins (*)
Em nossa vida, uma coisa importante é o que obtemos. Porém, mais importante é como obtemos.
Esse adágio se aplica a situações diversas em economia, e faz parte de estudos sobre o resultado das ações humanas e a forma como tais ações são executadas. Atualmente, o Brasil está vivendo uma situação em que tal raciocínio se aplica. Durante anos, o país foi esmagado pela inflação e sua versão mais demolidora: a hiperinflação. Hoje, a inflação está controlada em níveis baixos – o que é bom –, mas cabe perguntar se não se trata de um bem derivado de um mal.
Comumente definida como um processo de aumento generalizado e contínuo de preços, a inflação foi um dos estopins da queda do presidente João Goulart, em 1964. No ano anterior, a inflação chegara a 78% e desorganizou o sistema de preços, lançou a economia em recessão e empobreceu os assalariados. Alguns economistas definem que há hiperinflação quando o índice anual de preços passa dos 50%. Outros acham que ela ocorre quando os preços sobem acima dos 100% ao ano.
O Brasil conseguiu controlar aquela inflação de 1963, mas em 1974 o monstro voltou e os preços subiram 34%. Em 1979, a inflação atingiu 78%, o mesmo índice de 1963, e o Brasil começou uma fase de hiperinflação, que acabaria resultando em cinco planos econômicos nos governos Sarney, Collor e Itamar Franco, na tentativa de combatê-la. Foi somente em 1994, com o Plano Real, que o país conseguiu vencer a hiperinflação e iniciar uma fase de estabilidade de preços.
Após 1994, parecia que o monstro da inflação havia deixado o Brasil. Mas inflação não morre. Apenas adormece, sempre pronta a atacar quando é cutucada. Desde 1996, a inflação não passa de um dígito, à exceção de 2002, quando foi de 12,5%, e depois em 2015, quando chegou a 10,67%. Esse histórico deixou os agentes econômicos assustados no início do segundo governo Dilma, quando a inflação subiu em 2015, e o medo da hiperinflação reapareceu. Hoje, o pânico passou e a inflação deve ficar em 4% neste ano, abaixo da meta do Banco Central, que é de 4,5%.
Atualmente, estamos presenciando certa euforia com a inflação baixa. Entretanto, há um problema com as razões que levaram à redução no índice de preços. Se estivesse baixa em um ambiente de crescimento econômico e reduzido desemprego, daria para dizer que temos um bem assentado em causas boas. Entretanto, a inflação está baixa em 2017 depois de três anos de recessão pesada – o Produto Interno Bruto (PIB) do ano 7,4% menor do que era em 2013 – e desemprego de 14,2 milhões de trabalhadores, sobre um total de 103,6 milhões de pessoas em condições de trabalhar.
A inflação baixa é boa para a nação, mas, se deriva de produção baixa e desemprego alto, ela não é estável. Há dúvidas quanto à capacidade da economia em manter a inflação baixa quando o produto nacional voltar a crescer e o desemprego cair. Alguns analistas acreditam que a inflação pode voltar a subir, pois há variáveis macroeconômicas – como déficit do setor público, controle da dívida governamental e expansão monetária – que não dão mostras de melhoras e vão pressionar a inflação para cima.
Se um sujeito emagreceu se exercitando numa academia, é uma coisa boa. Se outro emagreceu porque ficou doente, é uma coisa ruim. A inflação brasileira caiu porque o país adoeceu (recessão e desemprego). A recessão até ajuda a combater a inflação, desde que sejam feitos os ajustes fiscais e monetários. Sem isso, é sucesso não sustentável.
(*) – Economista, é reitor da Universidade Positivo.