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A dualidade democrática no ciberespaço

em Artigos
quinta-feira, 10 de setembro de 2015

Antonio Greff de Freitas (*)

O busto de Edward Snowden foi colocado em um parque na cidade de Nova York.

Evidentemente, a efígie tinha o objetivo de comparar o ex-analista da NSA, que revelou como a agência de segurança nacional americana usa internet para a coleta de dados privados de cidadãos ao redor do mundo, a um herói. Tal qual os bustos da Roma antiga, seus defensores buscaram fazer uma homenagem, que durou pouco, pois horas depois a polícia americana já havia retirado a representação inerte de Snowden.

Mas o que define um herói ou alguém que deve ser homenageado? A internet é realmente democrática ou na verdade também sofre influências de grandes corporações, como o Google, Facebook, Microsoft ou o próprio governo americano? Até pouco tempo atrás, o imaginário coletivo tinha certeza de que a internet era um espaço majoritariamente dos cidadãos comuns e para os cidadãos comuns.
Assim como afirma Pierre Levy, um dos grandes estudiosos da cibercultura, a internet é um meio construído e alimentado por pessoas comuns no dia a dia, tendo esse imaginário sido confirmado principalmente a partir de 2010, quando movimentos de protestos de amplitude global começaram a se proliferar em inúmeros países, não somente nos com governos ditatoriais, mas também nas democracias consolidadas como os EUA, Espanha, Inglaterra, entre outros.

Porém, os vazamentos de Snowden comprovaram que a amplitude do uso da internet pelo governo americano não parece de certa forma tão democrático, vez que empresas privadas aliadas ao governo estadunidense comprovadamente captaram dados de cidadãos, de presidentes de nações como Dilma Rousseff e Angela Merkel, chanceler da Alemanha, e outras dezenas de líderes mundiais, transpareceu ser corriqueiro como instrumento de estado.

Tal prática chegou ao ponto de forçar as líderes de Brasil e Alemanha a apresentarem declarações públicas em direção a Barack Obama, tendo o próprio presidente admitido a existência do programa de espionagem denominado PRISM. De acordo com um artigo do New York Times, o governo americano retirou o grampo da Alemanha e continua a espionar o alto escalão brasileiro, assim como o mexicano – apesar de Alemanha e Brasil terem provocado até mesmo as Nações Unidas, com o objetivo de impulsionar uma resolução que resguarde a soberania nacional contra interferências externas. Tal tentativa não se mostrou efetiva no que tange à aplicação de penalidades.

Até que ponto realmente existe liberdade na internet, se nem presidentes de estados soberanos deixam de ser espionados? O que restaria, então, para o cidadão comum num ambiente online? Dessa forma, é possível acreditar que se não existissem personagens como Edward Snowden, nem mesmo seria possível se ter consciência da amplitude do controle que a internet pode exercer na sociedade.

A relatividade simbólica do busto de Edward Snowden é cada vez mais concreta do que subjetiva, vez que a internet vive um limiar entre um ambiente de fato democrático e um ambiente controlado por Estados e empresas multinacionais.

(*) – É professor de História do Colégio Positivo.