Benedicto Ismael Camargo Dutra (*)
Os seres humanos são desiguais em seu desenvolvimento espiritual.
Isso, porém, não lhes dá o direito de se sobreporem uns aos outros. Com a estagnação desse desenvolvimento, foi surgindo e se perpetuando a ideia da divisão entre mandantes e submissos, sendo que estes últimos se tornaram obedientes devido à própria indolência, e não por forte imposição dos mais fortes.
Na educação, essa ideia foi sendo implantada desde a infância, ampliando-se pela vida toda por meio da mente e das emoções, semeando medo, estabelecendo a fragilidade dos vínculos nas relações. No passado, isso foi largamente utilizado pela religião com o intuito de domesticar os seus rebanhos, mantendo os indivíduos em atitude passiva, sem fazer questionamentos, aceitando os dogmas sem análise própria.
Modernamente, usam-se meios sofisticados de condicionamento das massas; poderia até se dizer que há um processo de “emburrecimento” que mantém as atenções dirigidas para o que é menor, para a luta pela sobrevivência e prazeres passageiros, sem que se alcance um relacionamento de fato, prevalecendo um estado de conflito silencioso que às vezes evolui para confrontações violentas.
A indolência espiritual e preguiça de pensar com clareza levam o ser humano a se acomodar e a aceitar passivamente tudo que lhe é impingido sem se dar ao trabalho de investigar objetivamente com raciocínio lúcido. Como consequência inevitável, ele vai enfraquecendo e se tornando ser-objeto nas mãos daqueles sem consideração que visam apenas satisfazer as suas cobiças e que fazem tudo o que podem para manter essa situação anômala.
Muitas coisas ficavam escondidas, mas agora tudo vem à tona: a miséria, a violência e a vida exibicionista da classe alta. Isso gera descontentamento e aumento do desinteresse de muitas pessoas, que se tornam apáticas e desanimadas ao verem o quão distantes estão dessa forma de vida artificial, transformada em ideal de muitos e inacessível para a grande maioria.
Estamos adentrando numa fase em que os empregos estão desaparecendo no Brasil e no mundo. Seria o fim dos empregos anunciado pelo escritor norte-americano Jeremy Rifkin, autor de um best-seller sobre o tema? O Brasil é um país de incoerências gritantes. Há tantas coisas a serem feitas, mas não há trabalho nem muita vontade. Lixo e esgoto são dois aspectos que mostram o baixo nível da seriedade do poder público e da população.
No interior do país, ainda existem prefeitos que mandam queimar os lixões, liberando a fumaça fétida para a cidade e ruas. Muitas rodovias também revelam o descaso, com buracos, falta de sinalização e lixo espalhado. O interior fica ao abandono, sem atividades produtivas nem empregos, enquanto tudo vai decaindo, sem que surja um sonho comum de cooperação para o bem.
No entanto, muita coisa poderia ser resolvida com boa vontade e planejamento para dar trabalho e remuneração através de atividades úteis e necessárias. As mudanças efetivadas na matriz global de produção industrial e pela automação estão criando uma legião sem trabalho, um problema que não poderá ser resolvido pelos meios tradicionais, e que exige uma tomada de posição antes que, com o aumento do descontentamento, os ânimos se acirrem contra as classes em melhor situação. Ainda há uma cegueira geral, mas logo virá o inevitável despertar.
Com sua propensão para a indolência, o ser humano se deixa moldar como objeto e se torna um fraco que vai perdendo a capacidade de perceber o mundo e de exercer a sua livre escolha. O agravamento da situação o deixa mais propenso a odiar e a se revoltar. Só o despertar espiritual poderá eliminar essa anômala situação na qual os humanos se colocaram e restabelecer a boa convivência entre seus pares e a paz.
(*) – Graduado pela FEA/USP, realiza palestras sobre qualidade de vida. Coordena os sites (www.vidaeaprendizado.com.br) e (www. library.com.br). Autor dos livros: Conversando com o homem sábio; Nola – o manuscrito que abalou o mundo; O segredo de Darwin; 2012…e depois?; e Desenvolvimento Humano ([email protected]).