Larry Carvalho (*)
O transporte marítimo, vital para o comércio global, enfrenta uma série de desafios e transformações em 2024. Esses desafios são impulsionados por questões geopolíticas, mudanças climáticas, problemas específicos em infraestruturas portuárias e dinâmicas de mercado, como as observadas no Brasil e no Sudeste Asiático.
As tensões entre grandes potências, como Estados Unidos e China, bem como conflitos regionais em áreas estratégicas como o Oriente Médio e a Ásia, têm repercussões significativas no transporte marítimo. Sanções econômicas, bloqueios navais e disputas territoriais podem forçar alterações nas rotas comerciais, aumentando o tempo de trânsito e os custos operacionais.
A rota tradicional pelo Canal de Suez, por exemplo, já tem sido substituída por rotas mais longas pelo Cabo da Boa Esperança, impactando diretamente o comércio entre a Europa e a Ásia. Além das tensões políticas, a necessidade de reduzir custos operacionais e o impacto ambiental está levando a mudanças nas rotas de viagem. As companhias de navegação estão explorando rotas pelo Ártico devido ao degelo polar, o que, embora reduza a distância entre a Europa e a Ásia, apresenta riscos ambientais e operacionais significativos.
A mudança climática tem exacerbado problemas como a seca, que afeta diretamente o nível de rios importantes para o transporte fluvial e o abastecimento de água dos portos. No Brasil, a seca na bacia hidrográfica do Amazonas tem causado uma redução no nível das águas, dificultando a navegação de embarcações de grande porte e aumentando os custos de transporte interno de mercadorias.
Os portos brasileiros precisam de atenção
Além disso, os portos brasileiros enfrentam desafios crônicos de infraestrutura. A burocracia e regulamentações excessivas são obstáculos significativos. Processos alfandegários demorados e complexos aumentam o tempo de espera para liberação das cargas, prejudicando a competitividade do Brasil no cenário global. Notoriamente a greve recente de diversos órgãos anuentes levando a um maior tempo de desembaraço aduaneiro, consequentemente, contribuindo para que terminais de contêineres fiquem com sua capacidade gargalada diante de pátios lotados.
Desde o quarto trimestre de 2023, o mercado de contêineres tem mostrado uma tendência constante de fortalecimento, com crescimento acelerado em 2024. No Brasil, de janeiro a março, as importações em contêineres aumentaram em 19% e as exportações, em 20,3%.
O frete tem aumentado, influenciado pela maior demanda e pelo prolongamento dos períodos médios de fixação de embarcações de contêineres. Os proprietários de navios recuperaram o controle, com a capacidade de escolher entre vários interessados para sua tonelagem/embarcadores.
Contrariando as previsões iniciais, a demanda impactou significativamente o mercado. Altos volumes de carga elevaram as taxas de frete, apesar da introdução de novas capacidades. A tensão geopolítica no Mar Vermelho também teve um impacto substancial, afetando a disponibilidade de equipamentos e a congestão portuária.
A situação no Sudeste Asiático
O crescimento econômico robusto no Sudeste Asiático é um motor importante para o mercado de transporte marítimo e tem contribuído significativamente para o aumento da demanda por frete, com aumentos notáveis do PIB previstos para as Filipinas (6,2%), Vietnã (5,8%) e Indonésia (5,0%). A Malásia e as Filipinas mostraram crescimento significativo nas importações conteinerizadas, com a Malásia aumentando 19,8% em comparação com 2023 e 46,2% em comparação com 2019.
Doutro modo, a nível global os números demonstram que a inflação vem sendo contida pelas principais economias, apoiando um maior consumo privado, as taxas de desemprego devem permanecer baixas, impulsionando ainda mais a demanda por mercadorias conteinerizadas.
A adoção de tecnologias emergentes, como a automação portuária, sistemas de gestão de frotas baseados em inteligência artificial e blockchain para transações mais seguras e eficientes, promete melhorar a eficiência operacional. Portos inteligentes com monitoramento em tempo real podem reduzir os tempos de espera e melhorar a coordenação logística.
Além disso, a pressão por operações mais sustentáveis está levando ao desenvolvimento e uso de combustíveis verdes, como o gás natural liquefeito (GNL) e o hidrogênio verde. Esses combustíveis não apenas reduzem as emissões de carbono, mas também podem se tornar uma vantagem competitiva à medida que mais regulamentos ambientais são implementados globalmente.
Atualmente, dois terços do comércio exterior brasileiro são atendidos por navios na faixa de 8.500 a 12.000 TEU. Contudo, os novos pedidos dessa classe de navios têm diminuído nos estaleiros, devido às novas normas de eficiência energética e à busca por menores custos operacionais.
Como consequência, navios de 12.000 a 14.000 TEU começam a chegar à costa brasileira. Isso demanda investimentos em tecnologia e infraestrutura para que esses navios possam operar plenamente em sua capacidade máxima. O fortalecimento do mercado de contêineres, impulsionado pela robusta economia do Sudeste Asiático e pela crescente demanda por mercadorias conteinerizadas, reflete a resiliência e a capacidade de adaptação da indústria.
Adaptação é o segredo
No entanto, é fundamental que o Brasil e outros países se comprometam com um planejamento estratégico e forneçam um ambiente de segurança jurídica para atrair investimentos privados necessários para modernizar e expandir suas capacidades portuárias.
Adaptar-se às mudanças geopolíticas, climáticas e tecnológicas será crucial para garantir a eficiência e sustentabilidade desse setor vital para o comércio global. A transição para operações mais sustentáveis, incluindo o uso de combustíveis verdes, não só ajudará a reduzir as emissões de carbono, mas também proporcionará uma vantagem competitiva no mercado global.
Com uma abordagem proativa e colaborativa, a indústria está bem posicionada para superar desafios e aproveitar as oportunidades emergentes, assegurando assim um futuro mais eficiente e sustentável para o comércio global.
(*) Advogado, especialista em transporte, comércio exterior e infraestrutura