Heródoto Barbeiro (*)
Os navios russos navegam em águas cubanas. Ninguém ignora que é um desafio ao domínio americano no Caribe, que se iniciou no século 19.
O almirante Mahan, autor de um estudo sobre as regiões em que os Estados Unidos deveriam preponderar, deu grande importância para Cuba. Por isso, o saldo da guerra contra a Espanha é a base naval de Guantánamo, de importância estratégica para a preponderância geopolítica de uma nação que desponta como uma potência capaz de peitar o velho imperialismo. A presença de uma potência europeia na região é um acinte à velha Doutrina Monroe de “América para os americanos”.
Os partidos democrata e republicano, apesar das disputas e diferenças políticas, quando está em jogo a supremacia da mãe pátria se juntam e mostram que são as duas faces do mesmo sistema. São favoráveis a uma contenda com uma potência estrangeira que venha a disputar uma região historicamente sob influência dos Estados Unidos.
O governo cubano sabe que graças ao embate entre as duas superpotências, EUA e URSS, está no centro das atenções mundiais e é o momento para divulgar sua política, especialmente na América Latina. Mostra que é possível desafiar o Tio Sam e limpar o continente do imperialismo americano. Já a ação dos russos é classificada pelo governo cubano como uma oportunidade de os países escolherem seus próprios destinos sem intervenção de Washington.
A frustrada invasão de Cuba pelos americanos foi um desastre e o governo cubano sempre relembra que os Estados Unidos são o que Mao Zedong chama de “tigre de papel”. A crise econômica vivida pelos cubanos aproxima ainda mais o país da Rússia. Na ilha, faltam petróleo, energia elétrica, alimentos básicos e dinheiro para comprar no mercado mundial. O embargo econômico imposto pelos americanos está firme e não há perspectivas de que possa, pelo menos a curto prazo, ser levantado. Assim, o guarda-chuva russo é bem mais do que uma proteção militar.
A instalação de foguetes nucleares em território cubado é um desafio que o Tio Sam não pode aceitar. Os mísseis de médio alcance poderiam chegar à capital Washington e a Nova York, a mais importante cidade da costa atlântica dos Estados Unidos. O mundo está dividido entre o mundo comunista, liderado pela União Soviética, e o capitalista, pelos Estados Unidos. Esse braço de ferro entre duas potências nucleares é caracterizado como uma guerra fria, em que um não pode atacar o outro sem ser também atacado.
O ano de 1962 assiste, pela segunda vez no século 20, a chamada paz armada. A primeira vez não conseguiu impedir a eclosão da Primeira Guerra mundial com milhões de mortos. Desta vez, há bombas atômicas capazes de destruir toda a população do planeta várias vezes. O governo cubano, liderado pelo ditador Fidel Castro, está abrigado sob o guarda-chuva soviético. Daí desafia os Estados Unidos e financia guerrilheiros para implantar regimes comunistas na América Latina. A consolidação da influência soviética chega ao auge com a instalação de mísseis nucleares no território cubano. Fotos obtidas a partir de aeronaves espiãs americanas atestam que soldados russos constroem a infraestrutura de uma base.
O presidente John Kennedy decreta o embargo do mar em volta de Cuba e ameaça afundar os navios soviéticos que tragam equipamentos. O ditador soviético Kruschev ameaça ir para o confronto. O mundo está à beira de uma nova guerra mundial, que pode ser a última. Diplomatas americanos e soviéticos costuram um acordo. Os Estados Unidos se comprometiam a não invadir Cuba e a retirar os mísseis na Turquia, que poderiam atingir Moscou. Os russos, por sua vez, desmontariam a base nuclear cubana. Por muito pouco o conflito não ocorre. Há um alívio geral no mundo e Albert Einstein, quando perguntado como seria uma Terceira Guerra mundial, responde:
“A terceira não sei, mas a quarta vai ser de arco e flecha”.
(*) É jornalista do Record News, R7 e Nova Brasil (89.7), além de autor de vários livros de sucesso, tanto destinados ao ensino de História, como para as áreas de jornalismo, mídia training e budismo.