Sempre que o avanço da tecnologia pode impactar a educação, surgem vozes que manifestam suas preocupações com o assunto: na Idade Média diziam que a invenção do lápis prejudicaria a capacidade de memorização; no século XVI, a abundância de livros trazida pela invenção da imprensa era acusada de confundir as mentes.
Vivaldo José Breternitz (*) Elisabete Panssonatto Breternitz (**)
No século XX as coisas seguiram da mesma forma: o rádio, a televisão e as calculadoras portáteis também foram rotuladas como tecnologias prejudiciais à formação de crianças e adolescentes.
Agora é a vez dos computadores pessoais, tablets e smartphones coletivamente chamados “telas”, despertarem preocupações: alguns dizem que as telas criaram a primeira geração de filhos menos inteligentes que seus pais.
No entanto, já em 2019, a revista médica The Lancet afirmava que “nossa compreensão acerca dos benefícios, danos e riscos do nosso cenário digital em rápida mudança é dolorosamente escassa”. Agora, a revista Nature Human Behaviour publicou uma revisão dos estudos científicos sobre esse assunto e chegou a conclusões pouco dramáticas: foram analisados os resultados de 2.451 estudos envolvendo quase dois milhões de participantes menores de 18 anos, tendo os autores da revisão concluído que o uso de telas está associado a riscos e também a benefícios, mas em pequena escala.
Dentre os riscos, observou-se que a habilidade de leitura e escrita e a aprendizagem em geral pioram ligeiramente quando se passa muito tempo diante das telas. Além disso, concluiu-se também que os anúncios de fast food em mídias digitais favorecem o consumo pelas crianças e que o uso de redes sociais aumenta ligeiramente o risco de depressão.
Há efeitos positivos, especialmente os derivados do uso de aplicativos, principalmente quando estes envolvem realidade aumentada.
O principal autor da revisão, o professor e pesquisador Taren Sanders, da Australian Catholic University, reafirma que os resultados do estudo mostram que o uso de telas, em geral, não deve ser uma grande preocupação para os pais, mas que estes devem acompanhar atentamente esse aspecto da vida de seus filhos, especialmente conhecendo quais sites e aplicativos estes vem utilizando, da mesma forma que devem conhecer as pessoas com quem seus filhos interagem.
Sanders diz que, historicamente, as pessoas se preocupam com as novidades na área, mas quando aprendem mais sobre elas, se adaptam. Reconhece, porém, que a velocidade do avanço da tecnologia pode mudar as conclusões a que os pesquisadores chegaram agora.
Luisa Fassi, pesquisadora da University of Cambridge, que não participou do estudo, concorda com as opiniões de Sanders, dizendo que providências radicais na área, como proibição ou restrições severas do uso de telas, por enquanto não devem ser tomadas, especialmente pela possibilidade de não se aproveitar os benefícios das telas na formação de crianças e adolescentes, mas que o assunto deve ser acompanhado cuidadosamente, face à velocidade da evolução da tecnologia.
Esse acompanhamento, feito pelos pais, escolas e governos, nos parece ser muito importante, especialmente face ao avanço de tecnologias como inteligência artificial e 5G, que podem mudar radicalmente o cenário, para o bem e para o mal.
(*) Vivaldo José Breternitz, Doutor em Ciências pela Universidade de São Paulo, é professor da FATEC SP, consultor e diretor do Fórum Brasileiro de Internet das Coisas. (**) Elisabete Panssonatto Breternitz, especialista em Língua Inglesa pela UNESP, é professora.